Porque Biden tirou as tropas do Afeganistão

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, defendeu com firmeza, nesta segunda-feira, a decisão de retirar as tropas norte-americanas do Afeganistão e rejeitou as amplas críticas à decisão, que gerou uma enorme crise para seu governo depois que o Talibã retomou o poder.

Porque Biden tirou as tropas do Afeganistão
Porque Biden tirou as tropas do Afeganistão

Biden disse que a missão dos Estados Unidos no Afeganistão nunca deveria ser de construção de uma nação, e culpou a relutância do Exército afegão em lutar contra o grupo militante pela volta do Talibã ao poder.

Milhares de civis desesperados para fugir do Afeganistão lotaram a única pista do aeroporto de Cabul nesta segunda-feira, depois que o Talibã tomou a capital, o que levou os Estados Unidos a suspenderem os voos de retiradas.

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Cinco pessoas foram mortas no caos no aeroporto. Uma autoridade dos EUA disse à Reuters que dois homens armados foram mortos pelas forças dos EUA nas últimas 24 horas.

"Eu mantenho totalmente minha decisão", disse Biden. "Depois de 20 anos, aprendi da maneira mais difícil que nunca era um bom momento para retirar as forças dos EUA. É por isso que ainda estamos lá", afirmou.

"A verdade é: isso aconteceu mais rápido do que esperávamos. Então, o que aconteceu? Os líderes políticos do Afeganistão desistiram e fugiram do país. Os militares afegãos desistiram, às vezes sem tentar lutar", acrescentou.

Biden combinou sua defesa com um aviso aos líderes do Talibã : que a retirada dos EUA possa prosseguir desimpedida ou enfrentarão uma força devastadora.

Tão logo as tropas norte-americanas iniciaram a saída gradual do Afeganistão, no Oriente Médio, após 20 anos de ocupação, o Talibã iniciou paralelamente o processo de retomada do poder. E, segundo pesquisadores, a ação consolidada no domingo (15) foi mais rápida que o esperado. Mas como e por que esse movimento aconteceu?

Para o cientista político João Paulo Nicolini Gabriel, pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o processo de retirada foi influenciado, em alguma medida, pela opinião pública nos Estados Unidos. "Os gastos militares começaram a ser mais criticados depois da crise econômica de 2008. Há um longo debate, inclusive na academia, sobre a necessidade da intervenção no Afeganistão, o que também pressionava por um plano de evacuação", ressaltou.

Acordo bilateral

A retirada gradual foi pactuada no ano passado em um acordo bilateral firmado entre o então presidente Donald Trump e o Talibã. O processo deveria ser concluído até maio deste ano. A contrapartida afegã seria não dar abrigo a terroristas da Al Qaeda e do Estado Islâmico.

Após Trump, Joe Biden assumiu a presidência e manteve o processo, alterando o prazo: prometendo encerrar a ocupação até setembro de 2021. Posteriormente, antecipou para agosto. À medida em que as forças dos EUA deixavam o país, ocorreu um rápido avanço das forças talibãs sobre as mais diversas cidades.

A velocidade gerou repercussões políticas nos EUA, com grupos de oposição criticando a condução da saída.

No domingo (15), em um pronunciamento público, o secretário de Estado, Antony Blinken, declarou: "Fomos ao Afeganistão há 20 anos com uma missão em mente: lidar com as pessoas que nos atacaram em 11 de setembro (de 2001), e essa missão foi bem-sucedida".

Armamento americano ficou para trás

Para Fernando Luz Brancoli, pesquisador e professor do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a rápida recuperação do poder pelos talibãs coloca em cheque os bilhões de dólares investidos pelos norte-americanos no treinamento do exército afegão. "Os armamentos deixados pelos EUA vão cair nas mãos dos talibãs. Tem até uma curiosidade: eles tinham lá os Super Tucanos, que são aeronaves construídas no Brasil junto com os EUA. Agora o Talibã tem acesso a eles. Não sei se vão saber pilotar", observa.

Na segunda (16), Joe Biden avaliou que nunca existiria um bom momento para retirar as tropas do país. "A verdade é: isso aconteceu mais rápido do que esperávamos. Então, o que aconteceu? Os líderes políticos do Afeganistão desistiram e fugiram do país. Os militares afegãos desistiram, às vezes, sem tentar lutar", acrescentou.

Perspectiva

O que irá acontecer daqui em diante dependerá também dos desdobramentos de geopolítica, isto é, de como os talibãs irão dialogar com o restante do mundo. "Estamos vendo algumas mudanças importantes. O grupo que foi derrubado pelos norte-americanos há 20 anos está agora virando governo e, inclusive, sendo reconhecido como tal por alguns países, como é o caso da China. Durante muito tempo, nas discussões sobre a geopolítica da região, se debatia o papel dos EUA, da Rússia, da Inglaterra. Pela primeira vez, precisamos entender qual será o papel chinês e qual vai ser a política chinesa para a região. Já está claro que eles vão negociar com os talibãs", observa Brancoli.

*Com Agência Brasil

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Por que os EUA possuíam tropas no Afeganistão?

No dia 7 de outubro de 2001, os Estados Unidos invadiram o Afeganistão para uma vingança aos ataques terroristas de 11 de setembro orquestrados pela Al Qaeda. O objetivo principal da operação era caçar Osama bin Laden e punir o Talibã por fornecer abrigo aos líderes do grupo terrorista.

Quando começou a retirada das tropas americanas do Afeganistão?

29 de fevereiro de 2020Retirada das tropas americanas no Afeganistão / Data de inícionull

O que os EUA têm a ver com o Afeganistão?

O Afeganistão e os Estados Unidos têm uma parceria estratégica muito forte e amigável. Em 2012, as relações ficaram ainda mais próximas quando o presidente dos Estados Unidos Barack Obama declarou o Afeganistão como um aliado importante extra-OTAN.