Qual a importância do Brasil em relação à produção de alimentos no mundo?

Segundo a FAO (2015), cerca de 805 milhões de pessoas no mundo não têm comida suficiente para levar uma vida saudável e ativa. Também, de acordo com ONU (2012), a população mundial em 2024 será superior a 8 bilhões de pessoas e, em 2050, superior a 9,5 bilhões, exigindo maior oferta de alimentos. O crescimento populacional, o aumento no consumo per capita, na renda per capita e a expansão das cidades nas próximas décadas fazem mais presente o debate sobre a incapacidade de atender às novas necessidades humanas. Pelo lado da oferta, restrições sobre a produtividade ampliam a dimensão do problema. O presente trabalho buscou analisar como o crescimento da demanda mundial de alimentos, no período de 2012 a 2024, deve elevar a demanda por novas terras produtivas no Brasil e as condições para atendê-la. Considerando-se os limites da fronteira agrícola definidos pela Embrapa (2014), conclui-se que, embora exista uma pequena área legalmente disponível para a expansão agropecuária no Brasil, as novas demandas deverão ser atendidas com aumentos de produtividade e/ou substituição de cultura, especialmente sobre a pecuária extensiva. Pequenos ajustes de produtividade regionais e a realocação produtiva serão suficientes para atender às novas demandas no período analisado.

Palavras-chaves:
demanda mundial de alimentos; uso da terra; produtividade

Abstract

According to FAO (2015), roughly 805 million people worldwide do not have enough food to have healthy and active life. In addition, according to the UN (2012), the world population in 2024 will exceed 8 billion people and, by 2050, more than 9.5 billion, requiring more food supply. Population growth, increased per capita consumption, per capita income and expansion of cities in the coming decades make the debate on the inability to meet the new human needs more present. Regarding supply, constraints on productivity expand the size of the problem. This study aimed to analyze how the growing world demand for food, in the period from 2012 to 2024, may increase the demand for new farmland in Brazil and the conditions to meet it. Considering the limits of the agricultural frontier defined by Embrapa (2014), it is concluded that, although there is a small area legally available for agricultural expansion in Brazil, new demands must be met with increased productivity and/or replacement of culture, especially on extensive livestock farming. Small regional productivity adjustments and production relocation will be sufficient to meet new demands in the analyzed period.

Keywords:
global demand for food; land use; productivity

1. Introdução

Uma em cada nove pessoas no mundo (ou cerca de 805 milhões de pessoas) não têm comida suficiente para levar uma vida saudável e ativa, de acordo com a FAO (2015)FAO, The state of food insecurity in the world 2014. Food and Agriculture Organization of the United Nations,Home, Disponível em<Disponível emhttp://www.fao.org/publications/sofi/en/ > Acessojul, 2015.
http://www.fao.org/publications/sofi/en/...
. O problema de insegurança alimentar existente hoje é proveniente da impossibilidade das classes mais pobres de terem acesso aos alimentos necessários para uma alimentação saudável e balanceada. As projeções de crescimento populacional, do aumento do consumo per capita, da expansão das cidades e das restrições no uso de terra nas próximas décadas fazem mais presente o debate sobre a incapacidade de atender às necessidades humanas por alimentos.

Com relação à demanda, as projeções populacionais indicam crescimento acelerado e contínuo nas próximas décadas, o que deve elevar a demanda de alimentos em geral. De acordo com a ONU (2012)ONU, United nations, department of economic and social affairs The United Nations, Population Division, Population Estimates and Projections Section, 2012., a população mundial em 2024 será superior a 8 bilhões de pessoas e, em 2050, superior a 9,5 bilhões. Tais números representam crescimento de 13,16% de 2012 a 2024 e de 34,90% entre 2012 e 2050. Este crescimento deve ocorrer principalmente em países em desenvolvimento, mais especificamente na Nigéria, na República Democrática do Congo, na Etiópia e na Índia, onde o número médio de filhos vem crescendo de forma acelerada nos últimos anos (ONU, 2012ONU, United nations, department of economic and social affairs The United Nations, Population Division, Population Estimates and Projections Section, 2012.).

Além da expansão populacional, a concentração nas cidades e o crescimento da renda deve ampliar a demanda de alimentos. A população urbana mundial passou de aproximadamente 746 milhões em 1950 para 3,9 bilhões em 2014. A ONU projeta que o crescimento da população mundial pode trazer mais 2,5 bilhões de pessoas para as áreas urbanizadas até 2050, com quase 90% do crescimento centrado na Ásia e na África. Esse processo de urbanização deve ocorrer em conjunto com o crescimento da renda per capita e mudanças no comportamento do consumo da população mundial.

