Que dispositivo legal trata da participação da comunidade na gestão do sistema único de saúde (sus)

Plenário Virtual

Recurso Extraordinário 855.178 Sergipe

Relator:Min. Luiz FuxRecte.(s):União Proc.(a/s)(es):Advogado-geral da União Recdo.(a/s):Maria Augusta da Cruz Santos Proc.(a/s)(es):Defensor Público-geral Federal

 RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente.

Manifestação: Trata-se de recurso extraordinário interposto pela UNIÃO, com fulcro no art. 102, III, a, da Constituição da República, em face de acórdão prolatado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que possui a seguinte ementa:

Constitucional e Administrativo. Apelação Cível. Sistema Único de Saúde. Édito judicial que condenou o Estado e a União a fornecer medicamento de nome BOSENTANA (TRACLEEER 62.5mg/125mg). Falecimento da autora. Pretensão da União em ver reconhecida sua ilegitimidade passiva para eximir-se do cofinanciamento do custeio do medicamento. Impossibilidade. Responsabilidade solidária entre os entes federados. Eventuais questões de repasse de verbas atinentes ao SUS devem ser dirimidas administrativamente, ou em ação judicial própria. Apelo e remessa oficial improvidas.

Noticiam os autos que a autora ingressou com esta ação visando à obtenção da medicação de nome BOSENTANA (TRACLEEER 62,5mg /125mg), tendo logrado êxito já em sede de antecipação de tutela deferida em audiência realizada em 19/10/2009, que determinou a aquisição do medicamento pelo Estado de Sergipe e o cofinanciamento do valor pela União, em percentual correspondente a 50% (cinquenta por cento). O Estado de Sergipe, em cumprimento à referida decisão, procedeu à entrega do medicamento em 23/11/2009, através de sua Secretaria da Saúde. O juízo a quo ratificou a tutela antecipatória na sentença, e aproximadamente dois meses após esta sobreveio o falecimento da autora, o que provocou a cessação da obrigação de fazer. Contudo, persistiu o inconformismo da União quanto à ordem de ressarcimento do custeio do medicamento ao Estado de Sergipe.

Em sede de apelação, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região entendeu que o dever de prestar assistência à saúde é compartilhado entre a União, os Estados-membros e os Municípios, e que a distribuição de atribuições entre os entes federativos por normas infraconstitucionais não elide a responsabilidade solidária imposta constitucionalmente, nos termos da ementa acima transcrita.

Opostos embargos de declaração, restaram rejeitados.

Irresignada, a recorrente interpôs o presente recurso extraordinário. Em suas razões recursais, sustenta a preliminar de repercussão geral e, no mérito, alega violação aos artigos 2º e 198 da CRFB/88. Argumenta, em suma, a ilegitimidade da UNIÃO para figurar no polo passivo da demanda, alegando que o SUS é guiado pelo princípio da descentralização e que a obrigação de fornecer e custear os medicamentos seria de incumbência exclusiva dos órgãos locais.

É o relatório.

Destaco, inicialmente, que a discussão posta nos autos não se confunde com aquela travada no RE 566.471-RG, Rel. Min. Marco Aurélio, em que se debate o dever do Estado de fornecer medicamento de alto custo a portador de doença grave que não possui condições financeiras para comprá-lo.

A discussão jurídica presente no recurso ora apreciado diz respeito, em síntese, à responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de saúde e à alegação de ilegitimidade passiva da União.

Observados os demais requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário, passo à análise da existência de repercussão geral da questão constitucional debatida nos autos.

A discussão transborda os interesses jurídicos das partes, uma vez que envolve a temática de repartição constitucional de atribuições institucionais, tendo em conta a legitimidade para figurar no polo passivo de demanda que versa sobre o fornecimento de tratamento e medicamentos por parte do Poder Público.

Bem delimitado o tema, verifica-se que o Tribunal de origem, ao assentar a responsabilidade solidária da União, não destoou da jurisprudência firmada pelo Plenário desta Corte, no julgamento da Suspensão de Segurança 3.355, Rel. Min. Gilmar Mendes, no sentido de que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente. Por oportuno, trago à colação a ementa do referido julgado:

Suspensão de Segurança. Agravo Regimental. Saúde pública. Direitos fundamentais sociais. Art. 196 da Constituição. Audiência Pública. Sistema Único de Saúde SUS. Políticas públicas. Judicialização do direito à saúde. Separação de poderes. Parâmetros para solução judicial dos casos concretos que envolvem direito à saúde. Responsabilidade solidária dos entes da Federação em matéria de saúde. Fornecimento de medicamento: Clopidrogrel 75 mg. Fármaco registrado na ANVISA. Não comprovação de grave lesão à ordem, à economia, à saúde e à segurança pública. Possibilidade de ocorrência de dano inverso. Agravo regimental a que se nega provimento (STA 175-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, DJe 30/4/2010).

Extrai-se do voto condutor:

O direito à saúde é estabelecido pelo artigo 196 da Constituição Federal como (1) direito de todos e (2) dever do Estado, (3) garantido mediante políticas sociais e econômicas (4) que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos, (5) regido pelo princípio do acesso universal e igualitário (6) às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

Examinemos cada um desses elementos.

