Existem movimentos imigratórios no Brasil atualmente qual é a origem desses imigrantes

1O tema que se apresenta para este artigo decorre das transformações e repercussões do cenário socioespacial contemporâneo do Brasil face às transformações demográficas, econômicas e políticas no espectro maior do cenário global. As imigrações internacionais para o país vêm ganhando singular destaque desde que Bacha e Klein (1989) apontaram o ano de 1985 como divisor de águas nas relações do Brasil com as redes globais em diversas questões setoriais, como por exemplo, campesinato, diversificação da economia, redemocratização e o próprio movimento da globalização.

2As razões que têm levado aos deslocamentos de pessoas em crescimento verificado ao longo das últimas três décadas foram motivadas especialmente pela própria transformação das relações e redes em nível internacional. Tem-se, por exemplo, questões de conflitos civis e relacionados à etnia e religião (Sterkens; Vermeer, 2015), desastres naturais, condições econômicas e laborais como repercussões e “fomentadoras” de tal processo em uma rede global.

3Esta, por sua vez, se relaciona em uma rede nacional com questões do uso do espaço brasileiro (tanto de aspecto social como territorial), fronteiras e política setorial de imigração com repercussões territoriais e, diretamente, nas redes regionais com questões de trabalho, assistência social e outras temáticas pertinentes à imigração.

  • 1 Os dados de refúgio foram obtidos junto ao Comitê Nacional para os Refugiados por meio da Lei de Ac (...)

4Inserido nesta seara das novas migrações internacionais, o Brasil, que recebera perto de cinco milhões de imigrantes entre 1819 e fins da década de 1940, recebendo apenas refugiados judeus, sírios, libaneses e palestinos em sua maioria, vem apresentando nas últimas duas décadas um crescimento expressivo no número de imigrantes legais, irregulares e refugiados, conforme demonstram dados dos Censos de 2000 e 2010 do IBGE1. Estes escolhem o país por distintas questões, porém, com distinção especial às oportunidades de trabalho, ainda que sejam análogos à escravidão em alguns casos (Ranincheski; Uebel, 2014).

  • 2 Estes dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. Todos os dados foram tabulados e (...)

5Portanto, neste artigo buscaremos apresentar o panorama imigratório no Brasil após o ano 2010, com enfoque nos dados fornecidos pelo IBGE, Polícia Federal (DPF) e MTE, que foram compilados e cartografados para termos uma expressão real do perfil imigratório brasileiro, que apresentava até o primeiro semestre de 2014 um contingente de quase dois milhões de imigrantes.2

6A abordagem metodológica que embasa a pesquisa decorre primordialmente do uso dos conceitos de redes e rotas migratórias, discutidos por autores da Geografia como Ravenstein apud King (2012), Mabogunje (1970) e Zelinsky (1971), geógrafos que elucidaram estes conceitos ligados às migrações dentro de um escopo territorial-espacial e de mobilidades múltiplas. No que se refere ao uso da cartografia temática, a base metodológica compreende o referencial dos mapas coropléticos e dioramas, já utilizados com devido sucesso em estudos semelhantes no hemisfério norte, como os casos de SASI Group e Newman (2006), Perry (2008), Rioux (2013) e do Réseau Migreurop (2012).

7Os conceitos utilizados de imigrante, migrantes, migrações e refúgio são aqueles oriundos da literatura clássica (ou tradicional) que embasam os textos referenciais de autoras como Baeninger (2013) e Patarra (1995), autoridades no assunto das migrações internacionais para o Brasil. Nesse sentido, optamos por usar os conceitos de migrações e imigrantes de Brunet, Ferras e Théry (2012):

“Movimento de indivíduos (imigrantes) contabilizados quando do ingresso em um lugar, em um país. Na realidade, o termo se aplica a estrangeiros que permanecem por um longo tempo em um país que não é seu – eventualmente à demanda do próprio país. No seu país de origem eles são considerados como emigrantes. A imigração teve um papel muito importante no povoamento realizado pelos europeus nas terras conquistadas d’além-mar, como na América, na África, na Austrália, sobretudo na virada do século XIX para o XX, quando coexistiam a atratividade dos novos países e a repulsa nos seus países de origem (devido a múltiplas causas). Os traços na literatura e no cinema são inúmeros.” (Brunet, Ferras e Théry, 2012, p. 271, tradução nossa)

8Sobre fluxos migratórios, Silva (2014), aprecia assim a sua definição, dentro de uma conceituação demográfico-geográfica contemporânea:

[...] fluxo migratório não deve ser reconhecido como fuga de um país a outro em busca de oportunidades de uma vida melhor ou de trabalho para pobre e de investimentos para ricos e sim [...] pela fluidez produzida pelo capital e pelos meios técnicos. [...] Nem todo o imigrante entra num país para fugir do seu e nem para investir em outro [...] O fato de um país estar num bom momento econômico, logicamente abre oportunidades de entradas e saídas tanto para brasileiros e estrangeiros e não apenas para fugir do seu país pela miséria mas também por diversas razões que incluem perseguições políticas e fraudes financeiras, etc. (Silva, 2014).

9Posto isto, na seção 1 analisaremos a variação da imigração no Brasil entre os anos de 2000, 2010 e 2014, que pensamos ser datas-chave à interpretação dos booms imigratórios, bem como dos novos fenômenos vislumbrados no território brasileiro. A comparação anual surge, portanto, da necessidade de se compreender a evolução dos fluxos e suas repercussões, estas discutidas nas seções posteriores.

10A seção 2 enfoca no primeiro boom imigratório, segundo a nossa hipótese central, ocorrido no ano de 2010, com a consolidação da política externa migratória ativa e altiva do governo brasileiro, conforme termos empregados pelo ex-chanceler Celso Amorim, e dadas as peculiaridades motivadoras de cada país emissor. Já seção 3 aponta a ocorrência de um segundo ponto de inflexão das migrações internacionais com direção ao Brasil, um aumento considerável no biênio de 2013-2014, auge da crise econômica internacional nos países emissores, em concomitância com a estabilidade do mercado de trabalho e economia brasileira à época.

11A questão norteadora do artigo, assim, se apresenta por meio de quais motivações, modos, rotas e redes levaram à retomada destes fluxos imigratórios em massa e de países emissores não-tradicionais da África, Ásia e Caribe, predominantemente. Ao contrário do pensamento em voga de um possível caráter cíclico das migrações com direção ao Brasil na contemporaneidade, procuramos demonstrar a não-concretização deste pensamento e sim de uma consolidação do país na agenda migratória internacional e como país de destino.

12Pretende-se, junto às conclusões e análise dos resultados finais, que esta pesquisa sirva de referencial para estudos futuro, assim como ponto de partida para análises migratórias macro ou inter-regionais, históricas, periódicas ou não, porém, principalmente, de caráter informativo e ilustrativo das migrações em massa e dos novos fenômenos à uma economia emergente como o Brasil.

