Este trabalho é dedicado ao estudo da Filosofia de Thomas Hobbes, uma filosofia afeita sobretudo à política. Show
Ao longo deste trabalho tentamos sempre desmistificar interpretações equivocadas feitas por alguns autores da filosofia de Hobbes. Defensor do absolutismo estatal do Rei, Thomas Hobbes criou uma teoria que fundamenta a necessidade de um Estado Soberano como forma de manter a paz civil. Em sua construção hipotética partiu do contrário, ou seja, iniciou sua teoria a partir dos homens convivendo sem Estado, para depois justificar a necessidade dele. Esse estágio do convívio humano sem autoridade, onde tudo era de todos, recebe o nome de estado natural. A conseqüência deste estado natural é a ameaça da manutenção da humanidade, que leva os homens a pactuarem entre si, transferindo o direito de autodefesa existente no estado natural para o Estado, que garante a efetividade do contrato. Além da sua inteligente construção teórica que justifica a necessidade do Estado Soberano, Thomas Hobbes inovou em diversos pontos da política, a serem analisados no decorrer deste trabalho. 2.O FILÓSOFO THOMAS HOBBESEste breve relato da vida de Thomas Hobbes, possibilitará uma melhor compreensão de sua filosofia: Thomas Hobbes, nasceu na Inglaterra, em Westport, Malmesburry, em 05 de abril de 1588, vindo a falecer em 04 de dezembro de 1679. Seus pai, um vigário humilde, entregou-lhe, ainda criança, ao tio, que lhe proporcionou uma boa educação. Teve a oportunidade de, desde os sete anos de idade, estudar os clássicos com Robert Latimer. Interessando-se pelo estudo, aos quatorze anos, Hobbes ingressou na universidade de Oxford, "Magdalen Hall", foi um estudante mediano. Nesta época, morre Elizabeth I e assume seu primo Jaime I, iniciando a dinastia dos Stuart. Depois de formado, com vinte anos, foi indicado para ser preceptor do filho de uma família de prestígio. Naquela época os filhos de famílias ricas tinham uma espécie de professor particular, era o chamado preceptor. Esta profissão não rendia muitos ganhos, mas Hobbes pôde usufruir do conforto da casa e da vasta biblioteca, possibilitando o aprofundamento de seus conhecimentos. Além disso, viajou pela França e Itália, onde aperfeiçoou seus idiomas. Em 1629, Hobbes foi o primeiro a traduzir para o inglês a obra "Guerra do Peloponeso", do importante historiador grego, indicado como inventor da história racionalista, Tucídides. A partir daí, o filósofo começa a mostrar suas tendências políticas. Além do acesso aos pensamentos racionalistas de Tucídides, Hobbes foi secretário de Francis Bacon, empirista, e, em suas viagens, leu a obra de Euclides, racionalista; teve oportunidade de discutir, através do Padre Mersenne, com René Descartes; e depois, na Itália, esteve com Galileu. Com este conhecimento eclético, Hobbes formulou sua própria metodologia para a fonte do conhecimento, o empirismo racionalista. Esta metodologia original foi aplicada em sua ciência política, ao analisar os fatos sociais, deduzindo conceitos, nominando-os e, por fim, pondo-os em uma ordem sistematizada. Esta transformação de conceito para palavra é o chamado nominalismo. Hobbes fazia construções lógicas, deduzidas dos conceitos formulados da realidade da natureza humana. Sempre mostrou grande interesse pelos problemas sociais, sendo fiel defensor do despotismo político. É o que comprova seus escritos: "Elementos de Lei Natural de Política"(publicado em 1640, época em que voltou para França em decorrência de atritos políticos); "O Cidadão"(publicado em 1642. Fala do homem em seu estado natural.); "Leviatã" (publicado em 1651). Era preceptor do príncipe de Gales, que depois veio a ser Rei Carlos II da Inglaterra). Apenas a título de informação, "Leviatã" é um monstro bíblico citado no Livro de Jó, 40-41, muito poderoso, sem medo de nada e com um coração de pedra. Hobbes