Relatos de pessoas com cisto no ovário

Relato de Caso

Cistoadenoma seroso gigante de ovário manifestando-se como ascite em paciente pré-púbere

Giant ovarian serous cystadenoma manifested as ascites in prepubertal patient

Cláudio Franco do Amaral Kfouri, ACBC-SP1; Beatriz Tosetto Nogueira1; Isabella Marson Viana1; Andressa Pozzati1; Vinícius de Souza Godoi1; Maria Clara Ferreira Nonato România1; Denise Tosetto Nogueira2; Welington Lombardi3; Claudinei da Silva4

1. Universidade de Araraquara, Faculdade de Medicina, Araraquara, SP, Brasil
2. Hospital Carlos Fernando Malzoni, Serviço de Cirurgia, Matão, SP, Brasil

Endereço para correspondência

Claudio Franco do Amaral Kfouri
E-mail: ,

Recebido em 28/04/2018
Aceito em 30/05/2018

Fonte de financiamento: nenhuma

Conflito de interesse: nenhum

Resumo

O cistoadenoma seroso de ovário (CSO) é uma das neoplasias mais frequentes na prática clínica. Entretanto, fora descrito raríssimas vezes em pacientes pré-púberes, uma vez que a prevalência dessa afecção predomina entre os 20 e 50 anos de idade. São considerados cistos gigantes aqueles que possuem tamanho superior a 15cm e que são passíveis de complicações como rotura e torção. O objetivo desse relato de caso é evidenciar que o CSO é incomum na pré-puberdade devido ao fato das pacientes ainda não apresentarem ovários funcionantes, além de revisar a literatura sobre o tema.

Palavras-chave: Cistadenoma Seroso. Neoplasias Ovarianas. Ascite. Laparotomia. Criança.

INTRODUÇÃO

Existem diversos tipos histológicos de neoplasias ovarianas e são classificados como benignos, limítrofes e malignos. As neoplasias ovarianas malignas apresentam altas taxas de mortalidade, visto que é a quinta causa mais comum de morte por câncer em mulheres nos Estados Unidos. A maioria cursa com sintomas inespecíficos. Os tumores ovarianos são divididos em três grupos e distinguem-se pela origem do tipo celular, podendo ser de células epiteliais, estromais ou germinativas. Dentre esses grupos, os tumores de células epiteliais são os mais frequentes, sendo compostos por três tipos celulares serosos, mucinosos e endometrioses. Os tumores mucinosos, são menos comuns do que os serosos, representando aproximadamente 30% de todas as neoplasias ovarianas1.

Os tumores serosos são os mais frequentes e em conjunto representam aproximadamente 30% de todos os tumores ovarianos e um pouco mais de 50% quando se analisa apenas os tumores de origem epitelial2. O cistoadenoma seroso de ovário (CSO) é uma das neoplasias mais frequentes na prática clínica1. Essa neoplasia cística unilocular é revestida por células epiteliais altas, cilíndricas e ciliadas, circundadas por um líquido seroso claro, além de apresentar superfície lisa e com vasos abundantes3.

O risco de apresentar tumor ovariano aumenta com a idade devido ao crescimento gonadal progressivo, até que perde sua funcionalidade - período de pós-menopausa -, porém, ainda assim mantém a capacidade de gerar tumores. As variedades benignas correspondem à 75% dos tumores de ovário e predominam entre os 20 e os 50 anos de idade4,5. Logo, as massas ovarianas, císticas ou sólidas, são consideradas raras no grupo pediátrico6, sendo que sua incidência equivale a 2,6 para cada 100 mil em meninas entre 4 a 14 anos de idade7.

O tamanho do tumor é bastante variável podendo ser pequenos cistos até cistos gigantes que ocupam toda a pelve e, muitas vezes, ocupando toda a cavidade abdominal3. Os cistos gigantes de ovário são relativamente incomuns em países de primeiro mundo, porém é uma patologia bastante encontrada nos países em desenvolvimento. São considerados gigantes quando seu tamanho é superior a 15cm ou ocupam toda a cavidade peritoneal. A forma mais comumente encontrada é o CSO, que é considerado de características benignas1 e será descrito no presente relato de caso.

RELATO DO CASO

GFP, 8 anos, branca, solteira, natural e procedente de Matão-SP foi admitida no pronto socorro do Hospital Carlos Fernando Malzoni, acompanhada pela sua avó. A paciente referia dor abdominal de forte intensidade sendo então solicitado avaliação da cirurgia geral.

Durante a anamnese, a paciente relatava abdome doloroso, de intensidade sete em uma escala de 0 a 10 com aumento abrupto do volume abdominal há dois meses, passou a apresentar constipação intestinal. Em seu antecedente ginecológico a paciente era G0P0A0.

Ao exame físico geral, a paciente apresentava-se acianótica, anictérica, taquicárdica, taquipneica, afebril, normotensa e sem adenomegalias.