Pelo lado da oferta, a expansão da fronteira agrícola é bastante restrita. Segundo a FAO (2013)FAO, Fao statistical yearbook 2013 world food and agriculture. Food and Agriculture Organization of the United Nations, Romep. 307, 2013., a disponibilidade de áreas agrícolas está centrada em poucos países; cerca de 90% das terras para a expansão agrícola estão na América Latina e África-Subsaariana. Além disso, países como China e EUA não têm mais novas áreas para a exploração agrícola.

Na América Latina, o Brasil se apresenta como um importante produtor mundial de alimentos e com grande potencial de expansão da oferta. Em 2012 foram 246.629 mil hectares na produção agropecuária, sendo 28% na produção agrícola, 69% na produção pecuária e 3% no plantio de floresta. As áreas agricultáveis continuam em expansão, embora em ritmo mais lento; entre 1995 e 2006, houve crescimento de 11,8 milhões de hectares para exploração agropecuária no Brasil, segundo dados do Censo Agropecuário (IBGE, 2015IBGEd. Banco de Dados Agregados. Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA- Pesquisa Pecuária Municipal. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: Disponível em: http://www.ibge.gov.br . Acesso em: 22 ago. 2015.
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). Mais recentemente, as preocupações ambientais e a preservação das florestas nativas têm levado ao maior controle sobre essa expansão.

Diante das restrições sobre a expansão do uso de terra para uso agropecuário no Brasil, a ampliação da produtividade se apresenta como um caminho necessário para a ampliação da oferta. Segundo FAO (2013)FAO, Fao statistical yearbook 2013 world food and agriculture. Food and Agriculture Organization of the United Nations, Romep. 307, 2013., foi exatamente o crescimento da produtividade que permitiu elevar a oferta acima da demanda mundial de alimentos no período pós-revolução tecnológica no campo.

Para as próximas décadas, o aumento da produtividade também enfrenta importantes restrições. Segundo FAO (2009)FAO, How to feed the world in 2050. High level expert forum Convened at FAO Headquarters in Rome on 12-13 October, 2009., o modelo tecnológico atual está esgotado e observa-se redução nas taxas de crescimento da produtividade das principais lavouras nas últimas décadas. Além disso, Cordell et al. (2009CORDELL Dana, DRANGERT Jan-Olof, WHITE Stuart. The story of phosphorus: global food security and food for thought. Global environmental change, v. 19, n. 2, p. 292-305, 2009.) destacam que agricultura moderna é dependente de fósforo derivado do fosfato de rocha, que é um recurso não renovável, e as reservas globais podem ser esgotadas em 50-100 anos. Outro aspecto importante são as mudanças climáticas. Segundo estudo de Abramovay (2010ABRAMOVAY, Ricardo. Alimentos versus população: está ressurgindo o fantasma malthusiano? Ciência e Cultura, v. 62, n. 4, p. 38-42, 2010.), verifica-se clara redução na produtividade de algumas culturas quando expostas a temperaturas superiores a 34° C. IFPRI (2009)IFPRI, Climate change. Impacts agriculture and costs of adaptation.Food Policy Report. Washington. IFPRI, 2009. Disponível em< Disponível emhttp://www.ifpri.org/publication/climate-change-impact-agriculture-and-costs-adaptation .> Última consulta, 25/07/2015.
http://www.ifpri.org/publication/climate...
fez um estudo com base em diversos modelos climáticos e o resultado reforça a preocupação sobre o declínio geral do crescimento da produtividade agropecuária.

