Como os ruminantes conseguem produzir energia a partir de carboidratos estruturais?

Aldivan Rodrigues Alves1*, Leonardo Augusto Fonseca Pascoal2, Gabriela Brito Cambuí3, Jaqueline da Silva Trajano3, Claudete Maria da Silva3, Glayciane Costa Gois3 1 Diretoria de...

Aldivan Rodrigues Alves1*, Leonardo Augusto Fonseca Pascoal2, Gabriela Brito Cambuí3, Jaqueline da Silva Trajano3, Claudete Maria da Silva3, Glayciane Costa Gois3

1 Diretoria de Desenvolvimento ao Ensino, Instituto Federal do Maranhão – IFMA, Caxias, Maranhão, Brasil. [email protected];
2 Centro de Ciências Humanas Sociais e Agrárias DAP/UFPB. Bananeiras. Paraíba. Brasil. [email protected];
3 Programa de Doutorando Integrado em Zootecnia CCA/UFPB/UFRPE/UFC. Areia. Paraíba. Brasil. [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]


Resumo: A fibra representa um componente indispensável e um dos principais itens da dieta de ruminantes, que dependendo de suas características físicas e químicas pode interferir diretamente na fisiologia digestiva do rúmen. Na prática, a fibra no balanceamento das rações recebe termos diferenciados, de acordo com suas características de solubilidade e degradação. Dentre esses termos, inclui FB (fibra bruta), FDN (fibra em detergente neutro) e FDA (fibra em detergente ácido), sendo a FDN mais relacionado aos carboidratos estruturais (celulose, hemicelulose e pectinas), o qual é mais utilizado por interferir no aproveitamento da dieta pelo animal, em que sua quantidade pode estimular ou inibir o consumo de alimento pelos ruminantes. Com base nas características físicas da FDN surgiram dois conceitos: FDN fisicamente efetiva (peFDN) relacionada ao tamanho da partícula e FDN efetiva (eFDN) relacionada a capacidade do alimento em manter o percentual de gordura do leite. O termo FDA refere-se a celulose, lignina, sílica e proteína, sendo utilizada para quantificar a hemicelulose por diferença da FDN. A fibra estimula a mastigação, serve como substrato aos microrganismos, contribui para manutenção dos padrões fermentativos e estabilidade do ambiente ruminal. Assim, a fibra na dieta de ruminantes quando não disponibilizada em quantidade e qualidade aos animais, pode comprometer o desempenho e interferir nas características dos seus produtos finais, além de causar distúrbios no metabolismo energético dos animais.

Palavras-chave: digestibilidade, metabolismo energético, produção animal.

Fiber ruminants: Nutritional, methodological and functional aspect

Abstract: The fiber is an essential component and one of the main items in diet of ruminants, and their physical and chemical characteristics can directly affect the digestive physiology in the rumen. In the practice, the fiber in the balance of diets given different terms, according with their solubility and degradation characteristics. These terms, including FB (crude fiber), NDF (neutral detergent fiber) and ADF (acid detergent fiber), NDF being more related to structural carbohydrates (cellulose, hemicellulose and pectin), which is more used to interfere in the diet utilization by animal, their quantity can stimulate or inhibit food intake by ruminants. Based on the physical characteristics of NDF two new concepts were developed: physically effective NDF (peFDN) related to particle size and effective NDF (eFDN) related with the ability of food in maintained the percentage of fat in milk. The FDA refers to cellulose, lignin, silica and protein, and is used to estimated the hemicellulose by subtraction of ADF from NDF. The fiber stimulates chewing, serves as substrate for microorganisms, contribute to maintenance of the fermentative standards and rumen ambient stability. Thus, the fiber in diet of ruminants when not available in quantity and quality at animals may compromise the performance and interfere in the final products characteristics, yonder cause disturbances in the energy metabolism of animals.

Keywords: animal production, digestibility, energy metabolism.