Ao exame físico abdominal e ginecológico, apresentava abdome globoso, circunferência abdominal de 78cm, ruídos hidroaéreos inaudíveis; palpação evidenciou presença de ascite preenchendo todo seu abdome, com sinal de Piparote positivo e doloroso, com sinais de irritação peritoneal; detectou-se macicez à percussão. O exame especular não foi realizado. O toque retal evidenciou estenose retal importante. Suspeitou-se de neoplasia ovariana.

Foram solicitados exames laboratoriais como hemograma, coagulograma, ureia, creatinina e enzimas hepáticas, porém sem quaisquer alterações. Para elucidar o quadro, foi solicitada ressonância magnética (RM) para avaliar a real extensão do conteúdo abdominal, na qual demonstrou grande coleção líquida encapsulada ocupando toda cavidade abdominal, possuindo 28cm em seu maior eixo e cerca de 18cm em seu menor eixo. (Figuras 1 e 2) A hipótese diagnóstica foi de tumor gigante de ovário.

Relatos de pessoas com cisto no ovário

Figura 1. Corte Coronal de RNM. Imagem de coleção líquida encapsulada ocupando toda a cavidade peritoneal.

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Figura 2. Corte Axial de RNM. Imagem evidencia extensão da lesão e a compressão de vísceras ocas em parede posterior da cavidade peritoneal.

Optou-se pela intervenção cirúrgica devido ao quadro doloroso e pela possibilidade de torção de ovário. Foi realizada laparotomia exploradora, com incisão xifopubiana. A medida que procedeu a abertura da aponeurose, fora possível identificar um volumoso cisto (Figura 3) que preenchia toda a cavidade peritoneal e pequena quantidade de líquido ascítico, que foi colhido e enviado para citologia oncótica. Após a mobilização do mesmo, pode ser visualizado o hilo do ovário direito com a presença de torção do pedículo (Figura 4). Foi realizada salpingo-ooforectomia à direita e preservação do ovário esquerdo. A cavidade foi inventariada não sendo determinada outras alterações patológicas. A peça cirúrgica foi encaminhada ao exame anatomopatológico (AP) (Figuras 5 e 6).

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Figura 3. Intra-operatória. Abertura da aponeurose na linha média demonstrando a presença de grande cisto ovariano.

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Figura 4. Intra-operatória. Torção do pedículo do ovário direito durante a laparotomia exploradora.

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Figura 5. Vista lateral da peça cirúrgica. Cisto gigante de ovário após a salpingo-ooforectomia direita comparada com régua de 30 cm.

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Figura 6. Vista superior da peça cirúrgica. Peça cirúrgica - salpingo-ooforectomia direita - comparada com régua de 30 cm.

O pós-operatório evoluiu sem nenhuma intercorrência e a paciente teve alta hospitalar após o 3º dia de internação. No retorno ambulatorial após um mês a paciente estava assintomática.

O resultado do AP confirmou a suspeita de cistoadenoma seroso de ovário, que pesou 8kg e mediu 29x24,5x16cm. A lesão fora totalmente retirada com margem de segurança adequada. O resultado da citologia oncótica foi negativo para células neoplásicas metastáticas.

DISCUSSÃO

O ovário é um órgão que apresenta diversas características interligadas. Considera-se que interações genéticas, embriológicas, oncogênicas, estruturais e funcionais podem gerar proliferação neoplásica benigna ou maligna7. Sabe-se que as massas anexais são predominantemente de características benignas, correspondendo a cerca de 80% dos casos dentre os quais os cistos estão entre os mais frequentes8 e aparecem principalmente em mulheres jovens entre 20 e 50 anos deidade.

A experiência clínica revela alta incidência de tumores de ovário no climatério em decorrência da perda da função reprodutora e processo natural do envelhecimento9. No presente relato, observou-se o caso de uma paciente de oito anos de idade, fato que não corresponde à faixa etária observada na literatura. Aliás, torna-se uma raridade nessa idade, pois durante a revisão bibliográfica, não fora encontrado nenhum artigo envolvendo essa faixa etária na pesquisa realizada em bancos de dados como PUBMED, SciELO em um período de 30 anos.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) divide as neoplasias segundo o tecido de origem, no qual pode ser proveniente de três elementos do ovário: epitélio celômico superficial, células germinativas e estroma10. A detecção da presença de cistos ovarianos é causa de preocupação para as mulheres devido ao risco de malignidade, mas felizmente a maioria dos cistos ovarianos são benignos e de origem epitelial.

O CSO é derivado do epitélio superficial celômico, que macroscopicamente apresenta tamanho médio de 10-15cm11. No caso, o diagnóstico foi de um cistoadenoma seroso com dimensões de 29cm e peso de 8kg sendo, portanto, outra variante do caso em questão em relação a literatura.

Os cistos ovarianos, na maioria dos casos são assintomáticos, porém, nas fases iniciais a paciente pode apresentar sintomas gerais como náuseas, dispepsia e desconforto abdominal12. Quando volumosos, podem gerar constipação intestinal ou retenção urinária. Também pode apresentar sintomas resultantes do efeito de massa, como compressão vesical, que resulta na polaciúria, ou compressão retal13. A dor abdominal intensa é a manifestação clínica mais frequente, na qual muitas vezes pode simular um abdome agudo inflamatório, sendo a apendicite o diagnóstico diferencial mais comum em cistos de pequeno tamanho12. No caso em tela a paciente apresentou dor abdominal difusa, fato que sugeria a torção do cisto, e relatou, durante anamnese, obstipação intestinal, que fora causado pelo efeito de massa do cisto.

