O que significa a qualificação para o direito internacional privado?

Doctoral Thesis

DOI

https://doi.org/10.11606/T.2.2021.tde-13072022-085449

Document

Author

Full name

Kim Modolo Diz

Institute/School/College

Knowledge Area

Date of Defense

Published

São Paulo, 2021

Supervisor

Committee

Monaco, Gustavo Ferraz de Campos (President)
Bechara, Ana Elisa Liberatore Silva
Costa, José Augusto Fontoura
Lopes, Dulce Margarida de Jesus
Ribeiro, Marilda Rosado de Sá
Vicente, Dário Manuel Lentz de Moura

Title in Portuguese

Os conflitos de qualificação no direito internacional privado

Keywords in Portuguese

Competência internacional
Conflito de jurisdição
Direito Internacional Privado

Abstract in Portuguese

O direito internacional privado tem a função de resolver os conflitos entre os diversos ordenamentos eficazes na regulação de determinada questão jurídica plurilocalizada. Para localizar os conflitos indicando ordenamento materialmente competente, o direito internacional privado dispõe de um método cujo primeiro passo é a qualificação. Qualificação é o instituto de direito internacional privado que designa qual dentre as regras de conflitos do foro é a aplicável e, portanto, apta para indicar o ordenamento jurídico competente a regular certa questão jurídica plurilocalizada. A forma como um sistema de direito internacional privado escreve suas normas influencia no passo qualificatório. As teorias da qualificação são retomadas e reanalisadas, a fim de extrair a verdadeira essência da qualificação, resultando em um exercício de subsunção normativa. Os conflitos de qualificação ocorrem quando não é possível determinar a regra de conflitos aplicável, pois mais de uma aparenta ser aplicável ou porque nenhuma aparenta ser aplicável. As soluções aos conflitos de qualificação devem ser inspiradas no princípio da harmonia jurídica internacional. e/ou em outros princípios e objetivos do direito internacional privado.

Title in English

Conflicts of Characterization in Private International Law

Keywords in English

Applicable Law
Characterization
Choice of Law
Conflict Rule Theory
Conflicts of Characterization
International Harmony
Private International Law

Abstract in English

Private international law must solve any conflicts arisen by the diversity of legal systems in contact with anygiven multinational legal problem. To fulfill its goal and recognize the applicable legal system, private international law has its own method which first step is characterization. Characterization is a legal instute that designates which conflict rule of the forum is applicable. Each private international legal system is able to create conflict rules and the way each system does it influences how it elaborates the characterization step. Characterization theories are reanalyzed to determinate the essential aspect of characterization in private international law: normative subsumption. Conflicts of characterization take place when its not possible to determinate the applicable conflict rule because none of them or more than one rule seem to be applicable. Any solution to conflicts of characterization must comply with the principle of international harmony and/or another principles or goals or private international law.

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Publishing Date

2022-07-18

DIN0314
Direito Internacional Privado | Parte Geral (Conflito de Leis no Espaço)
Associado Gustavo Ferraz de Campos Monaco
26/09/2017
Aula 7

QUALIFICAÇÕES

RELEMBRANDO ALGUNS MEGA-CONCEITOS

  • Tinha os estatutários. Eles definiam estatutos: quem carrega que tipo de lei para cada lugar (em resumo);
  • Savigny: fez uma mudança de linha de pensamento com respeito a problemática de saber qual lei aplicar a cada situação. Ele disse que os estatutários estavam equivocados. O que deveria se saber é que, para cada relação jurídica, haveŕa uma sede. Essa sede será representada por um elemento de conexão (“continente sem conteúdo”);
  • Categorias de conexão: não são moldes vazios, mas são, certamente, formas elásticas;
  • Na Lei de Introdução do Direito Brasileiro: é possível encontrar “categorias de conexão” e elementos de conexão (domicílio, local da constituição, etc.). Esse elemento de conexão é o “continente sem conteúdo”: preciso ver no caso concreto, porque esse elemento, por si só, não significa nada.
  • EX. Art. 8° da Lei de Introdução, sobre bens. Estou pensando nos bens e nas relações a eles concernentes ─ aqui estão agregadas duas categorias: direito das coisas e dos bens;
  • PROFESSOR DIZ. Matéria de conexão é uma matéria plástica, que se amolda às circunstâncias. Com isso, dá para entender direitos reais que acabam extintos. EXEMPLO. Enfiteuse, existia no CC antigo, CC/02 praticamente fez com que a enfiteuse desaparecesse (não pode haver novas, mas persistem as antigas);
  • O QUE IMPORTA. Categoria de enfiteuse desaparece com o CC/02. Ao mesmo tempo, o novo CC introduz um direito real que não existia no CC/1916, o direito real de superfície;
  • Portanto, no campo do direito das coisas, segundo o eixo temporal, direitos somem. Se é assim, também deveríamos reconhecer que existam diferenças no eixo espacial

