Porque a ocupação das encostas de morros contribui para a ocorrência dos deslizamentos de terra

Porque a ocupação das encostas de morros contribui para a ocorrência dos deslizamentos de terra
Deslizamento de encosta no Rio de Janeiro

Os recentes deslizamentos em encostas de morros no Rio de Janeiro, causando centenas de mortes, despertaram a atenção da população sobre um grave problema: a ocupação de áreas inadequadas para a moradia.

Para a abordagem desse tema em sala de aula, o professor deve esclarecer, além dos riscos da instalação de residências nesses locais, o processo de segregação residencial e exclusão social, que tem como consequência a moradia em lugares inadequados.

Portanto, inicie a aula explicando que a ocupação do solo urbano se dá através de relações capitalistas, onde a população pobre é a mais prejudicada, tendo que ocupar áreas com pouca infraestrutura e locais inadequados (encostas de morros, por exemplo). Aproveite esse momento para elucidar aos alunos sobre o processo de segregação residencial.

Após um esclarecimento de ordem social sobre a ocupação do solo, aborde as consequências da instalação de moradias em encostas de morros. Explique que essas áreas apresentam declividade acentuada e que a retirada da cobertura vegetal faz com que o escoamento superficial seja mais intenso. Na ocorrência de precipitações pluviométricas, o escoamento superficial poderá desencadear deslizamentos de terra, pois a remoção da vegetação dificultará a infiltração dessa água. Outro aspecto agravante é que uma parcela da água absorvida pelo solo fica retida em algumas rochas impermeáveis, ocasionando saturação do solo e o seu rompimento, promovendo deslizamento de terras nas encostas.

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Realizado a explicação das causas e consequências da ocupação de áreas de encostas de morros, entregue a seguinte imagem para os estudantes:
 

Porque a ocupação das encostas de morros contribui para a ocorrência dos deslizamentos de terra

Solicite a análise da figura e faça os seguintes questionamentos:

Essa é uma área é adequada para a construção de habitações?

Qual o principal fator responsável por essas pessoas estarem residindo nessa área?

Quais as consequências da instalação de residências nesse local?

Após a formulação das respostas, realize um debate com os alunos abordando o tema estudado e solicite a apresentação de possíveis soluções para o problema da ocupação do solo urbano.

Por Wagner de Cerqueira e Francisco
Graduado em Geografia
Equipe Brasil Escola

O historiador e geólogo Rubens Antônio Filho concorda com o professor Luís Edmundo e conta que, desde o século XVIII, as construções nas encostas de Salvador, que completou 469 anos na última quinta (29), são feitas de forma desordenada. Rubens destacou ainda que desde a época de Tomé de Souza, fundador da cidade de Salvador, há registros de deslizamentos na capital baiana.

Alguns fatores influenciam na ocorrência de deslizamentos na capital baiana, destacando-se o relevo e as ações dos moradores nas encostas, ao longo do tempo.

História

Vista da Baía de Todos-os-Santos a partir da Ladeira da Montanha, em Salvador. — Foto: Maiana Belo / G1 BA

Salvador, primeira cidade e capital do Brasil colonial, tinha em 1549 (ano da fundação) um território cujo limite ocupado por construções se resumia entre onde hoje está a Praça Castro Alves e a Praça Municipal.

Com o passar do tempo, a capital baiana foi crescendo. Começou a ser tomada pelas grandes construções, mas também ocupada de forma irregular, A maior parte desse tipo de ocupação ocorreu nas encostas, já que Salvador possui muita área semelhante a vales.

De acordo com o historiador e geólogo Rubens Antônio Filho, o "estilo" enladeirado, cheio de altos e baixos de Salvador começou a ser formado há milhões de anos, e a própria natureza transformou o território que hoje é a cidade.

"Há 180 milhões de anos, Salvador, a Bahia e toda a América do sul toda era colada na África, e esse processo de separação começou. A fratura começou no lugar entre Salvador e Itaparica, onde deu-se um afundamento de seis mil metros e que foi preenchida por todo tipo de material, como areia, pedras, entre outros. A separação só acabou há 114 milhões de anos. Desse momento até a 12 mil anos atrás, a gente poderia sair de Salvador e andar até Itaparica porque não existia a Baía de Todos-os- Santos.", relatou.

Ainda segundo o historiador, ao invés do mar, o que passava entre Salvador e Itaparica, há milhares de anos atrás, era o Rio Paraguaçu. Há cerca de de 12 mil anos, o mar começou a invadir e, há 7 mil anos, preencheu a área, surgindo a Baía de Todos-os-Santos. "Quem mergulha [na Baía] encontra o canal do Rio Paraguaçu como cicatriz desse fenômeno", contou.

Durante esse período de separação, o território de Salvador foi se formando, alguns lugares naturalmente "afundaram" e outros "subiram" ou permaneceram no mesmo local.