Variação da imigração no Brasil entre 2000, 2010 e 2014

13Como ponto de partida para esta seção, optou-se pela análise gráfica e cartográfica da variação do número de imigrantes e sua proveniência com base nos registros estatísticos oriundos dos recenseamentos de 2000 e 2010, dados anuais da Polícia Federal e Conselho Nacional de Imigração (órgão pertencente ao MTE) (de 2007 a 2014) e dados compilados para o primeiro semestre de 2014.

14Logo, com base nas tabelas estatísticas de recenseamento de estrangeiros para os anos de 2000, 2010 e 2014, construiu-se à luz da classificação de estrangeiros, o seguinte documento cartográfico (Mapa 1) que mostra a evolução, por país de origem, do número de estrangeiros existentes no Brasil:

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Mapa 1 - Variação do número de imigrantes no Brasil de acordo com o seu país de origem – 2000/2010/2014

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Elaborado por: Uebel, Rückert, 2015.

  • 3 O grupo dos PIIGS é formado por Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha – países com situação e (...)

16Este primeiro mapa apresenta os direcionamentos e concentrações dos países que mais enviam imigrantes ao Brasil, em especial aqueles localizados na América do Sul, na Europa Ocidental – em especial os PIIGS3 – e Estados Unidos, China, Coreia do Sul, Japão, Haiti e Angola e outros. O documento ainda corrobora as teorias contemporâneas de que as imigrações não são mais restritas ao movimento norte-sul, mas também enfatizam fortemente as migrações sul-sul, como por exemplo, os casos de Angola-Brasil e China-Brasil.

17O Gráfico 1 representa a evolução da série histórica do número de imigrantes no Brasil a partir do ano 2000:

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Gráfico 1 – Série histórica do número de imigrantes no Brasil – 2000;2007-2014

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Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Departamento de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Emprego. Dados compilados e tabulados por: Uebel, Rückert, 2015.

19Podemos observar neste Gráfico 1 que o país, ao invés de seguir uma linha de tendência com crescimento contínuo – linha pontilhada – experimentou um primeiro boom imigratório a partir de 2010 com posterior declínio. Seguiu-se um segundo boom no biênio 2013-2014, muito acima das projeções estatísticas, o que refuta neste primeiro momento a hipótese de que o país passaria por um caráter cíclico imigratório como os que ocorreram na primeira metade do século XX.

20A representação gráfica (Gráfico 2) a seguir das dez maiores concentrações imigratórias no Brasil no período que vai de 2007 até o primeiro semestre de 2014, sintetiza a participação dos principais grupos imigratórios na composição populacional do país:

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Gráfico 2 – Representação percentual dos dez maiores grupos imigratórios no Brasil - 2007/2014

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Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Departamento de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Emprego. Dados compilados e tabulados por: Uebel, Rückert, 2015.

22No cômputo total do contingente de imigração no Brasil, os dados estatísticos analisados (vide-se a tabela disponibilizada na nota de rodapé 3) apontam que havia no período de 2007 a 2014 um número de 1 milhão e 900 mil imigrantes – mais precisamente 1.900.044 cidadãos imigrados – no país, superando-se as cifras que então eram estimadas pelo próprio governo e pela imprensa na casa dos 600 mil cidadãos imigrantes. O Mapa 2 traduz a origem destes imigrantes de acordo com os seus países de origem:

Mapa 2 – Contingente de imigrantes no Brasil de acordo com o seu país de origem – 2007/2014

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23A propósito de auxílio instrumental na inferência das variações estatísticas de imigrantes, elaborou-se o Gráfico 3 com o ranking dos vinte países de origem dos imigrantes e sua evolução, tendo como base de comparação o ano de 2014 em relação aos anos de 2010 e 2000.

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Gráfico 3 – Variação de imigrantes no Brasil de acordo com o país de origem - 2014, 2010 e 2000

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Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Departamento de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Emprego. Dados compilados e tabulados por: Uebel, Rückert, 2015.

25Essas vinte maiores diferenças apontam para uma mudança na própria multipolarização econômica e estrutural que já apontava no início da década passada uma projeção maior da inserção do Brasil na agenda internacional. Tal inserção atraía imigrantes para cargos especializados com forte exigência de mão de obra qualificada, que durante o decênio não apresentara crescimento considerável interno no país para suprir estas carências.

26Este cenário explica o expressivo aumento do número de imigrantes portugueses, japoneses, italianos, norte-americanos, britânicos, alemães e de outras nacionalidades reconhecidamente formadoras de mão de obra qualificada e que sofreram com a crise econômica no período analisado, gerando desemprego em seus países.

27Estes países, notoriamente conhecidos por sua mão de obra altamente qualificada e por serem sede de grandes centros de tecnologia e inovação, acabam participando de um fenômeno de mass migration explicado por Hatton e Williamson (1998), que exporta o excesso de profissionais para países em ascensão na agenda internacional de comércio, indústria e investimento em serviços, como é o caso do Brasil. Portanto, não surpreende que justamente estas nações sejam apontadas como aquelas que mais cresceram no ranking de envio de imigrantes ao território brasileiro.

28Outro grupo de importante expressão nesta listagem é o grupo de vizinhos ou países próximos ao Brasil, sendo estes Bolívia, Argentina, Uruguai, Chile, Peru, Colômbia e Paraguai, que caracterizam a coletividade de cidadãos de países que buscam no Brasil, um middle ou regional power, de acordo com a literatura de Relações Internacionais, melhores condições sociolaborais que não encontram em seus países de origem, mesclados por oportunidades laborais qualificadas. Entretanto, estes grupos se diferenciam por distintas ordens: as redes fronteiriças são compostas por fluxos de diversas ordens (econômicos, culturais e políticos). Esses diversos níveis de mobilidade variam de acordo com as classes sociais, os produtos e as informações. (Bárbara, 2005). Nesse sentido, ainda que Paraguai, Argentina e Bolívia sejam próximos, por exemplo, as motivações de imigração dos cidadãos destes países são diferentes num contexto sob a rede local-regional, e similares quando numa análise de redes geográficas internacionais do trabalho.

29Tal fenômeno de diversificação das mobilidades é observado nas peculiares situações dos imigrantes bolivianos e argentinos em São Paulo, por exemplo. Ao passo em que o crescente número de bolivianos, nacionalidade que apresenta o quinto maior crescimento de imigrantes no Brasil, muitos em condições análogas a de trabalho escravo em confecções têxteis (Rossi, 2005), os imigrantes argentinos estão cada vez mais inseridos em trabalhos que demandam profissionais qualificados, por exemplo, nos setores de energia e finanças (Baeninger, 2012b).