O debate sobre incapacidade de atendimento das demandas futuras de alimentos está sendo retomado por diversos autores, como Abramovay (2010ABRAMOVAY, Ricardo. Alimentos versus população: está ressurgindo o fantasma malthusiano? Ciência e Cultura, v. 62, n. 4, p. 38-42, 2010.), Da Silveira et al. (1992DA SILVEIRA, Fernando Gaiger, DE ALMEIDA, Maria Elena Knüppeln. Fome, produção alimentar e distribuição de renda. Indicadores Econômicos FEE, v. 19, n. 4, p. 151-166, 1992.), Pereira (2010PEREIRA, Camila Potyara. A pobreza, suas causas e interpretações: destaque ao caso brasileiro. Revista SER Social, n. 18, p. 229-252, 2010.) e Falcon et al. (2005FALCON, Walter P., NAYLOR, Rosamond L., Rethinking food security for the twenty-first century. American Journal of Agricultural Economics, v. 87, n. 5, p. 1113-1127, 2005.). Dentre os estudos mais recentes, Company (2011)McKinsey & Company. Resource Revolution: Meeting the world’s energy, materials, food, and water needs. Nov, 2011. e FAO (2013)FAO, Fao statistical yearbook 2013 world food and agriculture. Food and Agriculture Organization of the United Nations, Romep. 307, 2013. analisaram as restrições da fronteira agrícola, mas não abordaram o caso brasileiro. Cordell et al. (2009CORDELL Dana, DRANGERT Jan-Olof, WHITE Stuart. The story of phosphorus: global food security and food for thought. Global environmental change, v. 19, n. 2, p. 292-305, 2009.) e Cordell et al. (2011)CORDELL, D. et al. Towards global phosphorus security: A systems framework for phosphorus recovery and reuse options. Chemosphere, v. 84, n. 6, p. 747-758, 2011. analisaram as restrições da produtividade agrícola em relação ao uso de insumos. No entanto, poucos estudos discutem os limites para a expansão agropecuária no Brasil. Isso se deve, em grande parte, ao desconhecimento desse limite. Como destaca Saywer (2013)SAYWER Donald R. Fluxo e refluxo da fronteira agrícola no Brasil: ensaio de interpretação estrutural e espacial. Revista Brasileira de Estudos de População, v. 1, n. 1/2, p. 3-34, 2013., para alguns pesquisadores a fronteira agrícola brasileira não existe.

Os estudos mais recentes sobre o uso de terras no Brasil em função do crescimento da demanda mundial são apresentados pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP, 2014FIESP, Projeções para o agronegócio brasileiro. Federação das Indústrias de São Paulo.nOutlook FIESP, 2014.) e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA, 2014MAPA, Projeções do agronegócio- Brasil 2013/2014 a 2023/24. Projeções de Longo Prazo. Ministério da Agricultura e Abastecimento, Brasília. DF, 2014.). Porém, esses dois trabalhos não avançam no debate sobre a exaustão dos recursos naturais, mudanças na produtividade agropecuária e os limites da fronteira agrícola.

Nesse contexto, este trabalho busca analisar como a expansão da demanda mundial de alimentos por produtos brasileiros na próxima década deve elevar as necessidades por novas terras produtivas no País, e quais os avanços, em termos de produtividade, são necessários nas culturas agropecuárias. A hipótese apresentada é que, para o Brasil atender à expansão das demandas por produtos agropecuários até 2024, é necessário expandir a produtividade e áreas plantadas. O estudo utiliza estimativas de crescimento da demanda por exportações e consumo interno do Brasil entre 2012 e 2024 dos principais produtos alimentícios e outros produtos agropecuários (celulose e etanol), relacionando-os à necessidade de produção e terras.

Além desta introdução e problemática, o artigo apresenta, na seção 2, uma breve revisão teórica, na seção 3, os aspectos metodológicos, seguidos dos resultados e análises na seção 4. Por fim, são apresentadas algumas conclusões.

2. Disponibilidade de novas terras agropecuárias no mundo e no Brasil

Lal (1990LAL. R., STEWART. B.A. (eds)., Soil erosion and land degradation: The global risks. in: Advances in soil science. Springer-Verlag, New York.1990.) informa que a área terrestre no mundo, adequada para a agricultura, incluindo pecuária, em uso e potencial, compreende cerca de 3 bilhões de hectares. Entretanto, a FAO (2013)FAO, Fao statistical yearbook 2013 world food and agriculture. Food and Agriculture Organization of the United Nations, Romep. 307, 2013. constata que, atualmente, mais de 1,5 bilhão de hectares de terras são usadas para a produção agrícola no mundo.

A diferença das terras em uso em relação às terras potenciais constitui a área possível para expansão agrícola mundial. A FAO (2013)FAO, Fao statistical yearbook 2013 world food and agriculture. Food and Agriculture Organization of the United Nations, Romep. 307, 2013. mostra que essas áreas estão concentradas em poucos países devido ao processo intenso de expansão agrícola observado em algumas regiões do mundo. O relatório The World Resources Institute (1964INSTITUTE, W. Additional losses and abandonment of agricultural land are caused by water logging, salinization, urbanization and others processes as discussed later in the text. The World Resources Institute, Oxford University Press, New York, 1964.) constata que o crescimento da fronteira agropecuária levou a Ásia a cultivar quase 80% das terras aráveis potenciais. A Fiesp (2014)FIESP, Projeções para o agronegócio brasileiro. Federação das Indústrias de São Paulo.nOutlook FIESP, 2014. complementa esta análise ao concluir que, nos EUA, a produção só pode crescer a partir de ganhos restritos de produtividade ou da produção de determinada commodity em detrimento de outra. Essas constatações, dos limites das expansões de novas terras aráveis nos Estados Unidos, também são encontradas no trabalho de Pimentel et al. (1976PIMENTEL, David et al. Land degradation: effects on food and energy resources. Science, v. 194, n. 4261, p. 149-155, 1976.). Além disso, em conformidade com a FAO (2013)FAO, Fao statistical yearbook 2013 world food and agriculture. Food and Agriculture Organization of the United Nations, Romep. 307, 2013., para o sul da Ásia, Ásia Ocidental e África do Norte não há reservas de terras agrícolas. Neste contexto, cerca de 90% das terras potenciais para expansão agropecuária estão na América Latina e na África Subsaariana, com metade das áreas concentrada em apenas sete países - Brasil, República Democrática do Congo, Angola, Sudão, Argentina, Colômbia e Estado Plurinacional da Bolívia.