atribui a uma de suas obras mais importantes o nome deste monstro bíblico, Leviatã, comparando-o ao Estado. Depois de tantas lutas políticas, tendo sido alvo de muitas perseguições, dentre outros, por acharem suas obras "O Cidadão" e o "Leviatã" ateístas, aos setenta e dois anos, Hobbes volta aos estudos dos clássicos e suas traduções. Seus últimos anos de vida foram de paz. Thomas Hobbes faleceu em 1679, com noventa e um anos. E, só dez anos depois de sua morte, as idéias liberais que tanto combatia triunfaram. Depois das breves considerações sobre a vida de Hobbes, é oportuno transcrever a Cronologia constante na Introdução do livro "Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil"(1):
3. A METODOLOGIA DA TEORIA DE THOMAS HOBBES NO ESTUDO DA CIÊNCIA POLÍTICAThomas Hobbes, sempre voltado aos interesses políticos, vivendo num período de muitas guerras, acreditava que somente a figura de um Estado forte poderia acabar com esses conflitos. Para justificar a necessidade do Estado Soberano, formulou uma teoria hipotética. Hobbes desenvolveu sua teoria utilizando o método resolutivo-compositivo. Resolutio, resolutivo em latim, é a análise, enquanto que compositio, compositivo em latim, é a síntese, a composição daquilo que foi detalhadamente analisado. No prefácio do livro De Cive, ao comparar o Estado a um relógio, ficam claras as características de sua metodologia(2):
O Estado é o objeto de análise de Hobbes. O elemento formador do Estado é o homem. Ao analisar o Estado, Hobbes faz como um relojoeiro ao tentar conhecer a mecânica de um relógio: decompõe o Estado, analisa seus elementos, que são os homens e depois reformula o Estado. Hobbes explica também no "Leviatã" sua metodologia no estudo da política(3):
4. O CARÁTER HIPOTÉTICO DA TEORIAA teoria de Hobbes é por vezes mal interpretada. E, para melhor entender sua teoria, antes de nos aprofundarmos, vamos tentar resolver esta problemática, analisando um trecho do livro de Paulo Nader, "Filosofia do Direito" (4):
Paulo Nader fala na "crença" de Hobbes num "status naturae". Esta palavra "crença" leva os leitores a pensar que o estado natural de Hobbes é um fato histórico. Ocorre que toda sua teoria é uma construção hipotética, criada somente na sua mente. Daí a importância de conhecer as fontes originais dos autores a serem estudados. Não só porque alguns intérpretes destorcem os pensamentos dos autores, mas também, porque são obscuros, deixando uma grande margem de erro para o leitor leigo no assunto. Assim, importante sempre lembrar que tudo que falarmos sobre a teoria de Hobbes – estado natural, estado de natureza dos homens- é sempre hipoteticamente, dentro da teoria criada por ele. 5. 1ª ETAPA DA TEORIA HIPOTÉTICA DE HOBBES: A NATUREZA HUMANAAo fazer a decomposição do Estado para sua análise, estuda-se seu elemento, que é o homem. Hobbes estuda o homem no seu estado natural, sem interferência de nenhuma autoridade. Ele imagina os homens convivendo sem Estado. Hobbes analisa a natureza humana dentro da sua teoria hipotética sobre o prisma realista. Ele não estuda a essência dos homens, mas sim, as condições objetivas dos homens no seu estado natural. A convivência dos homens sem um Estado que os tutele, acarreta uma igualdade aproximada que leva à "guerra de todos contra todos". Neste estado de natureza todos os homens têm direito a todas as coisas. E, sabendo que os bens são escassos, quando duas pessoas desejarem um só objeto indivisível, estas são livres para lutar com todas as armas para satisfazer seu desejo. A igualdade dos homens no estado de natureza da teoria de Hobbes é a igualdade no medo, pois a vida de todos fica ameaçada. Esta igualdade é na capacidade de um destruir o outro. Nem o mais forte está seguro, pois o mais fraco é livre para usar de todos os artifícios para garantir seus desejos e sua vida.