30Um terceiro grupo de destaque nesta variação decenal é o conjunto de países formado por Portugal, Espanha e Itália, nações que sofreram com a forte crise de desemprego e estagnação econômica no período e que, por possuírem laços históricos de imigração com o Brasil, tornaram novamente o país – em fase de crescimento e expansão econômica mesmo nos períodos de crise cíclica – atrativo para profissionais qualificados e semiqualificados. A literatura chama a atenção à questão de que estes países estão entre aqueles que também mais recebem imigrantes brasileiros, em sua maioria ilegais, e que causa uma contraposição de situações, a ser analisada mais adiante nesta pesquisa.

  • 4 Em notícias veiculadas ainda em 2010, estimava-se o contingente de 50 mil haitianos na região norte (...)

31Por fim, o último país que merece destaque neste rol de maiores diferenças positivas é o Haiti. Segundo dados estatísticos ratificados do IBGE, não havia no Brasil nenhum estrangeiro com status de imigrante no ano de 2000, em 2010 já contava com 175 imigrantes e em 2014 os dados oficias apresentam a estimativa de 20.108 imigrantes (vide-se a tabela disponibilizada na nota de rodapé 3). No entanto, a imprensa brasileira e órgãos de atenção aos imigrantes haitianos chegaram a estimar cifras maiores. 4

32A situação do Haiti difere dos três demais grupos, que em sua maioria estão ligados às motivações econômicas e laborais para o ato de imigrar, em virtude de o país estar em guerra civil desde o fim do século passado e a ocorrência de um terremoto em janeiro de 2010 que matou aproximadamente 200 mil pessoas. Segundo estatísticas oficiais, aquela tragédia desabrigou mais de um milhão de habitantes, que encontraram no Brasil a oportunidade de um recomeço social que os demais vizinhos do país não proporcionariam.

33Em virtude de a imigração em massa de haitianos ter começado em 2010, segundo estimativas não oficiais de pastorais de imigrantes, consulados e órgãos da sociedade civil, haveria no primeiro semestre de 2013 em torno de 25 mil imigrantes haitianos no Brasil. Grande parte destes não autorizados ou sem assistência oficial do Estado brasileiro, e cerca de 50 mil imigrantes no ano de 2014, ou seja, o dobro do que as estatísticas oficiais apresentam.

34Os números apresentados nesta seção, portanto, demonstram-nos fortemente que uma das hipóteses centrais está correta, a de que a imigração de haitianos e senegaleses para o Brasil e, por conseguinte, para o Rio Grande do Sul, destaca-se não pela sua expressividade numérica, mas sim por outros fatores, tais como destaque midiático, etnia, cor, visibilidade social, xenofobia, etc. Afinal, a diferença entre o número de imigrantes como portugueses, norte-americanos e japoneses e de haitianos e senegaleses é extremamente considerável, porém, pouco destacada, o que analisaremos ao longo da pesquisa, inclusive, esmiuçando os dados estatísticos.

Perfil imigratório do Brasil no ano 2010: o país do boom imigratório

35Com a passagem de uma década de fortes transformações no cenário internacional, acentuadas pelas ações terroristas que se sucederam desde 2001 e inúmeros conflitos em distintas partes do mundo; além da crise econômica internacional do triênio 2008-2009-2010, observamos uma mudança considerável no panorama das migrações internacionais com destino ao Brasil, contabilizando à época 432.356 imigrantes (0,23% da população total do país, 4,5 vezes maior que o número registrado no ano 2000).

  • 5 Com base nas estatísticas do “Yearbook of Immigration Statistics: 2012” do Department of Homeland S (...)

36O número de imigrantes no Brasil torna-se ainda mais significativo quando consideradas as estatísticas de outros países que historicamente recebem mais imigrantes que o país, por exemplo, os Estados Unidos da América, que para o mesmo período (entre os anos de 2000 e 2010) apresenta um crescimento de apenas 23,97% no número de imigrantes,5 enquanto no Brasil chega-se a um crescimento de 451,18%.

37A comparação anterior corrobora a hipótese de que as mudanças na macroestrutura conjuntural do país nas áreas de infraestrutura, construção, tecnologia, inovação e serviços é que tornaram atrativa a vinda de imigrantes estrangeiros e, portanto, reconfigurando a composição dos grupos de imigrantes no Brasil de acordo com os seus países de origem, conforme o Gráfico 4.

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Gráfico 4 – Representação percentual dos dez maiores grupos imigratórios no Brasil no ano 2010

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Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Departamento de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Emprego. Dados compilados e tabulados por: Uebel, Rückert, 2015.

39Outro fator que sugere o Brasil como o país do boom imigratório, é a comparação com o crescimento dos demais países no período de 1990 a 2013, conforme a Figura 1:

Figura 1 – Países com o maior número de migrantes internacionais – 1990-2013 (milhões) – Adaptado do original

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Fonte: United Nations, Department of Economic and Social Affairs (2013). Trends in International Migrant Stock: The 2013 Revision-Migrants by Age and Sex (United Nations database, POP/DB/MIG/Stock/Rev.2013/Age). Adaptado e extraído de: http://www.un.org/​en/​development/​desa/​population/​migration/​publications/​migrationreport/​docs/​MigrationReport2013.pdf

40Apesar do Brasil não aparecer neste ranking oficial, ao analisarmos os “International Migration Reports” de 2013 e 2015 da Organização das Nações Unidas, percebe-se o posicionamento do Brasil logo após a Espanha no crescimento percentual do contingente imigratório para o mesmo período. Dentro do contexto sul-americano, foi o país com maior crescimento nas taxas de imigração entre 2000 e 2010 (Organização das Nações Unidas, 2013; id., 2016).

41O que já foi elucidado anteriormente neste artigo, comprova-se com a análise do Gráfico 4: Estados Unidos e Japão mais que duplicaram o número de imigrantes no Brasil, justamente os países que mais foram afetados pela crise econômica iniciada em 2008. Isto acabou por ocasionar aumentos sucessivos nas taxas de desemprego e recessão configurada por baixa oferta de postos de trabalho, além de significativa oferta de mão de obra ultraqualificada. Portanto, os imigrantes destes países encontraram no Brasil um cenário macroeconômico em crescimento, próspero e vacinado contra as oscilações econômicas internacionais dos grandes centros.

42Faz-se alusão também ao crescimento das indústrias de petróleo, gás, mineração e de alta tecnologia, coincidentemente setores que exigem uma qualificação profissional de excelência e mão de obra especializada existente em países como Estados Unidos e Japão e também outros como Reino Unido e França, possibilitando no Brasil, portanto, uma abertura a este exército de mão de obra disponível nos dois países. A participação de imigrantes britânicos é ímpar, posto que em 2000 ocupavam a 16ª posição e em 2010 já se encontravam em sexto lugar no número de países que mais enviam imigrantes ao Brasil, também seguindo a mesma tendência dos Estados Unidos e Japão.

