A prática de exercícios físicos intensos sem o tempo de recuperação adequado provoca alterações negativas em estruturas vitais do organismo, como coração, fígado e sistema nervoso central, revela pesquisa desenvolvida na Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto.
Antes, já era sabido que esse tipo de treinamento intenso sem intervalos necessários levava à síndrome do overtraining, desencadeando sintomas como depressão, insônia, irritabilidade, queda na imunidade, perda de apetite e de peso.
O trabalho mostra que os prejuízos vão além da queda do rendimento. O professor Adelino Sanchez Ramos da Silva, da Escola de Educação Física e Esporte, disse que a síndrome de overtraining era explicada, até então, pelo fato de que lesões no tecido musculoesquelético causadas pelo exercício excessivo induziriam à liberação na corrente sanguínea de substâncias pró-inflamatórias (proteínas produzidas por células de defesa e conhecidas como citocinas), que desencadeariam os efeitos sistêmicos.
A pesquisa, coordenada por ele, comprovou essa hipótese, formulada há 20 anos, e mostrou que há outras alterações negativas em órgãos vitais. “O diferencial dos nossos estudos, que vêm sendo desenvolvidos há 10 anos, é que, além dessas alterações, nós verificamos, em estudos com camundongos, que o desequilíbrio entre o excesso de exercício físico e o período destinado à recuperação está associado a uma inflamação em músculos esqueléticos, sangue, hipotálamo, coração e fígado”, explicou Silva.
Subida e descida
Foram feitos testes com camundongos, submetidos a diferentes práticas de overtraining, como corrida no plano, na subida e na descida, durante oito semanas.
Todos os protocolos de exercícios em excesso provocaram prejuízo na sinalização da insulina no tecido musculoesquelético, ou seja, as células musculares ficaram com mais dificuldade de captar a glicose que circula no sangue.
“Essa dificuldade foi compensada tanto pelo coração quanto pelo fígado, que aumentaram os estoques de glicogênio”, disse Silva.
Ele acrescentou que o coração apresentou sinais de fibrose e também sinais moleculares de hipertrofia patológica. O fígado teve aumento da gordura que ocorre, por exemplo, em doenças como diabetes e obesidade.
A inflamação no hipotálamo foi associada à diminuição do apetite e do peso corporal dos camundongos.
“É importante frisar que, após duas semanas de recuperação total, em que os animais não foram submetidos a nenhuma sessão de treinamento, as alterações inflamatórias no músculo esquelético, no soro e no hipotálamo retornaram aos valores normais, no entanto, o desempenho dos animais continuou diminuído”, afirmou.
Segundo o pesquisador, esse resultado sugere que outros mecanismos, além da citocinas pró-inflamatórias, estejam envolvidos na diminuição do desempenho em resposta ao desequilíbrio entre o excesso de exercício físico e o período destinado à recuperação.
“Os próximos passos da nossa pesquisa serão avaliar animais que apresentam deficiência dessa citocinas, que são conhecidos como animais nocaute, para que possamos averiguar qual o real papel dessas citocinas”, afirmou.
Educação física
Silva destacou que o exercício físico - feito de forma regular e moderada e sob orientação de um profissional de educação física - é uma estratégia “não farmacológica extremamente eficiente para a prevenção e tratamento de diversas patologias”.
“Os nossos resultados servem como alerta para os indivíduos que treinam em excesso e não respeitam um período adequado de recuperação.
Esse período varia muito em relação a sessões de treinamento e ao nível inicial de condicionamento do praticante.
De forma geral, nós podemos dizer que um período entre 24 horas e 48 horas é suficiente para a recuperação”, finalizou.
Durante o exercício estamos gerando um estresse fisiológico para o nosso organismo. Este, para reparar os “danos” causados pelo exercício, estimula ou suprime diversas substâncias produzidas pelo nosso corpo e essas substâncias, uma vez suprimidas ou produzidas para atingir um tecido alvo, gerarão efeitos agudos, que se estimulados repetidamente, se tornarão crônicos.E esse é o nosso tema de hoje: os efeitos agudos e crônicos do exercício físico.
Primeiro, para começarmos, precisamos entender dois conceitos: a diferença de atividade físico para exercício físico e o que é homeostase – conceito que vemos falando aqui no Blog já há algum tempo.