DIFERENÇAS NO ESPAÇO

  • No Brasil, damos uma determinada conformação jurídica a um fato importante. Num outro ordenamento, esses mesmos fatos podem ter uma conformação jurídica igual ou distinta;
  • É aqui que surge o problema da qualificação para o direito internacional privado;
  • Não se trata de uma qualificação de fatos, mas sim, uma qualificação jurídica;
  • EXEMPLO. Se digo que a regência depende da lei do local onde o objeto estiver situado, qualifico de maneira a não qualificar fatos, mas sim, qualifico juridicamente;
  • No direito internacional privado, não há descrição de fatos e/ou acontecimentos, mas sim, há descrição de institutos;
  • “O modo de qualificar do direito internacional privado é diferente do que vemos das qualificações vistas pelos professores de direito civil ou processual”;
  • Aqui, não cabe estabelecer diferença entre, receber dinheiro pela morte do cônjuge por causa da forma do regime de bens estabelecida no casamento ou por causa de uma sucessão disputada com filhos do cônjuge;

QUALIFICAÇÕES NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

  • São fatos que serão trazidos ao nosso escrutínio. Mas não cabe nessas situações escrutinar conforme o que aprendemos com o direito privado brasileiro e então, fazer conexão com o direito internacional privado;
  • Ao fazer esse tipo de coisa, 3 possibilidades:
  • 1. Dar sorte de, ordenamento brasileiro tratar a situação da mesma forma que o ordenamento estrangeiro. Parto de uma qualificação, remeto ao direito estrangeiro e encontro a mesma qualificação #sorte;
  • ──
  • 2. Direito brasileiro qualificar aquela situação de um modo mas, no direito estrangeiro, a qualificação dada àquela relação jurídica é de mesma natureza, mas um instituto jurídico diferente;
  • EXEMPLO. União de pessoas do mesmo sexo que no Brasil foi registrado e reconhecido como casamento (matrimônio civil). Esse casal se muda para um Estado estrangeiro. Esse Estado, na hora que os acolhe, indaga-os sobre o estado civil. Nesse Estado, não é permitido o casamento entre pessoas do mesmo sexo, registra-os como união estável (no Brasil, casamento e união estável têm a mesma dignidade e finalidade para a formação de família [e, por isso, as regras diferentes para sucessão de casamento e união estável que estavam no CC foram consideradas inconstitucionais pelo Supremo]). Nesse Estado estrangeiro, portanto, acontece um “downgrade” da situação desse casal. Passam-se os anos, esse casal resolve se separar. E agora, é um divórcio? É o fim da união estável? Eles só possuem patrimônio no Brasil, mas, a grana que constituíram no outro país não virou riquezas. Nesse caso, importa a separação aqui no Brasil, que terá impactos econômicos. Eles vão dissolver a relação no Brasil. Mostram o papel brasileiro: casados. Mas eles são domiciliados nesse outro país, no qual não são casados, mas sim, há a união estável. E agora, juiz, o que fazer? Como eles são domiciliados no exterior, precisa ser aplicada a lei do país estrangeiro. Caça regras relacionadas à dissolução da União Estável. Mas e aí, vai dar treta? Se pá, até que não. União Estável e casamento são coisas diferentes, mas, na comparação de gênero, essas duas espécies estão no mesmo gênero #ufa;
  • ──
  • 3. Vou para o direito estrangeiro e não encontro aquilo que preciso. Aquilo que no direito nacional é relevante, no direito estrangeiro é irrelevante, não há considerações jurídicas sobre o tema. Aí fudeu de vez!
  • Etienne Bartin (FRA) e Franz Kahn (ALE), lá no fim do século XIX, foram os primeiros que perceberam essa treta
  • Bartin cita 3 casos da jurisprudência francesa do fim do séc. XIX / início do século XX;