43Outras três nacionalidades que merecem destaque são os espanhóis, portugueses e italianos, que ganharam algumas posições neste ranking, em virtude da crise econômica e social que começou a abalar a Europa Ocidental no início de 2009. Com altos índices de desemprego, os já citados PIIGS, retomaram a imigração europeia ao Brasil – estagnada desde a década de 1960. Paraguai e Bolívia ainda possuem grande participação, se observarmos o Mapa 3, que apresenta a procedência dos imigrantes no Brasil em 2010.

Mapa 3 – Contingente de imigrantes no Brasil de acordo com o seu país de origem no ano de 2010

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Elaborado por: Uebel, Rückert, 2015.

44Os dois vizinhos do Brasil seguem uma tendência de inserção territorial e demográfica distinta do Japão, Estados Unidos e Europa Ocidental, pois operam em um cenário de médio a longo prazo de estabelecimento e vinculação com as redes no Brasil, em especial de trabalho e instabilidade nos seus países de origem.

45Uma vez que os imigrantes norte-americanos, japoneses e europeus deveriam seguir uma tendência cíclica de expansão, estabilização e declínio da imigração ao Brasil, em observância stricto sensu às condições econômicas e de emprego em seus países de origem, os imigrantes bolivianos e paraguaios inseriram-se integralmente à sociedade, economia e redes de trabalho no Brasil. Isto ocorrera já que não havia perspectivas de alteração do status e retorno de um cenário econômico e político habitável a estes na Bolívia e Paraguai.

46Um país que merece atenção é o Haiti, que conforme abordado anteriormente, em observância à crise civil que se acentuava no país e o terremoto concomitantes em 2010, já apresentava indícios de forte participação nos anos posteriores no perfil imigratório do Brasil, posto que em 2000 estava na 149ª posição e em 2010 na 75ª posição e passa, a partir de então, ocupar a 16ª posição, um aumento muito expressivo que começa a ser estudado atualmente pela academia, em virtude de suas consequências econômicas e sociais à sociedade e ao Estado brasileiro. Segundo estatísticas extraoficiais, a tendência é que a imigração haitiana, ainda não passível de classificação cíclica ou não cíclica, consolide-se nas primeiras posições de composição do perfil migratório brasileiro nos próximos anos, já que esta é a maior imigração em massa e concentrada desde a vinda dos italianos e japoneses no início do século XX.

47A linha de tendência do Gráfico 5 expõe o que queremos mostrar acerca da nossa hipótese dos dois booms imigratórios, antes de partirmos para uma análise do perfil imigratório brasileiro no biênio 2013-2014.

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Gráfico 5 – Linha de tendência dos fluxos imigratórios com direção ao Brasil no século XXI

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Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Departamento de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Emprego. Dados compilados e tabulados por: Uebel, Rückert, 2015.

49Esta linha de tendência desconstrói a hipótese de autores já consagrados de que as migrações para países não tradicionais receptores de imigrantes, como o Brasil, por exemplo, são esporádicas ou cíclicas, já que podemos perceber duas expansões – ou booms – num curto intervalo de tempo. Nesse sentido, a Geografia da População apresenta-se como uma importante ciência para interpretar estas rápidas transformações no território brasileiro na seara das migrações internacionais; transformações estas que são influenciadas pelo próprio cenário internacional como diz Baeninger:

50Os anos 2000 denunciam que a mobilidade espacial da população no território nacional insere-se num contexto mais amplo de transformações da sociedade global em seu conjunto. Os distintos contextos históricos, econômicos, sociais, demográficos e políticos serão as heranças para as diferentes manifestações, explicações e interpretações das migrações internas no Brasil no século 21. (Baeninger, 2013, p. 2).

51Percebe-se que o ano de 2010, somadas às motivações econômicas e de conflitos internacionais e atratividade econômica, social e laboral do Brasil, coloca-se como um ponto de inflexão na rede internacional das imigrações, sendo o país que mais acolhera – proporcionalmente – imigrantes naquele período de tempo, superando inclusive Estados Unidos e União Europeia:

Entre o período de 2005 e 2010, o total de imigrantes internacionais – que inclui estrangeiros e brasileiros que moraram fora e voltaram para o Brasil – foi de 268.486 pessoas, quase 87% maior ao número registrado entre 1995 e 2000 (143.644). [...] a crise econômica mundial de 2008 gerou uma complexidade maior nos eixos de deslocamento das migrações sul-americanas. Além disso, o desenvolvimento econômico e social do Brasil e o seu reposicionamento geopolítico nos últimos anos têm tornado o fenômeno migratório muito mais diverso [...]. (Mekari, 2014).

52Desse modo, o entendimento dos processos migratórios internacionais contemporâneos tem suas raízes deste período assentadas na passagem para uma sociedade urbana-industrial, a partir da qual é possível compreender tipos migratórios em etapas específicas da dinâmica econômica do Brasil (Baeninger, 2012a).

53A preocupação com a reconstrução histórica permite observar tipos e características dos movimentos migratórios relacionados a etapas da economia. É possível apreender a contribuição da migração como “população necessária” em determinados momentos e como “população excedente” em outros. Vide-se o caso dos norte-americanos, europeus, africanos e haitianos, ambos coabitam o mesmo espaço temporal e territorial, contudo, possuem percepções diferentes pela sociedade.

54Embora não se possa estabelecer uma relação linear entre tipos de movimentos migratórios e etapas da economia, até os anos 2000/2010 há simultaneidade nesses processos; a partir de então, há uma defasagem entre os processos, indicando uma maior complexidade do fenômeno migratório, em particular o issue migração/industrialização/crises/desemprego. A separação analítica entre essas ordens de fenômenos, no entanto, permite vislumbrar reciprocidades da dinâmica econômica sobre os processos migratórios e, por outro lado, dos movimentos migratórios com relação à transformação da economia.

55A reconstrução histórica das migrações internas no Brasil e seus aportes teóricos estiveram até o final do século XX alicerçados nos processos internos vinculados à dinâmica econômica e penetração do capitalismo em âmbito nacional; as migrações rurais-urbanas, a industrialização, a desconcentração econômica, a reestruturação produtiva, o processo de urbanização. Todos esses fenômenos compuseram e podem explicar os processos migratórios até o final dos anos 1990.

56A inserção do Brasil no cenário da economia internacional, com destaque para os anos 2000, aponta especificidades nas complementaridades regionais via migração no país; logo, entende-se que os movimentos migratórios internacionais refletem, por conseguinte, a nova ordem econômica internacional. Ao entrarmos no século XXI, o cenário para o entendimento das migrações internacionais com direção ao Brasil se amplia, conforme observamos nas próprias representações cartográficas anteriores bem como as linhas de tendência destes fluxos internacionais; além do contexto nacional é preciso incorporar as transformações advindas da nova ordem internacional na divisão social do trabalho no mundo (Harvey, 1992; Sassen, 1988).