O diagnóstico é baseado na confirmação da origem do tumor, bem como na exclusão da sua malignidade. É realizado por meio do exame físico detalhado com o auxílio de exames de imagem, tais como ultrassonografia com estudo Doppler, tomografia computadorizada ou RM para conhecer a extensão e características da massa tumoral. Além disso, o marcador tumoral sérico CA 125 pode ajudar na definição da origem e possível malignidade14. No presente caso, o exame físico demonstrou alguns sinais que levaram a suspeita de cisto gigante de ovário. À palpação estava dolorida, porém, percebeu-se presença de massa cística, ocupando toda a cavidade abdominal; já o sinal de Piparoti positivo que, apesar de ser uma manobra para determinar ascite, auxiliou a determinar grande quantia de liquido intraperitoneal. No entanto, somente por meio da RM pode-se visualizar que o líquido era encapsulado e então, confirmou-se a impressão diagnóstica de cisto gigante de ovário. A avaliação sérica do CA 125 não foi realizada, uma vez que a paciente estava em um quadro agudo e fora admitida no pronto socorro. Logo, optou-se pela abordagem cirúrgica após confirmação diagnóstica pelos exames supracitados.

O tratamento cirúrgico está indicado na suspeita de câncer de ovário, nas urgências ginecológicas, nos cistos maiores que 6cm e nos cistos sintomáticos, sendo o último a indicação mais frequente. Pode ser realizado por laparoscopia ou laparotomia exploradora, fato que depende da experiência do cirurgião. Para cistos gigantes a laparotomia está indicada uma vez que há necessidade de manipulação do cisto para alcançar ao pedículo do ovário e realizar a exérese de forma completa sem torná-lo roto. A excisão sem ruptura é fator prognóstico para os tumores malignos, pois reduz a frequência de metástases. Além disso, a via aberta tem valor diagnóstico e terapêutico nas cirurgias de urgência e eletiva15. Nesse caso, optou-se pela via laparotômica pela incisão xifo-pubiana uma vez que o cisto ocupava toda a cavidade peritoneal. No intra-operatório pode-se observar a torção do pedículo, o que conferiu a dor à paciente em questão e tornou o caso uma urgência cirúrgica.

Portanto, a procura pelo atendimento médico, na maioria das vezes, se da por dor abdominal difusa, sinais de irritação peritoneal e aumento da circunferência abdominal. O exame de escolha é a ultrassonografia para diferenciar os tipos de tumores. Em contrapartida, muitas vezes opta-se pela RM quando se trata de um CSO gigante. Nesses casos, a abordagem cirúrgica deve ser sempre pela via convencional, ou seja, aberta, para que haja a exérese com margens adequadas e sem rotura do mesmo.

REFERÊNCIAS

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2. Santos Junior JA, Marques GSB, Nu-nes JT. Cistoadenoma mucinoso gigante e a gravidez: relato de caso. Rev HCPA. 2013;33(2):166-70.

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4. Dubenko EM, Kalashnikov AA, Stel'makh AI. [Giant ovarian cystoma, simulating pseudoascitic syndrome]. Klin Khir. 2005;(2):56. Russian.

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11. Lopes Neto PE, Lopes Júnior LA, Oliveira IL, Lopes TC, Borges MROP. Ablação cirúrgica de cistoadenoma seroso gigante de ovário esquerdo: relato de caso em Assú, Rio Grande do Norte. In: Anais do 21º Congresso paulista de obstetrícia e ginecologia, 2016; São Paulo. São Paulo: SOGESP; 2016. p. 96.

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15. Sarfati R, Magnin G. Traitement chirurgical des tumeurs bénignes de l'ovaire. In: Encyclopédie Médico-Chirurgicale, Gynécologie-obstetrique. Paris: Elsevier; 2000. p. 630-H-10.

Quais os males que o cisto no ovário pode causar?

Geralmente, os cistos no ovário não causam alterações hormonais nem afetam a fertilidade da mulher. Dentre seus principais sintomas, destacam-se dores abdominais ou na região pélvica, enjoos e vontade de urinar frequentemente – sinais que merecem acompanhamento médico e que são relacionados com cistos volumosos.

Como fica a barriga de quem tem cisto no ovário?

Sensação frequente de barriga inchada; Menstruação irregular; Dor constante nas costas ou flancos; Desconforto ou dor durante o contato íntimo.

O que piora cisto no ovário?

Ocorre que o consumo de carboidratos simples e açúcares, quando não causam o problema, podem piorar muito essa condição.

Quem tem cisto no ovário pode fazer esforço?

Olá! Quem tem cisto paraovariano pode fazer academia normalmente ? Oi, dependendo das características do cisto, não haveria impedimento à prática de atividades físicas. Converse com seu Ginecologista para orientação adequada ao seu caso!