A "guerra de todos contra todos" pode ser melhor entendida, também, com as palavras do próprio autor, que no livro "Leviatã" (6) escreve:
A teoria de Hobbes é também mal interpretada quanto a sua concepção antropológica. A exemplo do professor da Universidade de Bonn, Hans Welzel, que em sua obra "Derecho Natural y Justicia Material"(7), afirma:
Em sua teoria hipotética, Hobbes não tem uma concepção pessimista do homem, e sim, uma visão realista. No estado natural onde os homens encontravam-se numa total insegurança era impossível haver moralidade, os homens teriam que estar sempre preparados para a guerra, sob pena de comprometer seu bem mais precioso, a vida. Contudo, quando o homem passa a viver numa sociedade, com uma autoridade para lhe reger, as tensões se acabam e, em conseqüência, os homens vivem relativamente bem, pois a desconfiança que existia entre os homens em seu estado de natureza era racional, e não como alguns autores afirmam, homem essencialmente mal. 6. O PACTO SOCIALO maior desejo do homem é manter sua vida. Hobbes atribui a este desejo o nome de instinto de conservação. No estado natural a vida está em constante ameaça. Os homens, em decorrência do instinto de conservação, guiados pela razão, são levados a pactuarem entre si(8):
Novamente, Norberto Bobbio, consegue exprimir fielmente o primeiro passo para a transformação do estado de natureza em Estado Civil, que é a criação da lei natural pela razão(9):
A Lei Natural é formada por diversas regras, dentre elas Hobbes destaca, no Leviatã as seguintes(10):
Como se pode observar, as regras da Lei de Natureza são ditames morais elaboradas pela reta razão, que quer dizer a possibilidade do homem de agir da melhor forma para atingir os fins desejados. Ocorre que, para estas regras terem efetividade têm que ser cumpridas por todos. As leis naturais em si são válidas, mas não tem eficácia garantida, pois elas obrigam in foro interno, não têm alguém que obrigue a cumpri-las . Os princípios naturais só têm eficácia ou se forem positivadas ou se existir uma autoridade que obrigue o seu cumprimento. Para acabar com a insegurança entre os homens e fazer cumprir a Lei Natural é fundamental e indispensável a presença de um Estado que esteja acima do interesse dos cidadãos para garantir a paz civil. Pedimos vênia para fazer uma citação um pouco extensa, pois não conseguiríamos explicar a necessidade do poder soberano no pacto social de forma mais clara do que o próprio filósofo(11):
O Pacto da teoria hipotética de Hobbes é feito entre todos os cidadãos, que renunciam ao direito de autodefesa. O Estado está fora do contrato. Os cidadãos se privam da liberdade do estado natural de fazer justiça com as próprias mãos e transferem esse direito renunciado ao Estado. A função do Estado é de garantidor da paz civil. Ele está acima dos homens, como beneficiário dos direitos dos cidadãos. Os cidadãos são para o Estado súditos. O Estado tem o poder soberano. 6.1 O PODER SOBERANO Soberania para Hobbes é o poder que está acima de tudo e de todos. Assim o Estado Soberano está acima das leis e acima da Constituição, sendo um poder absoluto e indivisível. Mais uma vez, Norberto Bobbio fala com precisão das características do Estado Soberano(12):
a)um pacto de submissão estipulado entre os indivíduos, e não entre o povo e o soberano; b)consiste em atribuir a um terceiro, situado acima das partes, o poder que cada um tem em estado de natureza; c)o terceiro ao qual esse poder é atribuído, com todas as três definições acima o sublinham, é uma única pessoa." Contudo, apesar do súdito ter que obedecer a tudo que o soberano mandar, existe uma exceção: o súdito pode resistir ao perigo da morte. Esta exceção tem uma explicação muito razoável, pois como poderia o homem não conservar sua própria vida, seu bem inalienável, já que o poder soberano vem da reta razão, por sua vez, advinda do instinto da auto conservação? Isto seria uma incoerência. Logo todos os homens têm o direito de resistir a qualquer ato do Estado que ameace a conservação da sua vida. 6.2 AS FORMAS DE GOVERNO O poder soberano pode ser adquirido de duas formas: pela livre vontade dos cidadãos, que é chamado de Estado Político/Estado por Instituição; ou pela imposição aos cidadãos, que são obrigados a acatar sob pena morte, é o Estado por Aquisição. O Estado por instituição, na política de Hobbes, pode ser governado por três espécies: pela Monarquia, governo de uma pessoa; por uma Democracia, governo popular, de todos; e pela Oligarquia, governo de poucos. A Monarquia é a melhor forma para de se governar um Estado Soberano. Hobbes defende a autoridade absoluta do rei com única forma de se exercer um poder soberano, já que este é uno e indivisível. A Oligarquia seria possível, mas poderia acarretar a descontinuidade do exercício do poder soberano. A Democracia era inviável, porque fatalmente iria acarretar a dissolução do poder soberano. A Democracia para Hobbes é diferente da concepção de Democracia da nossa Constituição. A Democracia que se fala na CF/88 é a representativa, já a de Hobbes é a democracia direta, como explica Denis L. Rosenfield, no prefácio de De Cive(13):
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