57Tornam-se, por vezes, limitadas as explicações das migrações internas no país apenas pelos movimentos estruturais ou conjunturais da dinâmica da economia brasileira. A inserção periférica de espaços nacionais no âmbito da atual globalização passa a incluir dinâmicas locais ao sistema-mundo (Wallerstein, 1976). A penetração e expansão do capitalismo expressa novos arranjos das migrações internas que respondem a uma lógica externa redesenhada pela divisão internacional e territorial do trabalho, ou seja, coincidente com os dois booms imigratórios citados.

58A nova divisão internacional do trabalho oferece o eixo da reestruturação econômica, com articulações em nível internacional, nacional e local, o que requer o surgimento de novas espacialidades e o redesenho de fenômenos sociais que historicamente foram construídos no âmbito nacional (Sassen, 2007). O sistema de cidades em nível nacional e suas conexões com a hierarquia urbana internacional traz reflexos para a rede nacional no que se refere às migrações internacionais como aponta Sassen (1988); o que procura acrescentar-se é que – em se considerando os diferentes níveis em rede – parte das migrações para o Brasil se vinculam às transformações em âmbito global e constantemente.

59Assim, o tema das migrações internacionais para o Brasil adquire importância crescente nos estudos de população no século XXI. De um lado, as migrações de longa distância redesenham seus trajetos e seus significados; de outro lado, as dinâmicas regionais passaram a imprimir especificidades às migrações urbanas-urbanas destes imigrantes internacionais.

60Observar-se-á, portanto, que o deslanchar dos processos migratórios recentes – para o biênio 2013/2014 na próxima seção, particularmente – tem suas raízes de transformações desde os anos 1980, consoante abordado no início deste artigo, quando as clássicas interpretações da migração ancorada somente no desempenho econômico das áreas alcançaram seus limites.

61Os processos migratórios nacionais, imersos em um novo contexto socioeconômico e urbano nacional e global, imprimem espaços da migração marcados por diferentes “condições migratórias”: áreas de retenção de população, áreas de perdas migratórias e áreas de rotatividade migratória (Baeninger, 2013), o que ficará bem claro na análise a seguir dos fluxos imigratórios para o Brasil nos últimos dois anos (2013 e 2014).

Perfil imigratório do Brasil no biênio 2013-2014: o novo boom imigratório e o país das novas migrações

62Se o ano de 2010, conforme apontamos na seção anterior, já apresentava um boom imigratório e indicava um aumento expressivo dos fluxos imigratórios em direção ao Brasil, o biênio 2013-2014 (com os dados até outubro deste último ano) registra o maior ingresso e contingente de imigrantes desde a década de 1930.

63Este contingente só menor que o maior fluxo da história brasileira, que compreende o período de 1870-1930 – as décadas das grandes imigrações, de alemães, italianos e japoneses em sua maioria – com 2,5 milhões de imigrantes à época (Brito, 2014). Em 2013 ingressaram 65.654 imigrantes, até outubro de 2014 chegaram 1,13 milhões de imigrantes – número que ultrapassa o somatório dos últimos dez anos – e o número atual de imigrantes no Brasil é de 1,9 milhões de imigrantes, população maior que 90% das capitais brasileiras.

64Portanto, o panorama imigratório contemporâneo do Brasil é este: os imigrantes representam já 1% da população total do Brasil, maior cifra desde o período colonial brasileiro que remonta aos séculos XVI a XVIII. Cifras grandes representam também panoramas ampliados e uma reconfiguração dos grupos imigratórios que chegam ao Brasil na última década, conforme podemos observar no Mapa 4 as procedências dos imigrantes no ano de 2014.

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Mapa 4 – Contingente de imigrantes no Brasil de acordo com o seu país de origem no ano de 2014 (até outubro)

Existem movimentos imigratórios no Brasil atualmente qual é a origem desses imigrantes

Elaborado por: Uebel, Rückert, 2015.

66Se até 2010 as nacionalidades que representavam os maiores contingentes imigratórios no Brasil eram aquelas que provinham de países em crise econômica ou instabilidade social e laboral, a situação em 2014 tem uma representação gráfica (Gráfico 6) distinta e desafiadora à análise geográfica-estatística.

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Gráfico 6 – Representação percentual dos maiores grupos imigratórios no Brasil no ano de 2014

Existem movimentos imigratórios no Brasil atualmente qual é a origem desses imigrantes

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Departamento de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Emprego. Dados compilados e tabulados por: Uebel, Rückert, 2015.

68A interpretação que se faz acerca da queda de posições das nacionalidades é agrupada e leva em consideração o cenário internacional e suas mudanças políticas e econômicas nos últimos anos. Por exemplo, a queda de posições – mas não no número de imigrantes em relação aos outros anos – de imigrantes de origem norte-americana e britânica deve-se ao fato da recuperação econômica e dos índices de emprego e crescimento verificados naqueles países após o ano 2010, ainda embora que estes fluxos se mostrem estáveis para o Brasil.

  • 6 No intervalo dos últimos dez anos, o número de imigrantes que obtiveram visto de residência permane (...)

69Novamente os imigrantes de origem portuguesa, italiana e espanhola chamam a atenção, ao somarem 38% do número total do contingente imigratório nestes dois últimos anos. Trata-se de uma situação contrária aos britânicos e norte-americanos, por exemplo, já que estes três países, pertencentes aos PIIGS – o número de gregos e irlandeses também subiu de posições entre 2010 e 2014 – apresentaram uma piora nos quadros de desemprego – principalmente entre jovens – que levaram a mass migration em direção a países como o Brasil e Argentina.6

70Outros grupos tradicionais de imigrantes, como bolivianos e japoneses, também teve um aumento na composição imigratória do Brasil para o biênio em análise. No caso dos bolivianos, deve-se ao fato da implantação de acordos de cooperação nas matérias de imigração e trabalho entre o Brasil e a Bolívia, país este que embora apresente um crescimento econômico maior que o Brasil, ainda não consegue responder à sua demanda interna por emprego, exportando imigrantes para seus vizinhos, Brasil, Argentina e Paraguai, sendo que o Brasil lidera neste ranking. (Uebel, 2015).

  • 7 Há um grande debate contemporâneo na academia sobre até que ponto as intempéries ambientais, ecológ (...)

71Já no caso da nacionalidade japonesa, a explicação do aumento considerável de imigrados se deve ao fato do retorno daqueles que haviam emigrado para o Japão até o início da crise econômica internacional, coincidente também com o terremoto de 2011 que atingiu boa parte do território japonês. Portanto, não se pode descartar também as motivações ambientais7 para o aumento da imigração japonesa – no caso, uma remigração.