Com base nos dados da Fiesp (2014)FIESP, Projeções para o agronegócio brasileiro. Federação das Indústrias de São Paulo.nOutlook FIESP, 2014., percebe-se que o Brasil é fundamental na produção de alimentos, uma vez que é uma das poucas regiões em que ainda é possível aumentar a área agrícola. Além disso, Abramovay (2010ABRAMOVAY, Ricardo. Alimentos versus população: está ressurgindo o fantasma malthusiano? Ciência e Cultura, v. 62, n. 4, p. 38-42, 2010.) constata que, na África Subsaariana, onde também há terras disponíveis para o crescimento da área agropecuária, devem ocorrer grandes reduções da produção devido ao aquecimento global. Portanto, a produção de alimentos do Brasil para as próximas décadas se torna ainda mais relevante.

Na América Latina, o Brasil se apresenta como grande produtor mundial de alimentos, utilizando extensas áreas de terra para fins produtivos. Contudo, a demanda de novas terras no Brasil também enfrenta os desafios da conversação ambiental. A preocupação com as mudanças climáticas e o assoreamento dos rios levou ao desenvolvimento do Código Florestal Brasileiro (CFB) - Lei Federal n. 12.651/2012. Para a Embrapa (2014)EMBRAPA, Embrapa monitoramento por satélite. Resumo. Disponível em <http://www.alcance.cnpm.embrapa.br> último acesso. dez, 2014.
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, a demanda ambiental para a criação de novas Unidades de Conservação, inclusive Áreas de Preservação Permanente (APPs), abrangeria mais de 3 milhões de quilômetros quadrados. Para Daubermann et al. (2014DAUBERMANN, E. C., CHAGAS, L. S., GURGEL, A. C., SAKURAI, S. N. Expansão da área agrícola e produtividade das culturas no Brasil: testando hipóteses da legislação californiana de biocombustíveis. Revista de Economia e Sociologia Rural, 52(1), 81-98, 2014.), o crescimento das áreas de preservação ocorre pelo fato de que o mundo vive o dilema do desenvolvimento sustentável, devendo considerar os efeitos do crescimento econômico sobre o meio ambiente. Essa ponderação deve restringir a expansão de novas terras agrícolas nas próximas décadas.

As restrições da expansão da área agropecuária são estudadas pela Embrapa (2014)EMBRAPA, Embrapa monitoramento por satélite. Resumo. Disponível em <http://www.alcance.cnpm.embrapa.br> último acesso. dez, 2014.
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, considerando quatro cenários possíveis. O estudo da Embrapa também é citado nos trabalhos de Miranda et al. (2008MIRANDA E. E de; OSHIRO, O. T; VICTORIA D. de C; TORRESAN F. E; CARVALHO C. A. de. O alcance da legislação ambiental e territorial. Revista Agroanalysis. Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP, p. 25 - 31, dez. 2008.), Miranda et al. (2008a)MIRANDA, E. E de. Terras do Brasil: o alcance da legislação ambiental e territorial. Revista ECO-21. Rio de Janeiro, RJ, 01 nov. 2008a, p. 09. e Victória et al. (2008)VICTORIAD. de C, HOTT M. C, MIRANDA E. E. de, OSHIRO O. T. Delimitação de Áreas de Preservação Permanente em Topos de Morro para o Território Brasileiro. Revista Geográfica Acadêmica. Edição Especial SRTM - Conceitos e Aplicações. Vol. 2, No 2 (2008). P. 66-72. Segundo Miranda et al. (2008)MIRANDA E. E de; OSHIRO, O. T; VICTORIA D. de C; TORRESAN F. E; CARVALHO C. A. de. O alcance da legislação ambiental e territorial. Revista Agroanalysis. Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP, p. 25 - 31, dez. 2008., para analisar o total de área disponível para uso agropecuário no Brasil é necessário quantificar as consequências associadas às diversas restrições de uso e exigências de preservação ambiental.