A diferença de atividade física para exercício físico é que enquanto exercício é uma atividade repetitiva e planejada que tem como objetivo a melhora da aptidão física (como por exemplo musculação, crossfit etc), a atividade física deve ser considerada como atividades diárias que aumentam nosso gasto calórico (subir escadas, varrer a casa, andar etc).
Já a homeostase é a tendência de um corpo, dentro de certos limites, manter um meio interno constante. Ou seja, a “quebra” da homeostase não é a perda do equilíbrio - como visto por aí - mas sim a alteração de forma dinâmica que tende a reestruturar o meio interno, o que é definido como homeorrese (mais bonito do que falar quebra da homeostase, né?!).
Mas por que estou falando disso?
Porque é exatamente isso que o exercício físico faz! Quando nos exercitamos, nós temos a alteração da homeostase pois estamos nos submetendo a um estresse fisiológico e, com isso, nosso sistema neuroimunoendócrino estimula a produção de algumas substâncias que visam reestruturar nosso meio interno.
Recuperando, assim, a nossa homeostase.
A resposta neuroendócrina ao exercício é direcionada para suprir demandas energéticas geradas pelo músculo que está em atividade, o que consiste em:
- Aumento da produção de GH (hormônio do crescimento);
- Aumento do cortisol;
- Aumento da produção de catecolaminas (adrenalina e noradrenalina);
- Aumento da liberação de glucagon;
- Supressão da produção de insulina;
Toda essa resposta é necessária para suprirmos essas demandas, uma vez que estimula a lipólise (quebra dos lipídeos em ácidos graxos e glicerol), glicogenólise (quebra do glicogênio armazenado) e a gliconeogênese (produção de glicose através de substratos que não são carboidratos).
Com o aumento da intensidade do exercício de leve para moderado/intenso, alteramos a prioridade das vias energéticas, que antes era dependente dos lipídeos, agora passa a ser dos carboidratos.
Quanto mais prolongado for, os estoques de glicogênio vão chegando ao fim, e o corpo estimula a gliconeogênese.
Com a supressão da produção de insulina, que é um hormônio anabólico (estimula a síntese de proteína e estimula a
lipogênese), temos um ambiente catabólico, onde predomina-se a quebra e oxidação de gordura bem como a
quebra de aminoácidos.
Com isso geramos no nosso organismo, de forma aguda:
- Aumento da frequência cardíaca e pressão arterial;
- Aumento da glicemia;
- Aumento da lipólise e beta-oxidação de ácidos graxos;
- Aumento da proteólise.
Ou seja, durante o treino, nós temos um estado catabólico! Porém você não precisa se preocupar com isso, porque o catabolismo agudo gerado pelo exercício é extremamente necessário para que tenhamos adaptações fisiológicas importantes.
Efeitos crônicos do exercício físico
De forma crônica, nós temos as adaptações geradas pelo nosso organismo, mas que dependem incessantemente do nosso plano alimentar: ele é quem vai nos guiar quanto a perda ou ganho de massa muscular, perda ou ganho de gordura.
No entanto, de uma forma geral e considerando que o nosso exército é extremamente disciplinado quanto ao plano alimentar, as adaptações crônicas geradas pelo exercício são:
- Aumento da massa muscular;
- Redução da gordura corporal;
- Aumento da sensibilidade à insulina;
- Redução do colesterol total;
- Diminuição da frequência cardíaca de repouso;
Então, não fique triste porque está catabolizando durante o treino e nem tome suplementos anticatabólicos intratreino porque não são necessários. O que estará diretamente relacionado aos seus resultados é o seu plano alimentar e do quão eficaz o seu treino é.
Além de tudo isso, o exercício físico reduz o risco de diversos cânceres, desempenha papel importante em doenças autoimunes e metabólicas, bem como um grande aliado do nosso sistema imune, porém isso é assunto para um próximo post...
Por fim, vale a pena lembrar: das 10 principais causas de morte no mundo, o exercício físico previne ou trata 6 doenças e está indiretamente relacionada com a prevenção de 2!
Logo, temos 8 doenças de 10 nas quais o exercício físico pode desempenhar um papel importantíssimo na sobrevida de algumas pessoas. Exercício físico não é só para alcançarmos o nosso corpo desejado, mas sim um grande aliado da nossa saúde, bem-estar e longevidade.