Em 1935, deslizamento na região do Taboão matou 12 bombeiros — Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal

Apesar das diversas áreas altas em Salvador, o geólogo diz que, em muitos casos, não é possível enxergar a inclinação desses vales, por conta dos prédios e obras.

"Temos um exemplo da igreja da Barroquinha. Se você observar, ela é afundada. O piso da igreja é para baixo porque ela está no piso original de 1750, e a ladeira da Praça Castro Alves que foi remodelada e construída para cima", contou.

Rubens conta ainda que, ao longo do tempo, as modificações nas encostas de Salvador não foram feitas da forma correta, o que facilita a ocorrência dos deslizamentos.

"Desde o século XVII as primeiras grandes mexidas espontaneístas nas encostas foram desordenadas. Na época de Tomé de Souza, entre 1550 e 1551, já houve deslizamentos na hora de construir ladeiras, porque era mal feita a coisa"

O geólogo lembrou ainda que, em 1935, houve um deslizamento no Taboão, região do Centro Histórico de Salvador, e cerca de 12 bombeiros morreram soterrados ao tentar socorrer as vítimas do desabamento.

Ainda conforme Rubens, em meados do século XIX, as encostas entre a região da Praça Castro Alves e o bairro da Liberdade começaram a ser tomadas por casinhas.

"Salvador se desenvolve a partir de 1950. Ela cresce aqui na beira da encosta. Após 1952, mais ou menos, ocorreu essa explosão de povoados pequenos, como Narandiba, Cabula, entre outros que, aos poucos, enquanto Salvador foi crescendo, as localidades tornaram-se bairros", explicou o geólogo sobre a ocupação das encostas na capital baiana.

Ciência explica

Para mostrar a relação entre as chuvas e o solo, além dos riscos das construções irregulares nas encostas, o professor Luís Edmundo fez um experimento, no laboratório de geotecnia da Escola Politécnica da Ufba, mostrando o que ocorre quando o solo argiloso, típico em Salvador, fica encharcado.

Para começar o experimento, o professor jogou um pedaço do solo arenoso e seco em um recipiente com água, mostrando como ele se dissolve no líquido.

"O solo é firme e não transmite muita preocupação no período seco, mas quando chega no período chuvoso, ele entra quase que em efervescência, e aquele material que tinha uma resistência perde essa resistência. Por isso que a gente deve evitar que a água infiltre o solo", explica.

Professor jogou um pedaço do solo arenoso e seco em um recipiente com água e mostrou como ele se dissolve no líquido em Salvador — Foto: Egi Santana/G1 BA

O professor conta que o solo de Salvador não é ruim, mas que a forma pela qual foi ocupado é que deixa ele suscetível aos deslizamentos. Ou seja, quando o solo não tem sustentação, existe um peso sobre ele e, para piorar, a água ainda deixa ele instável. Com isso, a possibilidade de desabamentos aumenta.

Luís Edmundo apresentou uma segunda experiência, desta vez para mostrar o que ocorre quando existe escavação no talude, que é um terreno em declive.

"A encosta é assim [tipo um morro], então as pessoas vão escavando a terra na parte de baixo. Vou colocar um pouco de água, e à medida que ela vai entrando, reduz a resistência do material e causa instabilidade, o que provoca o deslizamento", explicou.

Ao trazer o experimento para prática, o professor aponta que no final do verão e início do outono, quando as chuvas são constantes, o solo fica encharcado e, caso ele esteja instável, vai haver deslizamento de terra. Luís Edmundo alerta ainda que, mesmo após as chuvas, os riscos ainda existem.

"As vezes choveu muito, parou de chover, abriu aquele sol e as pessoas ficam tranquilas, mas não deveriam. Porque essa água continua descendo, e você pode ter um deslizamento em um dia de sol. O importante é que a pessoa espere ao menos quatro dias para voltar para casa", falou.

Para construir em área de encosta, o professor dá uma dica. "O melhor é que eles [moradores] fizessem umas palafitas, que nem se faz em região de manguezal. Ao invés de "cortar" o terreno, sobe os pilares e constrói a casa sobre os pilares evitando fazer o corte e aterro, de forma mais segura", disse.

Plantação de vertiver em encosta ajuda a conter a água e não deixar solo encharcado em Salvador — Foto: Maiana Belo/G1 BA

O professor afirma que o trabalho de proteção de encostas é responsabilidade do poder público, e que para a contenção podem ser usados concreto e até o geotêxtil, material têxtil que serve de manta para segurar a terra. Ele também citou a importância de se proteger o solo, com a utilização de geomantas e ou da gramínia vertiver.

"Ela [vertiver] pode ser plantada nas encostas, e a raíz chega a uns seis metros de profundidade. Então ela 'suga' a água e não permite que o solo fique tão encharcado, evitando o deslizamento de terras", explicou Luís.

Insfraestrutura

Luís Edmundo disse que a má infraestrutura das casas nas encostas também pode causar o deslizamento — Foto: Egi Santana/G1 BA

Entre uma experiência e outra, o professor apontou outro problema durante a construção em encostas. "A pessoa ao invés de aproveitar o terreno para fazer a casa, ele faz o desenho de uma casa plana e adequa o terreno à planta daquela casa, ao invés de adequar a planta da casa ao terreno", disse.