  • 8 Apesar do programa de importação de profissionais de saúde cubanos do governo brasileiro aumentar a (...)

72Destarte, destacamos nesta nova configuração imigratória do Brasil para o biênio em análise, o crescimento considerável dos novos fluxos, entre eles, de haitianos, libaneses, colombianos, cubanos8, filipinos, indianos, angolanos, nigerianos, senegaleses, sírios e outras nacionalidades não tradicionais, que antes emigravam para países da União Europeia, Austrália e Nova Zelândia e também Estados Unidos.

73Assim, este biênio configura e consolida o Brasil no cenário internacional como um receptor de todos os grupos imigratórios principais, que antes eram exclusivos aos países do Hemisfério Norte, conforme já citado, e caracteriza-o como o polo mais atrativo de imigração da década, a frente de nações mais ricas como Austrália, Nova Zelândia e Canadá. Dos 203 países de origem aferidos, apenas nove países de pequena expressão não têm imigrantes em território brasileiro; em 2000 eram 63 países de origem não representados e em 2010 eram apenas 23.

74Este segundo boom imigratório surpreende pelo fato de ser exponencialmente maior que não apenas aos tradicionais receptores de imigrantes, mas também aos próprios indicadores e recordes brasileiros e por atrair 91% de todas os países de origem, não se restringindo apenas a uma região geográfica ou concentração continental. Nos mapas a seguir, destacamos por continente quais os países que mais possuem imigrantes no Brasil.

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Mapa 5 – Contingente de imigrantes no Brasil provenientes do continente americano e Caribe, de acordo com o país de origem

Existem movimentos imigratórios no Brasil atualmente qual é a origem desses imigrantes

Elaborado por: Uebel, Rückert, 2015.

76No Mapa 5, observamos que os grupos migratórios mais presentes no Brasil de origem do continente americano são os bolivianos, argentinos, uruguaios, haitianos, cubanos e norte-americanos, ao passo que os de origem centro-americana e caribenha destinam-se em sua maior parte aos outros dois polos de atração imigratória do grande continente: Estados Unidos e México.

77Conforme já citado anteriormente, o Brasil atrai estes fluxos em quatro diferentes grupos:

  • Grupo 1, estão os bolivianos que, tem migrado em virtude das instabilidades econômicas, laborais e sociais vividas naquele país, além da atração do emprego em confecções e indústrias de mão de obra barata no Brasil (muitas vezes sob forma de trabalho escravo e ilegal – não autorizado).

  • Grupo 2, estão argentinos, uruguaios e em menor proporção os andinos – chilenos, peruanos e colombianos) que tem imigrado para o Brasil como consequência da atratividade econômica do país exclusivamente nas áreas de indústria, finanças e ensino, ou seja, uma mão de obra mais qualificada, combinada com o desempenho econômico fraco aliado aos baixos índices de emprego naqueles países.

  • Grupo 3, estão haitianos e cubanos. A hipótese que aceitamos é que dada a inserção do Brasil nestes dois países, propagandização, e atuação do país por meio de sua Missão de Paz no Haiti e do Programa Mais Médicos com a contratação de profissionais de saúde cubanos, o país tornou-se uma atração alternativa aos destinos tradicionais destes imigrantes, como o México e os Estados Unidos, aliada a uma rede de imigração consolidada por parte dos haitianos e afrouxamento das leis emigratórias de Cuba.

  • Grupo 4, estão os norte-americanos que, apesar de ainda constituírem um considerável contingente imigratório no Brasil, este grupo vem diminuindo sua presença em relação aos demais fluxos, em virtude da recuperação econômica e consequente retomada da criação de empregos nos Estados Unidos.

78No Mapa 6 temos a proporção dos imigrantes em território brasileiro de acordo com sua origem do continente europeu.

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Mapa 6 – Contingente de imigrantes no Brasil provenientes da Europa, de acordo com o país de origem

Existem movimentos imigratórios no Brasil atualmente qual é a origem desses imigrantes

Elaborado por: Uebel, Rückert, 2015.

80Os imigrantes de origem europeia no Brasil continuam representando um contingente populacional ativo e considerável, principalmente se observarmos os dos países que mais sofreram com a última crise econômica e laboral europeia: Portugal, Espanha e Itália e em menor parte os de origem francesa, alemã e britânica, além dos cipriotas. Como a crise europeia ainda está em andamento, acredita-se que estes fluxos citados continuem até o momento em que a situação econômica e laboral brasileira atingir o seu ponto ótimo ou de inflexão, isto é, o momento em que retornar à Europa tornar-se-á mais barato e lucrativo do que permanecer trabalhando no Brasil.

81Outro ponto interessante dos fluxos imigratórios provenientes do continente europeu, é o fato de que o Brasil não absorveu ou atraiu os grupos de imigrantes do leste europeu, que continuam emigrando em massa para a o core da União Europeia, ou seja, Alemanha, França e Grã-Bretanha. Contudo, os imigrantes de origem ucraniana parecem repetir os fluxos após a Guerra da Crimeia em direção ao Brasil: os fluxos de ucranianos com direção ao Brasil aumentaram consideravelmente após as tensões entre Kiev e Moscou no início de 2014.

82Já o Mapa 7 apresenta a origem e potencialidades dos fluxos imigratórios de africanos e de origem do Oriente Médio.

83

Mapa 7 – Contingente de imigrantes no Brasil provenientes da África e Oriente Médio, de acordo com o país de origem

Existem movimentos imigratórios no Brasil atualmente qual é a origem desses imigrantes

Elaborado por: Uebel, Rückert, 2015.

84A África é um dos continentes que vem chamando atenção pelo crescimento percentual do número de migrantes com direção ao Brasil, tendo superado a América do Sul entre 2000 e 2010 e a América do Norte e Oceania entre 2010 e 2014, conforme a Tabela 1. Também é um continente que apresenta situações opostas e questionadoras acerca da origem dos imigrantes.

Tabela 1 – Crescimento dos fluxos migratórios com direção ao Brasil

Continente

2000

2010

2014

Crescimento 2000-2010

Crescimento 2010-2014

Crescimento 2000-2014

África

3.726

10.536

15.554

182,77%

47,63%

317,44%

América Central e Caribe

1.519

5.194

39.256

241,94%

655,80%

2484,33%

América do Norte

9.029

81.216

48.115

799,50%

-40,76%

432,89%

América do Sul

41.605

107.795

274.827

159,09%

154,95%

560,56%

Ásia

14.334

81.058

196.518

465,49%

142,44%

1270,99%

Europa

21.671

139.497

555.938

543,70%

298,53%

2465,35%

Oceania

256

4.819

2.117

1782,42%

-56,07%

726,95%

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Departamento de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Emprego. Dados compilados e tabulados por: Uebel, Rückert, 2015.

