Qual a teoria utilizada pelo Código Penal na definição do lugar do crime?

Qual a teoria utilizada pelo Código Penal na definição do lugar do crime?

Passado o estudo da questão de “quando” o crime se deu, analisaremos, agora, a questão de “onde” o crime ocorreu. Para isso, novamente vamos recorrer ao Código Penal que, em seu artigo 6º, adotou a Teoria da Ubiquidade ou Teoria Mista, por “misturar” a teoria da atividade, já estudada anteriormente, e a Teoria do Resultado, adotada pelo Código de Processo Penal, que considera o local do crime onde se produziu ou deveria ter se produzido o resultado do crime. Essa mistura fica mais clara fazendo a leitura do dispositivo no código:

Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.”

Essa teoria é aplicada para os crimes a distância, ou seja, aqueles em que a conduta e o resultado ocorrem em países diversos. Dessa forma, o criminoso poderá ser processado, julgado, condenado em ambos os países. Para evitar a configuração do bis in idem, adota-se a regra da pena cumprida no estrangeiro, cuja redação segue:

Art. 8º - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.”

Interpretando o texto penal, vemos que, caso o indivíduo receba duas condenações (uma em cada país) diferentes, ele cumprirá a pena no estrangeiro, e depois será extraditado para o Brasil, onde cumprirá o restante. Não ficou claro? Vamos usar um exemplo numérico:

  • X mora no Uruguai, e envia uma bomba para seu desafeto Y, que mora no Brasil. Y morre na entrega, e X é julgado no Brasil, onde recebe uma pena de 30 anos, e no Uruguai, onde recebe uma pena de 15 anos. Após o cumprimento da pena no Uruguai, ele será extraditado para o Brasil, onde cumprirá os 15 anos restantes.

Finalmente, nos crimes em que a ação/omissão e o resultado ocorrem em comarcas diferentes, o direito brasileiro adota a Teoria do Resultado, já apresentada acima.

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IMPORTÂNCIA DE SE ESTUDAR O LUGAR DO CRIME

Definir a lei de que país será aplicável.

TEORIAS EXISTENTES SOBRE O LUGAR DO CRIME

As teorias sobre o lugar do crime as mesmas sobre o tempo do crime.

Teoria da atividade: o crime é praticado no lugar da conduta (ação ou omissão);

Teoria do resultado: o crime é praticado no lugar do resultado;

Teoria da ubiquidade ou mista: considera-se tanto o momento da conduta quanto o momento do resultado.

TEORIA ADOTADA PELO CÓDIGO PENAL DO BRASIL

O Código Penal adotou, para definir o lugar do crime, a teoria da ubiquidade.

Lugar do crime

Art. 6º – Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.

REPERCUSSÕES DA ADOÇÃO DA TEORIA DA UBIQUIDADE

Definição da lei penal aplicável: a lei penal aplicável, então, poderá ser tanto a do país em que houve a atividade quanto a do país em que houve o resultado. Se por acaso o agente for punido no estrangeiro, como já visto, sua pena será computada ou diminuída no Brasil.

INTELIGÊNCIA DO LEGISLADOR AO OPTAR PELA TEORIA DA UBIQUIDADE

O legislador brasileiro acertou em escolher a teoria da ubiquidade para regular o local do crime.

EXPLICAÇÃO: imaginemos um cenário hipotético em que um agente envie uma carta-bomba do Brasil para o Paraguai, que ali é aberta por alguém, explodindo e matando a vítima. Nesse cenário, se o Brasil adotasse a teoria do resultado e o Paraguai adotasse a teoria da atividade, o agente não seria punido, pois o Brasil não poderia puni-lo, já que aqui houve apenas a atividade, e o Paraguai também não, já que lá houve apenas o resultado. Assim, a escolha pela teoria da ubiquidade parece mais acertada para evitar a impunidade.

DEFINIÇÃO DA LEI PENAL APLICÁVEL E DA COMPETÊNCIA PARA JULGAR

i) O Código Penal, em seu art. 6º, usa a teoria da ubiquidade para definir o lugar do crime, que definirá o país cuja lei será aplicável;

ii) O Código de Processo Penal, em seu art. 70, usa, em regra, a teoria do resultado para definir a competência para julgar o crime, se de um juiz de uma comarca (Justiça Estadual) ou subseção judiciária (Justiça Federal) ou de outra, por exemplo.