Na construção da análise da disponibilidade de terras agropecuárias, a Embrapa (2014)EMBRAPA, Embrapa monitoramento por satélite. Resumo. Disponível em <http://www.alcance.cnpm.embrapa.br> último acesso. dez, 2014.
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não incorpora alterações locais surgidas em 2009, tais como o zoneamento ecológico-econômico da BR 163 e o Código Florestal de Santa Catarina, como áreas de preservação. Por outro lado, são consideradas que as APPs são áreas acima de 1.800 m, declives entre 25 e 45 graus, declives acima de 45 graus e topos de morro. Para o cálculo da Reserva Legal, é considerada a porcentagem de reserva, variando de 80% no bioma Amazônia a 20% na Mata Atlântica. Segundo Miranda et al. (2008MIRANDA E. E de; OSHIRO, O. T; VICTORIA D. de C; TORRESAN F. E; CARVALHO C. A. de. O alcance da legislação ambiental e territorial. Revista Agroanalysis. Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP, p. 25 - 31, dez. 2008.), a metodologia utilizada para descrever o alcance territorial da legislação ambiental e indigenista foi quantificada com base em dados do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e da Fundação Nacional do Índio (Funai). A pesquisa considerou todas as Unidades de Conservação (UCs) federais e estaduais criadas até junho de 2008.

No primeiro cenário, não são consideradas as Áreas de Preservação Permanente (APPs) no cômputo da Reserva Legal. Assim, haveria números negativos no Bioma Amazônia e no Pantanal. Sem computar esses números negativos, a área disponível para a agricultura mais intensiva seria de 2.455.350 km2, ou cerca de 29% do território nacional.

Em um cenário posterior, a instituição considera as regras existentes atualmente para inclusão das APPs no cômputo da reserva legal em todo o País. Assim, a disponibilidade das áreas agrícolas cairia para 25,6% do território nacional. Para Victória (2008), as APPs em topo de morro no Brasil, calculadas a partir do modelo MDE SRTM, com resolução espacial de 90 m, totalizam 398.910 km2. Os estados de Santa Catarina, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e o Distrito Federal apresentaram a maior porcentagem de área de preservação em topo de morro, acima de 10%. O estado de Minas Gerais apresenta a maior área total (74.000 km2), seguido pelos estados do Pará (51.615 km2) e da Bahia (37.972 km2).

Além desses cenários, o estudo da Embrapa (2014)EMBRAPA, Embrapa monitoramento por satélite. Resumo. Disponível em <http://www.alcance.cnpm.embrapa.br> último acesso. dez, 2014.
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considera a aplicação da incorporação das APPs no cômputo dos 80% destinados à reserva legal apenas na Amazônia, a única situação em que é permitida legalmente, e 20% de Mata Atlântica nas outras regiões. Dessa forma, a disponibilidade total de terras para a agropecuária seria de 2.543.981 km2 ou cerca de 30% do território nacional. Esse resultado é utilizado como referência para este artigo, uma vez que este cenário considera as áreas legalmente disponíveis para a agropecuária cumprindo as exigências legais impostas no Código Florestal Brasileiro.

No último cenário, o estudo considera a aplicação da incorporação das APPs no cômputo dos 80% destinados à reserva legal para todo o País, o que não está previsto no Código Florestal Brasileiro. Assim, a disponibilidade de terras para a agropecuária seria de 3.534.992 km2, representando 41% do território nacional. Esse acréscimo de cerca de 1.000.000 km2 ocorreria fora da Amazônia, já que lá a regra já é válida.

Após quantificar as áreas em potencial para a agropecuária no Brasil é necessário analisar qual o uso atual pela agropecuária brasileira. De acordo com Helfand et al. (2015HELFAND, Steven, MAGALHÃES, Marcelo, RADA, Nicholas E. Brazil’s Agricultural Total Factor Productivity Growth by Farm Size. Agricultural & Applied Economics Association’s 2015 AAEA & WAEA Joint Annual Meeting, San Francisco, CA, July 26-28, 2015.), a área total dos estabelecimentos agropecuários no Brasil em 2006 foi de 333,69 milhões de hectares. Conforme o IBGE (2015)IBGEa, Contas Nacionais Trimestrais. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em< http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/pib/defaultcnt.shtm> último acesso, jul. 2015.
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, pelo Censo Agropecuário de 2006, as áreas das lavouras corresponderam a 59,847 milhões de hectares, matas e florestas plantadas, a 4,5 milhões de hectares e pastagens, a 172,333 milhões de hectares. Totalizando área de 246,63 milhões de hectares, a diferença entre esse total e o total agropecuário é definida como outros usos, tais como áreas improdutivas, benfeitorias, estradas, matas nativas, entre outros.

