Porque não consigo chorar quando alguém morre

O luto pode se transformar em doença quando se torna mais difícil que o habitual: é o que os especialistas chamam de “luto complicado”.

Lidar com a perda de um ente querido não é tarefa fácil. Entretanto, o luto é um processo pelo qual – infelizmente – todas as pessoas deverão passar a fim de amenizar o sofrimento gerado pela ausência do outro. O problema ocorre quando essa fase natural se torna mais difícil que o habitual: o que os especialistas chamam de “luto complicado”.

A psicóloga Juliana Batista, do HCor (Hospital do Coração), em São Paulo, explica que todo processo de luto tem um começo, um meio e um fim. “Diversas reações emocionais são despertadas [com a morte de alguém], como tristeza, ansiedade, culpa e raiva. Isso é muito comum. A pessoa também pode, num primeiro momento, querer se isolar do convívio social. Em relação às alterações físicas, podem ocorrer sudorese, palpitação e fraqueza, já que o corpo fica sob estresse. A reação varia de pessoa para pessoa, mas não há como evitar o processo de luto.”

Todo mundo se pergunta quanto tempo esse processo vai durar. Segundo a psicóloga, é  bastante comum ouvir a queixa: “faz tanto tempo que fulano faleceu e a esposa ainda não superou a perda”. Na verdade, não existe um tempo certo para superar a perda de alguém, isso depende de cada pessoa, do modo como ela enfrenta e aceita a situação. Para alguns pode demorar meses, para outros, anos.

“O primeiro ano após a perda é o mais difícil, porque é nesse ano que ocorrem todos os primeiros aniversários sem a pessoa próxima. Isso não significa que seja necessário um ano exato para superar a morte. Um processo de luto é bem sucedido e finalizado quando a pessoa consegue superar a perda e seguir em frente. Não é que ela vai esquecer a pessoa, pois as lembranças e a ausência continuarão. Entretanto, a perda não vai mais ocupar um lugar de destaque [na vida dela]”, explica a psicóloga.

Quando por algum motivo o indivíduo não consegue passar por essa fase, ele entra no chamado “luto complicado”. Geralmente, isso acontece com pessoas que perderam entes de maneira abrupta, como em acidentes, tragédias e casos de suicídio e na morte precoce de um filho. “Nesses casos, todo pensamento e ato estarão associados à perda, a pessoa não consegue se desligar. Ela deixa de realizar as atividades costumeiras, como ir ao trabalho e ao supermercado. O problema é que, diante de um enlutado crônico, muitas vezes as pessoas querem medicá-lo para sanar os sintomas quando, na verdade, ele precisa ser ouvido”, completa a médica.

Em contrapartida, há aqueles que agem como se nada tivesse acontecido e, alguns dias depois da morte, voltam a trabalhar e lotam a agenda de compromissos. Mas, ainda segundo a especialista, indivíduos que agem assim, na verdade, precisam de cuidados especiais, pois ocupar-se excessivamente é  uma maneira de fugir do problema.

“É uma forma de luto inibido. A pessoa não manifesta as formas de reação mais frequentes, como tristeza e raiva. Ou, então, de luto adiado, quando a pessoa só começa a se dar conta da perda depois de uns quinze dias”, diz Batista.

Aqueles que têm algum familiar ou amigo muito doente podem começar a vivenciar o processo de luto antecipatório, antes da morte do ente. “Dependendo do caso, esse pode ser um fator de proteção para que o familiar, de repente, não entre num luto complicado. Porque as perdas progressivas vão acontecendo num intervalo de tempo considerável e assim ele vai se acostumando com a ideia de não ter mais aquela pessoa ao lado”, esclarece.

Em relação às cinco fases do luto (negação, raiva, barganha, depressão e aceitação), que já foram amplamente divulgadas, a psicóloga esclarece que é difícil enquadrar o paciente em uma delas, pois às vezes ele pode passar por todas as fases ao mesmo tempo ou simplesmente não passar por nenhuma.

Serviço de terapia gratuita em São Paulo

A Faculdade de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo) oferece psicoterapia gratuitamente à comunidade. Para agendar basta ligar na secretaria da instituição: (11)3091-8248 / 8223.

Porque não consigo chorar quando alguém morre

Na maioria das culturas o choro é uma das formas mais comuns de expressão da dor e do sofrimento. Mas, e quem não chora? Significa que não está sofrendo? O senso comum defende a ideia de que quem chora está sentindo a dor da perda com intensidade, logo parece que quem não age desta forma não está sentindo a tristeza. Esta afirmação, além de não ser verdadeira, gera muita culpa naqueles que não conseguem expor seu pesar e sofrimento pela morte de uma pessoa querida de uma forma visível

Na mesma família, reações diferentes são comuns e normais

Por razões particulares, ligadas muitas vezes à história de vida e a traços de personalidade, as pessoas têm jeitos diferentes de expor seus sentimentos. Algumas pessoas demonstram alegria, tristeza, preocupação de forma muito clara. Outras são discretas nessas manifestações mas mesmo assim conseguem dar vazão a elas. Há aquelas que têm verdadeira dificuldade em demonstrar o que realmente estão sentindo. Isto não quer dizer, absolutamente que não estejam sentindo.