CASOS TRETA DE ETIENNE BARTIN

  • CASO 1. “Sucessão da viúva maltesa”;
  • Casal de malteses (Ilha de Malta, jurisdição do Reino Unido, vigorava código Rouen). Havia regras sobre a relação patrimonial desse casal. Eles eram classe média baixa. Eram casados com separação de bens. Se mudaram para a Argélia (direito francês). Homem morreu. Não tinha ascendentes mas tinha colaterais. Na França, lei da sucessão era a lei da nacionalidade (como o moço era Maltês, era a lei de Malta que valia). Segundo a lei de Malta, a mulher estava para receber dinheiros antes dos irmãos. Mas, na lei de Malta, isso não era caso de sucessão, mas sim, caso do regime de bens do casal (e, portanto, os irmãos é que deveriam receber dinheiros antes);
  • CASO 2. “Testamento hológrafo do holandês”
  • Testamento hológrafo: particular, feito por próprio punho. Valia super na França, mas não era válido formalmente na Holanda. Homem holandês, residente na holanda, foi fazer uma viagem de negócio à França. Ele passou mal. No hospital, fez um testamento correndo achando que ia morrer. Segundo a lei francesa, testamento válido. Mas o homem não morreu. Voltou para a Holanda e não fez outro testamento. Um belo dia, ele morreu. No dia da morte, herdeiros que receberiam mais se o testamento não valesse queriam invalidar o testamento. Quem era apontado no testamento queria que este valesse. Direito holandês diz: é uma questão de capacidade, e capacidade é por nacionalidade, portanto, não valia. Na França, era uma questão de forma, e forma é regida pelo local onde ocorreu fato, portanto, testamento valia;
  • CASO 3. “O casamento do grego ortodoxo”
  • Grego que morava na França quer casar com francesa. Casa civilmente. Depois de um tempo, moço queria separar (porque foi pra Grécia e conheceu uma grega). Grécia só reconhecia como casamento o casamento religioso seguido segundo o rito da igreja ortodoxa grega. Tentou anular casamento francês, disse que não tinha capacidade para se casar. Grécia diz que era problema de capacidade. França diz que é problema de forma (e forma é regida pelo local onde ocorreu o fato);
  • ──
  • Nos três casos, há dois ordenamentos jurídicos presentes e só. Se qualifico de acordo com os critérios do foro, sou remetido para lei estrangeira e lá a qualificação é diferente. E agora? Vou aplicar o direito desse lugar estrangeiro? Ou parto do foro pensando que a lei aplicada é estrangeira mas, na verdade, chegando lá, eles invertem e consideram que a lei aplicada seria do local de onde saí;
  • Lex fori. Lei do juiz que foi tirado da inércia para qualificar o litígio. Bartin diz que deveria sempre valer a lex fori;

CRÍTICAS AO TEXTO DE BARTIN

  • Despagnet rebate Bartin (e, na Alemanha, texto de Kahn é rebatido por Wolff);
  • O que eles dizem?
  • Parabéns! Perceberam o problema. Mas, partir da ideia de foro nem sempre é bom, porque nem sempre vai dar certo. Se começar sempre qualificando pela lei estrangeira, pela lex causae (lei material que vai coincidir com o litígio, talvez dê mais certo
  • A TRETA. Estavam presumindo que a lei estrangeira sempre seria aplicada, mas nem sempre é assim;

QUAL O EQUÍVOCO DE TODO ESSE SISTEMA?

  • Exemplos sempre consideravam apenas dois ordenamentos. E se eu coloco mais de dois ordenamentos no caso?
  • Também tem que saber sobre que tipo de problema estamos falando. É família? É sucessão? É sociedades?