Ferreira Filho et al. (2012)FERREIRA-FILHO Joaquim, HORRIDGE Mark. Endogenous land use and supply, and food security in Brazil. Victoria University, Centre of Policy Studies/IMPACT Centre, 2012. esclarecem que a fronteira agrícola brasileira está localizada principalmente em Mato Grosso, Rondônia e Pará, estados sobre o chamado “arco do desmatamento”. Para De Lima Filho et al. (2013)DE LIMA FILHO, Rafael Ribeiro, AGUIAR, Gustavo Adolpho Maranhão, Torres FILHO, Alcides de Moura. Mapitoba-A última fronteira agrícola. AgroANALYSIS, v. 33, n. 05, p. 15-16, 2013., a produção agropecuária expandiu-se para uma região conhecida como Mapitoba. “Mapitoba” é o acrônimo referente às áreas de chapada dos estados do Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia, de elevada aptidão agrícola e que, até recentemente, ainda se encontravam brutas, cobertas por Cerrado. Para os autores, essa região é a última fronteira agropecuária do Brasil.

Diante da limitação de terras disponíveis para a agricultura e pecuária no Brasil, Carvalho (2010CARVALHO, T.B.; FURLANETTO, L. E. Z. S. E. R. G. Potencial da produtividade e rentabilidade da pecuária de corte no mato grosso. Congresso, nº 48, Sober, 25 a 28 de jul. 2010. Campo Grande -MS, 2010.), Oliveira (2010OLIVEIRA.C.G.K. Produtividade de arroz híbrido em função da contaminação genética e densidade de semeadura. Dissertação. Universidade Federal de Pelotas Faculdade de agronomia “Eliseu Maciel”. Pelotas, Rio Grande do Sul- Brasil, 2010.) e Brasil (2015)BRASIL; Ministério da agricultura. Home. Disponível em último acesso, mar. 2015. afirmam que a ampliação da produtividade é o caminho alternativo para a ampliação da oferta. Segundo estudos da FAO de 2009 e 2013, foi exatamente o crescimento da produtividade que permitiu elevar a oferta acima da demanda mundial de alimentos no período pós-revolução tecnológica no campo. A Revolução Verde dos anos 1960 também marcou uma nova era para o crescimento da oferta via ampliação da produtividade.

Ainda, segundo Ferreira Filho et al. (2012)FERREIRA FILHO, Joaquim Bento de Souza, MORAES, Gustavo Inácio de. Climate change, agriculture and economic effects on different regions of Brazil. Environment and Development Economics, v. 20, n. 01, p. 37-56, 2015., a necessidade de reduzir a expansão da agropecuária sobre as matas naturais transforma a produção extensiva em intensiva e realoca as culturas. Para os autores, observa-se grande potencial de expansão na margem intensiva em estados como São Paulo e Santa Catarina (com o Rio Grande do Sul). Por outro lado, o Paraná tem a menor percentagem, sugerindo que, para este estado, as possibilidades de expansão agrícola na margem intensiva são mais restritas.

3. Metodologia

3.1. Matriz de insumo-produto

Para a análise dos impactos da demanda mundial de alimentos no período de 2012 a 2024 sobre a produção e o uso das áreas de terras no Brasil foi utilizado o instrumental de insumo-produto, que permitiu relacionar as novas demandas por produtos processados com a produção agropecuária e suas respectivas demandas por áreas de terra. O modelo de insumo-produto é um instrumento que permite a análise de impactos de variações na demanda sobre a produção e diversas outras variáveis relacionadas. Nele, a economia funciona como uma vasta rede tentando equacionar oferta e demanda. Entre as referências para esse tipo de método, foram utilizados os textos de Miller e Blair (2010MILLER E.R; BLAIR P.D. Imput-output analysis: foundations and extensions. Prentice- Hall Inc., Englewood Cliffs, New Jersey, 2a ed., 2010.) e Bulmer-Thomas (1982)BULMER-THOMAS, V. Input-Output Analysis in Developing Countries: Source, Methods and Applications. New York: Wiley, 1982..