[...]

(2) dever do Estado:

O dispositivo constitucional deixa claro que, para além do direito fundamental à saúde, há o dever fundamental de prestação de saúde por parte do Estado (União, Estados, Distrito Federal e Municípios).

O dever de desenvolver políticas públicas que visem à redução de doenças, à promoção, à proteção e à recuperação da saúde está expresso no artigo 196.

A competência comum dos entes da federação para cuidar da saúde consta do art. 23, II, da Constituição. União, Estados, Distrito Federal e Municípios são responsáveis solidários pela saúde, tanto do indivíduo quanto da coletividade e, dessa forma, são legitimados passivos nas demandas cuja causa de pedir é a negativa, pelo SUS (seja pelo gestor municipal, estadual ou federal), de prestações na área de saúde.

O fato de o Sistema Único de Saúde ter descentralizado os serviços e conjugado os recursos financeiros dos entes da federação, com o objetivo de aumentar a qualidade e o acesso aos serviços de saúde, apenas reforça a obrigação solidária e subsidiária entre eles.

As ações e os serviços de saúde são de relevância pública, integrantes de uma rede regionalizada e hierarquizada, segundo o critério da subsidiariedade, e constituem um sistema único.

Foram estabelecidas quatro diretrizes básicas para as ações de saúde: direção administrativa única em cada nível de governo; descentralização político-administrativa; atendimento integral, com preferência para as atividades preventivas; e participação da comunidade.

O Sistema Único de Saúde está baseado no financiamento público e na cobertura universal das ações de saúde. Dessa forma, para que o Estado possa garantir a manutenção do sistema, é necessário que se atente para a estabilidade dos gastos com a saúde e, consequentemente, para a captação de recursos.

O financiamento do Sistema Único de Saúde, nos termos do art. 195, opera-se com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. A Emenda Constitucional n.º 29/2000, com vistas a dar maior estabilidade para os recursos de saúde, consolidou um mecanismo de cofinanciamento das políticas de saúde pelos entes da federação.

A Emenda acrescentou dois novos parágrafos ao artigo 198 da Constituição, assegurando percentuais mínimos a serem destinados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios para a saúde, visando a um aumento e a uma maior estabilidade dos recursos. No entanto, o § 3º do art. 198 dispõe que caberá à Lei Complementar estabelecer: os percentuais mínimos de que trata o § 2º do referido artigo; os critérios de rateio entre os entes; as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde; as normas de cálculo do montante a ser aplicado pela União; além, é claro, de especificar as ações e os serviços públicos de saúde.

O art. 200 da Constituição, que estabeleceu as competências do Sistema Único de Saúde (SUS), é regulamentado pelas Leis Federais 8.080/90 e 8.142/90.

O SUS consiste no conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, incluídas as instituições públicas federais, estaduais e municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de insumos e medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de equipamentos para saúde.

Esse entendimento vem sendo aplicado pelo Supremo Tribunal Federal, cujas decisões, proferidas em sucessivos julgamentos sobre a matéria ora em exame, têm acentuado que constitui obrigação solidária dos entes da Federação o dever de tornar efetivo o direito à saúde em favor de qualquer pessoa, notadamente de pessoas carentes. Nesse sentido: AI 822.882-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 6/8/2014; ARE 803.274-AgR, Rel. Min. Teroi Zavascki, Segunda Turma, DJe 28/5/2014; ARE 738.729-AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 15/8/2013; ARE 744.170-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, DJe 3/2/2014; RE 716.777-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 16/5/2013; RE 586.995-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, DJ 16.8.2011; RE 607.381-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 17.6.2011; RE 756.149-AgR, Rel. Min. Dias Toffol; Primeira Turma, DJ 18.2.2014; AI 808.059-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJe 2.12.2010.

Verifica-se, desse modo, que o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência da Corte, razão pela qual não merece reparos, impondo-se o desprovimento do recurso.

Ex positis, demostrado que o tema constitucional versado nestes autos transcende interesse das partes envolvidas, sendo relevante do ponto de vista econômico, político, social e jurídico, manifesto-me pela existência de repercussão geral e pela reafirmação da jurisprudência sobre o tema (art. 543-A, § 1º, do CPC c/c art. 322, parágrafo único do RISTF).

Publique-se.

Brasília, 19 de dezembro de 2014.

Ministro Luiz Fux

Relator

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Qual a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde?

A Participação Social no SUS foi institucionalizada pela Lei n° 8.142/1990 que institui os conselhos de saúde e as conferências de saúde como espaços para o exercício da participação da comunidade sobre a implementação das políticas de saúde em todas as esferas governamentais.

Qual a importância da Lei 8142 90 para a saúde pública brasileira?

A Lei n. 8.142/1990, resultado da luta pela democratização dos serviços de saúde, representa uma vitória significativa. A partir deste marco legal, foram criados os Conselhos e as Conferências de Saúde como espaços vitais para o exercício do controle social do Sistema Único de Saúde (SUS).

Quais são as duas formas de participação da população na gestão do Sistema Único de Saúde?

A lei 8142/90, determina duas formas de participação da população na gestão do Sistema Único de SaúdeSUS: Conferências de Saúde e Conselhos de Saúde.