ATENÇÃO: é importante não confundir o lugar do crime com o juiz competente para julgar o crime. Uma coisa não depende da outra. Definir o lugar do crime importa apenas para saber a lei de qual país será aplicada, de modo que, somente uma vez definido o país é que se passa a definir qual seria o juiz desse país competente para julgar o crime.

IMPORTANTE: as regras e exceções para definição de competência serão estudadas no Direito Processual Penal, uma vez que estão previstas no Código de Processo Penal e a competência é instituto do Processo Penal e não do Direito Penal. Em Direito Penal estudamos apenas como definir o país cuja lei penal será aplicável.

CRIMES À DISTÂNCIA OU DE ESPAÇO MÁXIMO

Conceito: os crimes à distância ou de espaço máximo são aqueles em que a conduta ocorre em um país e o resultado ocorre em outro.

Teoria e leis aplicáveis: aplica-se a teoria da ubiquidadee, por tal motivo, pode ser aplicada tanto a lei do país em que ocorre a conduta quanto a lei do país em que ocorre o resultado.

ATENÇÃO: se o sujeito pratica um crime à distância que envolve o Brasil e outro país e é julgado e condenado no estrangeiro, é importante lembrar que, mesmo podendo ser novamente julgado e condenado também aqui no Brasil, a pena eventualmente cumprida no estrangeiro atenua ou computa a pena imposta no Brasil (CP, art. 8º).

EXEMPLO: retomando o exemplo anterior, o agente envia uma carta-bomba do Brasil para o Paraguai, que ali explode, matando uma vítima. Nesse exemplo de crime à distância, pela teoria da ubiquidade, tanto a lei do Brasil quanto a do Paraguai podem ser aplicadas.

CRIMES CONEXOS

Conceito: os crimes conexos são aqueles que, por algum motivo, têm relação entre si, como, por exemplo, em caso de crimes diferentes praticados pelos mesmos agentes ou contra as mesmas vítimas ou mesmo em se tratando de delitos que tenham relação entre si (um sirva para garantir a impunidade do outro, por exemplo), ainda que com sujeitos diversos.

Teoria e leis aplicáveis: como não há a unidade, não se aplica a teoria da ubiquidade entre os crimes conexos, de modo que a cada crime será aplicada a lei do país em que foi cometido, podendo ser aplicada, inclusive, a teoria da ubiquidade especificamente para os crimes cometidos no Brasil.

CRIMES PLURILOCAIS

Conceito: os crimes plurilocais são aqueles cometidos num mesmo país, porém a conduta e o resultado se dão em locais diferentes nesse mesmo país.

Teoria e leis aplicáveis: como já está definido que o crime foi praticado num país e que, portanto, a lei desse país será aplicável, será utilizada a teoria do resultado apenas para definir a competência e não para definir o lugar do crime.

Competência: como já dito, as regras de competência serão estudadas em Direito Processual Penal, valendo adiantar apenas que, em regra, no caso de crime consumado, a competência será determinada pelo lugar em que se consumar a infração, e, no caso de crime tentado, a competência será determinada pelo local em que foi praticado o último ato de execução (CPP, art. 70).

REFERÊNCIAS

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1, parte geral: 24ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020 – versão digital.


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Qual a teoria adotada pelo Código Penal para o lugar do crime?

Da análise deste artigo, percebemos claramente que o Código Penal adotou a TEORIA MISTA OU DA UBIQUIDADE, que considera como LUGAR DO CRIME tanto o local onde foi praticada a ação ou omissão, como o lugar em que se produziu o resultado.

Quais as teorias do lugar do crime?

1) Teoria da Atividade (ou da Ação): lugar do crime é aquele em que foi praticada a conduta (ação ou omissão); 2) Teoria do Resultado (ou do Evento): para essa teoria não importa o local da prática da conduta, mas sim, o lugar onde se produziu ou deveria ter se produzido o resultado do crime (adotada pelo CPP);

Qual é a teoria adotada para conceituar o crime?

Há um grande embate doutrinário no que diz respeito ao conceito analítico do crime. Muitas são as teorias existentes, porém, as duas correntes mais adotadas e defendidas são a Teoria Tripartida e a Teoria Bipartida, tendo, ambas, argumentos suficientemente fortes cunhados por renomados penalistas.