Luís Edmundo falou ainda que a má infraestrutura das casas nas encostas também pode causar o deslizamento. Segundo o professor, a utilização de forma errada dos tubos para captação de água da chuva e esgoto podem estourar o encanamento, e a pressão da água, além de molhar o solo, pode empurrar a estrutura de um imóvel.

"O pessoal interliga as águas pluviais na tubulação de esgoto, que não suporta. As tubulações para as águas pluviais têm de ser bem mais largas, porque em pouco tempo a concentração de chuva é muito rápida. Já o esgoto é permanente, com a tubulação bem menor".

Encosta no abirro do Lobato, em Salvador — Foto: Manu Dias/GOVBA

Para ajudar as pessoas que não têm condições de pagar pelo projeto de construção de uma casa, Luís conta que o Crea-BA tem um projeto para criar um escritório público, ainda em 2018, com o objetivo de auxiliar pessoas a desenvolver a planta do imóvel.

Além disso, a Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas (Seinfra) disponibiliza para as famílias com renda de até três salários mínimos acesso a arquitetos e engenheiros para elaboração de projetos de construção ou de obras de ampliação de imóveis particulares. O serviço é oferecido através do Escritório Público de Arquitetura, Urbanismo e Engenharia, localizado na sede da Seinfra, no Vale dos Barris, número 125.

Áreas de risco

Terra deslizou na região do Ogunjá e casa corre risco de cair, em Salvador — Foto: Egi Santana/G1 BA

Salvador possui cerca 600 áreas de risco localizadas em encostas, segundo o mapeamento e registro de ocorrências da Defesa Civil de Salvador (Codesal). Em todos esses locais existe possibilidade de deslizamentos.

O professor Luís Edmundo afirma que nem todas as encostas são áreas de risco. Ele explica ainda que para ser definida como área de risco, são levados em consideração o tipo de ocupação, de solo, de drenagem, de habitação, entre outros pontos referentes ao espaço. Caso essas estruturas apresentem problemas na insfraestrutura, a área é apontada como de risco.

De acordo com a Codesal, as áreas com maior risco de Salvador se encontram próximas à Cidade Baixa, como por exemplo nos arredores da Avenida Contorno, no bairro da Liberdade e na região da Avenida Suburbana. Com o crescimento habitacional desordenado, regiões como Avenida Paralela e BR-324 também passaram a ser ocupados irregularmente.

Subúrbio de Salvador possui áreas de risco por conta da ocupação irregular do terreno — Foto: Egi Santana/G1

Tanto a prefeitura quanto governo do estado contam que realizam ações para contenções de encostas e proteção com geomantas. A prefeitura informou que desde 2013, 40 estruturas foram finalizadas com recursos municipais.

As intervenções no município foram realizadas em Cosme de Farias, Federação, Vale das Pedrinhas, Ladeira do Cacau, Avenida Contorno, Canabrava, São Cristóvão, Itapuã, Saramandaia, Rio Vermelho, Luiz Tarquínio, Saboeiro, Santa Mônica, Costa Azul, Estrada Velha do Aeroporto, São Caetano, Liberdade, São Tomé de Paripe, Estrada da Rainha, Fazenda Grande, São Marcos e outras 26 localidades.

A Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (Conder) também foi responsável pela contenção de 107 encostas em 47 bairros da capital. Até o momento, já foram entregues 33 obras.

Porque a ocupação das encostas dos morros contribui para a ocorrência do deslizamento da terra?

Primeiro, porque as construções vão eliminando a cobertura vegetal da área. Segundo, porque a terra extraída para aplainar o morro na área habitada geralmente é jogada para baixo e fica “solta”. Por último, porque as vilas criadas nas encostas criam lacunas, que podem “canalizar” (e intensificar) os deslizamentos.

Qual a principal causa dos deslizamentos de terra?

Eles são causados por fatores naturais, condicionados pelas fortes chuvas e pelas características relativas ao solo e ao relevo, e também por fatores antrópicos, entre os quais estão o desmatamento de encostas e as construções em áreas irregulares.

Por que a ocupação das encostas de morros contribui?

A ocupação desordenada e o desmatamento de morros e encostas são os principais fatores de risco para a ocorrência de deslizamentos. Isso porque a vegetação ameniza os impactos causados pela chuva, já que suas raízes ajudam a estabilizar o solo. No entanto, vale ressaltar que nem todo tipo de planta ajuda.

Quais as causas mais frequentes dos deslizamentos de terra e suas consequências?

Os deslizamentos de terra podem ser iniciados em declives já à beira do movimento por chuvas, derretimento da neve, mudanças no nível da água, erosão do riacho, mudanças nas águas subterrâneas, terremotos, atividade vulcânica, perturbação das atividades humanas ou qualquer combinação desses fatores.