O modelo de insumo-produto pode ser apresentado da seguinte forma:

∑j=1naijxj+yi=xi∀i=1,2,3,…,n. (1)

Em que aij denota o coeficiente técnico de uso de insumos do setor i que é necessária para a produção de uma unidade de produto final do setor j, xj é o produto do setor j, yi é a demanda final por produtos do setor i e xi é o total do produto i. Essa equação representa o produto total, sendo a soma das demandas para consumo intermediário e final. Pode-se representar essa igualdade no formato matricial, como segue:

Ax+y=x (2)

rearranjando os termos, tem-se o modelo analítico de insumo-produto:

xI-A=youx=(I-A)-1y (3)

pode-se ainda representar a relação entre os vetores de demanda e de produção em variação:

∆Área=∆X=(I-A)-1∆Y. (4)

Assim, o impacto total sobre a produção de uma variação na demanda final é resultado de um ciclo de ajuste produtivo nos diversos setores econômicos. Tomando-se como base coeficientes fixos entre produto e área de terra, num primeiro momento, têm-se variações de área de terra igual às variações da produção. Isso reflete a hipótese de produtividade constante.

Foram também avaliadas as possibilidades de mudança nas produtividades dos produtos agropecuários e o grau de ajustes necessário para o atendimento das novas demandas, utilizando as projeções de área total disponível para a produção agropecuária.

A matriz insumo-produto utilizada tem como base 2012. Ela foi elaborada a partir das Contas Nacionais do Brasil. Tendo como base as Tabelas de Recursos e Usos das Contas Nacionais do Brasil, divulgadas por IBGE (2015a)IBGEa, Contas Nacionais Trimestrais. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em< http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/pib/defaultcnt.shtm> último acesso, jul. 2015.
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
, a matriz de insumo-produto a preço básico foi construída, baseada nos procedimentos apresentados em Guilhoto e Sesso-Filho (2010GUILHOTO, J.J.M., U.A. SESSO FILHO. Estimação da Matriz Insumo-Produto Utilizando Dados Preliminares das Contas Nacionais: Aplicação e Análise de Indicadores Econômicos para o Brasil em 2005. Economia & Tecnologia. UFPR/TECPAR. Ano 6, Vol 23, Out/Dez, 2010.).

3.2. Fontes dos dados

Para a implementação do modelo, possíveis crescimentos na demanda por alimentos no Brasil e no mundo entre 2012 e 2024 foram avaliados. Esses números resultam de diversas estimativas divulgadas da FIESP (2014)FIESP, Projeções para o agronegócio brasileiro. Federação das Indústrias de São Paulo.nOutlook FIESP, 2014. e MAPA (2014)MAPA, Projeções do Agronegócio Brasil 2011-2012 a 2020-2022. Projeções de Longo Prazo. Ministério da Agricultura e Abastecimento, Brasília. DF, 2012..

As variações de ovos, algodão, café, etanol e suco de laranja correspondem às projeções da Fiesp (2014)FIESP, Projeções para o agronegócio brasileiro. Federação das Indústrias de São Paulo.nOutlook FIESP, 2014.; os dados do consumo de carne bovina, carne de frango, carne suína, leite, açúcar, arroz, celulose, feijão, milho, óleo de soja, soja, trigo, papel e fumo correspondem às projeções do Mapa (2014)MAPA, Projeções do Agronegócio Brasil 2011-2012 a 2020-2022. Projeções de Longo Prazo. Ministério da Agricultura e Abastecimento, Brasília. DF, 2012..

Para produção e produtividade dos principais produtos da lavoura são analisados os dados da Produção Agrícola Municipal (PAM), do IBGE. Já para o uso das terras pela agropecuária são utilizados os dados dos Censos Agropecuários e da Pesquisa Agrícola Municipal (IBGE, 2015bIBGEb. Banco de Dados Agregados. Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: Disponível em: http://www.ibge.gov.br . Acesso em:22 ago. 2015.
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). Para a produtividade da silvicultura é utilizada a produção de lenha e tora da Pesquisa Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura e área de florestas plantadas disponibilizada pelo IBGE (2015b)IBGEb. Banco de Dados Agregados. Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: Disponível em: http://www.ibge.gov.br . Acesso em:22 ago. 2015.
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. Para 2012 é utilizada a produção de lenha e tora do IBGE (2015)IBGE, Censos agropecuários 1970, 1980, 1985, 1995 e 2006. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em < http://www.ibge.gov.br > último acesso, jul. 2015.
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e áreas plantadas no Anuário da Silvicultura em 2012, conforme Santos et al. (2012SANTOS, Cleiton, Anuário brasileiro da silvicultura 2012 - Santa Cruz do Sul: Editora Gazeta Santa Cruz, 2012. 88 p. : il. ISSN 1808-222X). Para a produtividade da pecuária em 2024 utilizou-se a lotação proposta por Carvalho et al. (2010CARVALHO, T.B.; FURLANETTO, L. E. Z. S. E. R. G. Potencial da produtividade e rentabilidade da pecuária de corte no mato grosso. Congresso, nº 48, Sober, 25 a 28 de jul. 2010. Campo Grande -MS, 2010.). Para a silvicultura foi mantida a taxa de 2012.