85À exceção de Moçambique e da África do Sul, os países que mais enviam imigrantes para o Brasil no continente africano são os da costa oeste, isto é, aqueles voltados para o Atlântico e que tradicionalmente emigram para a União Europeia e em cifras menores para os Estados Unidos e Canadá.

86Além da proximidade linguística entre o Brasil e os países da costa oeste africana – onde em sua maioria se fala o português e o francês –, o que justifica este crescimento dos fluxos imigratórios de africanos é a formação das redes – facilitadas pelas ligações aéreas diretas com o Brasil. Estas redes de contatos se dão entre os próprios imigrantes, em grande parte com formação superior, conhecimento de mais de duas línguas, profissionais liberais e que buscam no Brasil um mix de atividade laboral com todas as garantias legais. As garantias trabalhistas legais são o principal atrativo, já que raramente existem de forma equânime em seus países de origem – além da oportunidade de ensino gratuito e ponto de partida para outros países posteriormente, como Estados Unidos e Canadá.

87Portanto, pensamos que o termo para definir esta imigração em massa de africanos, ainda que seja numericamente menor que a de outros países de origem americanos e europeus, e o que discutiremos mais adiante acerca da sua visibilidade e xenofobia, é o Brazilian dream ou eldorado brasileiro, como bem colocam Silva e Assis (2016).

88Trata-se assim do sonho, objetivação de alcançarem condições laborais melhores aliadas ao crescimento pessoal acadêmico e estabilidade financeira, embora muitos exerçam atividades informais como camelôs, por exemplo, grande parte está empregada em indústrias pesadas, comércio, serviços e até mesmo sendo contratados por pequenos empreendedores.

89Este Brazilian dream, conforme discutido também na obra de Herédia (2015), se justifica quando analisamos especialmente os dados da Tabela 1 anterior, com um crescimento dos fluxos de africanos em 47,63%, em um período em que houve a queda das migrações de outras regiões, como América do Norte e Oceania. Estes autores citados apontam, e nós corroboramos aqui, que a consideração do custo de migrar para o Brasil vis-à-vis o aumento dos controles migratórios na Europa e Estados Unidos, contribuíram, portanto, para este crescimento, condicionados ainda às ofertas de trabalho no Brasil, divulgadas de forma em rede, como justificam Tedesco e Mello (2015).

90Para finalizarmos antes de realizarmos a análise do Mapa 8 dos fluxos de asiáticos, ressaltamos que a migração de cidadãos do Oriente Médio obedece majoritariamente uma migração forçada, em muitos casos, o refúgio, em virtude da instabilidade geral naqueles países, tais como Palestina, Síria, Egito, Irã e Líbano, Estados cujos nacionais já estão integrados à sociedade brasileira, com grandes comunidades nos estados do Sul e Sudeste, tendo, provavelmente, o crescimento de tais fluxos nos últimos anos justificado pelo aumento dos conflitos no Médio Oriente, ou seja, uma correlação direta: aumento dos conflitos e instabilidade resulta em aumento das migrações para o Brasil e países vizinhos.

91Já o Mapa 8 apresenta algumas curiosidades e pontualidades interessantes acerca das migrações de asiáticos para o Brasil – migrações estas que já foram em massa no século XX, como a de chineses e japoneses:

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Mapa 8 – Contingente de imigrantes no Brasil provenientes da Ásia, de acordo com o país de origem

Existem movimentos imigratórios no Brasil atualmente qual é a origem desses imigrantes

Elaborado por: Uebel, Rückert, 2015.

93Os imigrantes asiáticos, assim como os africanos, apresentam-se como uma grande surpresa quando da análise das estatísticas de imigração recente para o Brasil. Além da China e Japão, tradicionais emissores de imigrantes para o país e com dezenas de comunidades espalhadas pelo território brasileiro, tais como a Chinatown e colônias japonesas [no estado do Paraná, Ivoti (Rio Grande do Sul), Bairro da Liberdade (na cidade de São Paulo), etc.], novas nacionalidades chamam a atenção quando da análise deste mapa do novo perfil imigratório brasileiro: indianos, bengalis, filipinos, malaios, indonésios e sul-coreanos.

94Tais migrações substituem novamente os receptores tradicionais, no caso, Japão, Cingapura, Austrália e Nova Zelândia, pelo Brasil, apesar do país estar a milhares de quilômetros de distância. O que explica este fenômeno é o que a literatura contemporânea vem apresentando como uma oportunidade de emprego de mão de obra semiqualificada, como no caso destes países, em economias em desenvolvimento, ou seja, no Brasil, já que as economias semelhantes, como dos próprios BRICS, já esgotaram tais postos de trabalho ou preferencialmente seus próprios nacionais.

95Além disto, outro ponto em comum com as migrações dos africanos para o Brasil, está representado nas garantias e leis trabalhistas e previdenciárias do país, se tornando um dos principais atrativos a estes imigrantes. Outro fator de atração também se dá na maior facilidade de inserção destes no Brasil em comparação ao Canadá, Austrália e outros, que exigem maiores requisitos no processo de imigração legal. Portanto, não é raro a imprensa brasileira noticiar casos de imigração não autorizada de nacionais asiáticos, como no caso dos chineses:

Seis chineses foram presos quando tentavam entrar ilegalmente no Brasil. Eles atravessaram de barco o Rio Uruguai – que liga Paso de Los Libres, na Argentina, a Uruguaiana, na fronteira oeste gaúcha – e foram pegos próximo à margem brasileira [...]. De acordo com a Polícia Federal, os estrangeiros não portavam visto de entrada no Brasil nem na Argentina e nos passaportes havia o registro de passagem pelos Emirados Árabes. Além de pagar multa no valor de R$ 165, o grupo terá um prazo de três dias para deixar o país. (Bacelo, 2012).

96E também dos bengalis:

A Polícia Rodoviária Estadual localizou um grupo de imigrantes ilegais [...] no Paraná. Eles estavam em um ônibus que seguia para Cruzeiro do Oeste (25 km a leste de Umuarama). De acordo com a PRE, os 11 homens são de Bangladesh e não têm permissão para permanecer no Brasil. Todos portavam passaporte e visto boliviano. [...] Durante a ocorrência, um imigrante legalizado de Bangladesh compareceu ao Posto de Polícia Rodoviária de Iporã. Ele seria o facilitador da entrada dos estrangeiros no país e seria o responsável por levar os imigrantes até Cruzeiro do Oeste. (Andrade, 2013).

  • 9 Embora o surgimento do termo BRICS e da própria proto-integração entre seus membros seja recente, o (...)