BARTIN REBATE OS CRÍTICOS

  • Beleza, não dá para começar nem da lex fori nem da lex causae;
  • Tem que saber sobre o que estamos falando, como qualifica;

DOUTRINA GERAL HOJE DIZ:

  • Qualificação deve ser feita de acordo com a lex fori, direito material vigente diante do qual estou propondo a ação;
  • E ONDE ESTÁ ESCRITO ISSO NA NOSSA LEI? Não está escrito em lugar nenhum! É uma grande tradição doutrinária;.
  • Sobre qualificação, na Lei de Introdução, no caput do art. 8° e 9°, parece dizer que a qualificação deveria ser feita de acordo com a lex causae;
  • ──
  • Art. 8o Para qualificar os bens e regular as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados.
  • Art. 9o Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituirem.
  • ──
  • O legislador diz “para qualificar os bens”, é uma exceção, em princípio, à qualificação segundo critério da lex fori. Aparentemente eu preciso saber onde está o bem e essa forma ira dizer como o bem se qualifica;
  • “Ou seja, aparentemente, aquilo que parece ser uma exceção, é só exceção para a qualificação dos bens;
  • ──
  • LUCAS PENSA. Minha nossa senhora não tá dando pra entender direito esse trem

LUGAR DO ACORDO

  • Art. 9o . § 2o A obrigação resultante do contrato reputa-se constituida no lugar em que residir o proponente.
  • ──
  • Alguém faz uma proposta. Alguém aceita. Há diferenças temporais e espaciais ─ contrato entre ausentes. Temporalmente, nossa legislação cuida disso. Mas e espacialmente?
  • Além disso, e hoje, que há facetime e skype e afins? Negocio um contrato, eu do Brasil, com alguém da França, via facetime. E aí, qual é o lugar do acordo?
  • SEGUNDO O PROFESSOR. Qualificação hoje é tudo pela lex fori, não tem mais nada pela lex causae. Há sim uma subqualificação, falar se o bem é fungível ou não, etc (para as categorias do bem);

RESUMO ATÉ AGORA

  • Para enquadrar uma determinada situação nas caras jurídicas que já temos, temos que partir do específico para o geral. E, para isso, tem que entender, primeiramente, o que as partes querem. Partir do específico, dos fatos, para o enquadramento jurídico, vai generalizando para então entender as matérias tratadas pela lei de introdução das normas do direito brasileiro;
  • Feita a qualificação, a gente pode evoluir para aplicar o direito do foro ou então ser remetido ao direito estrangeiro (e então estudar no direito estrangeiro);
  • IMPORTANTE. Se errar na qualificação, pode dar certo no final, mas por pura sorte. Mas pode dar ruim e o resultado ser completamente errado;
  • E o enquadramento dos fatos, subsunção dos fatos à norma, aprendemos graças aos outros todos campos do direito;

SEMINÁRIO SEMANA QUE VEM

  • Texto no moodle;
  • Responder a uma ou duas questões reflexivas;
  • Individual (“diferente da prova”);
  • Com consulta ao texto;
  • Cada um coloca sua leitura e sua visão do texto;
  • Professor estará semana que vem em Lyon, “estarei brindando a vocês, sadicamente torcendo para que tudo corra bem”.

O que é qualificação para o Direito Internacional Privado?

Qualificação é o instituto de direito internacional privado que designa qual dentre as regras de conflitos do foro é a aplicável e, portanto, apta para indicar o ordenamento jurídico competente a regular certa questão jurídica plurilocalizada.

O que é qualificação no direito?

A qualificação, assim, é utilizada sempre que as normas jurídicas forem necessárias para regular uma situação concreta que interesse ao Direito (RÁO, 1977, p. 443). A qualificação contribui para traduzir em termos de direito os fatos concretos, para que seja possível a aplicação de um determinado regime jurídico.

Qual a teoria preponderante com relação à qualificação?

Segundo Jacob Dolinger, o direito brasileiro adota, quanto à qualificação, a teoria da lex fori. - Ocorre somente quando não está claro como deve ser qualificada a norma aplicável conforme do direito internacional privado estrangeiro.

Quais são as características fundamentais do Direito Internacional Privado?

R: O direito internacional privado é um sobredireito, pois indica o direito aplicável e não soluciona um litígio, assim, trata-se de um ramo que possui normas conflituais, indiretas, que não proporcionam uma solução, mas trazem o direito incidente sobre determinado fato jurídico.