Os dados da lotação da pecuária de 1970 a 2006 são obtidos pela razão do rebanho efetivo pela soma das áreas de pastagens naturais e plantadas, disponibilizada nos Censos Agropecuários 1970/2006 em IBGE (2015)IBGE, Censos agropecuários 1970, 1980, 1985, 1995 e 2006. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em < http://www.ibge.gov.br > último acesso, jul. 2015.
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. Para 2012 é utilizado o rebanho efetivo de bovinos disponibilizado pela Pesquisa Pecuária Municipal do IBGE, e os dados de área de pastagem correspondem ao trabalho Anuário da Pecuária 2013 (POLL et al., 2013POLL, Heloísa, KIST, Benno Bernardo , SANTOS, Cleiton Evandro, CARVALHO, Cleonice, REETZ, Erna Regina, SILVEIRA, Daniel Neves, Anuário brasileiro da pecuária 2013 - Santa Cruz do Sul: Editora Gazeta Santa Cruz, 2013. 128 p. : il.ISSN 1808-5172.).

Os dados da disponibilidade de terras para uso agropecuário e as áreas de preservação são do estudo da Embrapa (2014)EMBRAPA, Embrapa monitoramento por satélite. Resumo. Disponível em <http://www.alcance.cnpm.embrapa.br> último acesso. dez, 2014.
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4. Crescimento da demanda mundial por alimentos e a disponibilidade de novas áreas de terra para fins agropecuários no Brasil

A terra é um fator básico para a produção de alimentos e, historicamente, a expansão agrícola veio acompanhada da incorporação de novas áreas de terra. Mais recentemente, as mudanças no clima e as preocupações com a manutenção das áreas de floresta nativa expõem com mais clareza os limites dessa expansão. Muitas regiões do mundo, já sem possibilidade de expansão de área, dependem somente de aumentos de produtividade para atender às novas demandas. Segundo a FAO (2013)FAO, Fao statistical yearbook 2013 world food and agriculture. Food and Agriculture Organization of the United Nations, Romep. 307, 2013., o Brasil é um dos principais países com terras aráveis disponíveis, o que deve ampliar ainda mais seu papel como importante fornecedor mundial de alimentos.

Para analisar como as futuras demandas mundiais de alimentos por produtos brasileiros devem pressionar o uso da terra no Brasil, inicialmente são apresentados na Tabela 1 os níveis de demanda por exportações e demanda doméstica de 2012, as respectivas taxas de crescimento projetadas entre 2012 e 2024 e as variações percentuais de produção que seriam necessárias para atender às novas demandas. Para essa avaliação inicial, a produtividade foi mantida constante, de forma que se possa compreender um possível crescimento da demanda por novas áreas de terras nesse período. Na sequência, ajustes de produtividade serão avaliados.

Com relação aos produtos da pecuária, as mudanças na estrutura demográfica mundial devem elevar a participação das proteínas4 4 O consumo de carne per capita passaria de 41 kg, em 2009, para 52 kg em 2050 (de 30 para 44 kg nos países em desenvolvimento) (FAO, 2009, p.11).

Qual é a importância do Brasil na produção mundial de alimentos?

O Brasil já alcançou um importante papel na alimentação mundial: é o principal exportador de açúcar e café, o maior supridor mundial de suco de laranja, o maior exportador de soja, o maior exportador de carne de frango e de outros insumos alimentares básicos.

Qual a posição do Brasil na produção de alimentos no mundo?

Brasil é o 4° país que mais produz alimento no mundo.

Qual a importância da agricultura brasileira para o mundo?

É um dos setores que mais contribui para o crescimento do PIB nacional e que responde por 21% da soma de todas as riquezas produzidas, um quinto de todos os empregos e 43,2% das exportações brasileiras, chegando a US$ 96,7 bilhões em 2019 (Vendas..., 2020).

É verdade que o Brasil alimenta o mundo?

Estudos apontam que o Brasil alimenta 1 bilhão de pessoas em todo o mundo. Para apoiar a produção nacional, o Plano Safra 2022/2023 disponibiliza R$ 340,88 bilhões em crédito rural.