97A própria inserção do Brasil por meio dos BRICS no continente asiático justifica o número considerável de indianos, chineses e russos que emigraram para cá nas últimas duas décadas. Ou seja, uma hipótese que não pode se descartar é dos BRICS atuarem como um mecanismo subjetivo de fomento às migrações dentro do próprio bloco, já que é elevado o número de brasileiros que migram para os países partícipes deste bloco, em especial à China e à Rússia.9

98O que também é interessante observar que a maioria destes imigrantes asiáticos segue um padrão para ingressar no Brasil: utilizam-se de vias não tradicionais ou não diretas, como pelos Emirados Árabes ou pelo Peru, ingressam por fronteiras fluviais, são apreendidos e solicitam refúgio, o que normalmente é concedido. Seriam o que definimos como refugiados econômicos ou refugiados laborais.

99Por fim, o Mapa 9 apresenta a procedência dos imigrantes da Oceania, continente com menor participação no envio de cidadãos ao Brasil:

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Mapa 9 – Contingente de imigrantes no Brasil provenientes da Oceania, de acordo com o país de origem

Existem movimentos imigratórios no Brasil atualmente qual é a origem desses imigrantes

Elaborado por: Uebel, Rückert, 2015.

101Austrália e Nova Zelândia apresentam-se como inexpressivos emissores de imigrantes para o Brasil, se comparado a um panorama global, em virtude de serem polos naturais de atração de imigrantes, dentre eles, os próprios brasileiros. Portanto, o número de imigrantes destes países reflete-se na ocupação de postos de trabalho que exigem mão de obra qualificada, principalmente na indústria, universidades e multinacionais, além de que muitos possuem dupla-nacionalidade, o que levar-nos-ia à inferência de que são brasileiros retornados, hipótese já levantada por Irigaray, Freitas e Filardi (2013).

Conclusões

102Diferentemente dos fluxos imigratórios do século XIX e princípio do século XX, em que os imigrantes originários do hemisfério norte eram desejados porque tinham a função de ocupar territórios, na contemporaneidade, o incremento da chegada de imigrantes provenientes da Ásia, América Latina, Caribe e África comporta uma ambivalência. Ela coloca o Brasil na arena geopolítica dos países receptores de fluxos imigratórios e demanda, por conseguinte, uma atuação Estatal.

103Essa imigração inesperada e a crise dos dois grandes modelos de integração dos imigrantes no ocidente — o assimilacionismo francês, inspirado na fórmula republicana tradicional; e o modelo multicultural dos países anglo-saxões — provocam sensibilidades no trato governamental e da gestão pública na questão imigratória no nosso período em análise.

104No caso brasileiro, a progressiva presença de imigrantes no país neste início de século XXI demanda a exigência de modelo próprio que se afaste das posturas repressivas que reduzem a imigração a um fenômeno jurídico ou policial susceptível de repressão ou medo. E que fujam de uma representação ingênua humanista que simplifique a situação, já que comprovadamente centenas de imigrantes, como bolivianos, haitianos e senegaleses, encontram-se em situação análoga a de escravidão em boa parte do país.

105Em suma, a presente pesquisa levou-nos à conclusão de que o Brasil está inserido numa nova seara das migrações internacionais, exigindo-se tanto da academia como por parte da esfera da Gestão Pública um debate maior acerca do que pode ser feito para a positiva inserção destes imigrantes, afim de que se evitem e se combatam os males do trabalho análogo à escravidão, preconceito, preconceito e xenofobia, já que tanto o país como o estado foram construídos majoritariamente por imigrantes.

106Inferiu-se, portanto, que independente da origem nacional e étnica dos imigrantes estudados ao longo desta pesquisa, seus objetivos, anseios e rotas levam apenas a um ponto em comum: o bem-estar social destes e seus familiares correlacionados com o desenvolvimento sociocultural e crescimento econômico dos locais que lhes receberam, empregaram e acolheram. As relações oriundas das imigrações são recíprocas, positivas e enriquecedoras para ambos, imigrantes e sociedade, apesar das pontualidades negativas ainda preponderantes, tais como a xenofobia e racismo, e que devem ser combatidas, pelo bem do desenvolvimento comum e coletivo do país vis-à-vis suas ambições de inserção estratégica como um regional power.

107Os resultados ainda demonstraram o caráter multi-regional e intercontinental das migrações com destino ao Brasil, além de questões de redes migratórias, polarizações políticas no acolhimento dos imigrantes e na sua destinação a regiões específicas do países, sem atender, obrigatoriamente, as necessidades e demandas por mão de obra, demonstrando, assim, uma urgente arguição de políticas nacionais de imigração, acolhimento e encaminhamento de imigrantes ao mercado de trabalho, abrigo e na própria integração destes à sociedade. Ademais, a cartografia temática permitiu a observação de novas e interessantes migrações (o país de origem dos imigrantes), potencializadas com o caráter divulgador e altivo da política externa brasileira durante os governos democráticos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, atraindo indivíduos de países como Haiti, Senegal, Bolívia e Cuba, justamente onde a presença brasileira deu-se de forma muito ativa.

108Chamamos a atenção, por fim, das tendências migratórias a partir de 2016, já encontrando um país em crise política e econômica, com a ascensão do governo de Michel Temer, com baixa aprovação pela população e, aparentemente, antipático à ampliação das políticas e estudos migratórios, especialmente se verificado o boom da imigração de venezuelanos no fim daquele ano. Conforme aferido ao longo do presente artigo e defendido nas questões norteadoras do mesmo, o Brasil inseriu-se de forma definitiva na rota e agenda das migrações internacionais, inclusive logrando assento em órgãos internacionais sobre o tema, todavia, tal posto apresenta-se ameaçado pelas não-atitudes do novo governo frente à continuidade das migrações estudadas, bem como à luz da emergência dos novos fluxos.

Qual é a origem da maioria dos imigrantes que entram no Brasil?

Atualmente, os novos imigrantes, no Brasil, são, em sua maioria, latino-americanos. Este ano, até março, 23.906 estrangeiros passaram a residir no país, 60% são venezuelanos e haitianos.

Quais os principais movimentos imigratórios no Brasil?

Vejamos os principais: Êxodo rural: deslocamento de populações do campo para a cidade. No Brasil, este fenômeno começou na primeira metade do século XX. Migração pendular: processo migratório que ocorre de uma cidade pequena para uma grande, diariamente, na região metropolitana das capitais.

Quais são os principais movimentos migratórios da atualidade?

Os principais fluxos migratórios da atualidade no mundo são:.
1 - Síria. O conflito da Síria, que teve início em 2011, provocou o deslocamento de mais da metade da população do país. ... .
2 - Sudão do Sul. ... .
3 - Venezuela. ... .
4 - Honduras. ... .
5 - Costa da Líbia..

Quais são as principais causas dos movimentos migratórios no mundo?

O processo de migração internacional pode ser desencadeado por diversos fatores: em consequência de desastres ambientais, guerras, perseguições políticas, étnicas ou culturais, causas relacionadas a estudos em busca de trabalho e melhores condições de vida, entre outros.