A demonstração da dor não dimensiona necessariamente o tamanho dela. Mas é muito comum que no luto familiar, surjam comentários:
“será que ele(a) não está sentindo nada?”
“parece que nem sentiu a morte da mamãe porque nunca o vi chorando”
“não quis ir ao cemitério, não deve ter consideração por quem perdeu”

Para atravessar o luto é importante que cada pessoa encontre sua forma de dar vazão à dor da perda que não necessariamente será semelhante à do outro familiar. Se para alguns, ir ao cemitério é uma forma de encontrar algum alívio e viver a saudade de quem partiu, para outros, esta visita pode tornar-se altamente estressante, tensa e de pouco alívio. O núcleo familiar deve ter espaço para que cada membro demonstre sua dor do jeito que pode, do jeito que lhe pareça melhor.

O que faz as pessoas se expressarem de forma diversa

A psicologia tem se ocupado do estudo das diferenças individuais em vários campos, incluindo o luto. Sabe-se que mesmo gêmeos idênticos têm personalidades completamente diferentes, porque cada ser humano é único em seu jeito de ser, de pensar, de agir e de sentir. Assim também há muitos fatores que determinam a forma como cada pessoa reagirá à perda de alguém amado, como a história de vida, a infância, perdas anteriores, sua capacidade de vincular-se, a relação que tinha com quem perdeu, a idade, o sexo, a cultura, dentre outras variáveis. Sendo assim, uma mesma perda produz diferentes processos de luto numa família.

A forma como as crianças manifestam seu pesar é diferente da forma como um idoso o faz. A época da vida em que perdemos uma pessoa pode ser um fator importante. Os adolescentes, por exemplo, vivem uma fase da vida em que a onipotência é uma característica marcante- “posso viver perigosamente porque nada vai acontecer comigo”- e o processo de luto deles pode ser altamente influenciado por esta postura, sendo comum que eles tenham atitudes de negação diante da dor da perda de alguém querido.

Em geral, homens e mulheres têm formas diferentes de ser, especialmente porque nossa cultura impõe valores rígidos ao homem quanto à expressão de seus afetos. O famoso “homem não chora” é ouvido por eles desde a infância e pode colaborar para um processo doloroso de contenção das emoções. Assim, as mulheres parecem ter mais “autorização social” para manifestarem suas emoções, ao passo que aos homem cabe o papel de restaurador da família e eles acham que tem que voltar rapidamente para vida como se nada tivesse acontecido. Esses padrões pregados pela cultura podem ser fortes complicadores para aqueles que não se ajustam ao esperado. É importante que a família compreenda as diferentes manifestações do luto para que isto não produza mais sofrimento. Somos únicos porque nossa história é única e por isso temos um jeito único de dizer o que sentimos.

Lélia de Cássia Faleiros Oliveira – Psicóloga Clínica, Mestre e Doutoranda pela USP, com curso de atualização no LEM – USP (Lab. de Estudos sobre a Morte). Trabalha com enlutados e desenvolve projetos de apoio ao luto em instituições.

É normal não chorar quando um parente morre?

A "ausência de emoções/sentimentos" durante o luto pode ser comum e não reflete nada negativo sobre você como pessoa ou o seu amor pela pessoa que morreu. Reconhecer essa "ausência" é o primeiro passo para ajudá-lo.

Porque estou triste e não consigo chorar?

A dificuldade em conseguir demostrar seus sentimentos através do choro pode estar relacionado com situações passadas que foram percebidas com muita intensidade e que, por pensamentos disfuncionais, você bloqueou, e "segurou o choro", esses pensamentos podem ser: "sempre fui muito tola de chorar por qualquer coisa" ou " ...

O que acontece com uma pessoa que não consegue chorar?

Cada pessoa tem uma válvula de escape para soltar as emoções, e para algumas isto ocorre por meio do choro. Mas, se você não falar, não chorar, não colocar aquele sentimento para fora, seu corpo pode 'explodir', gerando doenças que não tem explicação.

É possível sentir a morte de alguém?

Luto e dor no peito Por isso, essa dor costuma ser confundida com um problema cardíaco mais sério. No entanto, estudos afirmam que a dor do luto pode, de fato, causar alterações no coração. A pessoa que perde um ente querido pode passar a sentir dor no peito e palpitação.