Introdução

A fibra é uma substância formada por vários componentes químicos de composição conhecida, porém com uma estrutura tridimensional variada e pouco conhecida. No seu aspecto químico, a fibra é composta pela celulose, hemicelulose e lignina, embora este último trata-se de um composto fenólico e não carboidrato. Em princípios práticos, tem-se utilizado os termos fibra bruta (FB), fibra em detergente neutro (FDN) e fibra em detergente ácido (FDA). Esses termos são utilizados para informar a qualidade das forragens, a ingestão da matéria seca, a digestibilidade e o valor nutritivo dos alimentos. A fibra para os animais ruminantes é compreendida como um conjunto de componentes dos vegetais que possui baixa digestibilidade e promovem ao rúmen equilíbrio em função da ruminação ().

Para ruminantes, o termo FDN representa uma medida do conteúdo total da fibra insolúvel do alimento, o qual constitui o parâmetro mais usado para o balanceamento das dietas uma vez que interfere na sua qualidade (). ) também enfatizam que por suas características particulares, os níveis de participação de fibra nas dietas são muito amplos, o que pode ser justificado pela sua flexibilidade, como também, pela variabilidade das necessidades energéticas dos ruminantes; porém quando em excesso reduz a capacidade do consumo de alimento, digestibilidade, síntese de proteína microbiana e aporte de energia. Entrentanto, quando o teor de fibra das dietas é baixo, inúmeras respostas podem ser densencadeadas, desde a alteração da fermentação no rúmen, acidose grave, o que pode resultar na morte do animal (). Ainda de acordo com este autor as características físicas da fibra, tais como, tamanho da partícula e densidade, podem influenciar a saúde animal, fermentação ruminal, metabolismo animal e produção de gordura do leite, independentemente da quantidade ou composição química medida de FDN. Entrento, ) citam que muitos fatores afetam os requisitos de fibra em vacas lactantes, incluindo a ingestão de matéria seca, quantidade e tipo de carboidratos não estruturais e estruturais da ração. Diante da complexa relação existente no metabolismo da fibra e seus efeitos na alimentação, desempenho e saúde animal; este artigo tem como objetivo elaborar uma revisão sobre os aspectos nutricionais, metodológicos e funcionais da fibra na nutrição de ruminantes.


Relações fisiológicas e digestivas da fibra em ruminantes

O aproveitamento de alimentos fibrosos pelos ruminantes está relacionado à síntese e secreção de enzimas pelos microrganismos do rúmen, promovendo a hidrólise da parede celular das plantas (), pois segundo (), tanto na saliva como no suco pancreático dos mamíferos existem enzimas hidrolíticas (amilases) capazes de catalisar a quebra das ligações glicosídicas α-1,4 do amido e do glicogênio, mas não das ligações β-1,4 da celulose, sendo assim alguns microrganismos, como os que habitam o rúmen de herbívoros, são capazes de hidrolisar as ligações β-1,4 da celulose e utilizá-la como fonte de energia.

A fibra é essencial para os ruminantes e ainda que seja fornecida em pequenas quantidades na dieta animal, esse teor tem a sua importância no que se refere à microbiota ruminal e seus processos fermentativos, corroborando com ) quando o mesmo afirma que quantidade mínima de fibra é necessária para ter concentrações adequadas de microrganismos no rúmen a fim de promover o processo da fermentação, produção de saliva e movimentos ruminais. Além disso, a fibra é importante no metabolismo energético dos ruminantes, pois independentemente da fonte de carboidratos estes são fermentados pelos microrganismos e convertidos a ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), principalmente o acético, propiônico e butírico os quais podem corresponder de 60 a 80% das necessidades energéticas dos ruminantes, mas elevados teores de fibra podem diminuir a eficiência de utilização dos carboidratos e outros nutrientes (, ).

Apesar do papel importante que as populações de protozoários e fungos do rúmen têm na digestão da parede celular vegetal, são as bactérias os microrganismos mais ativamente implicados neste processo. As bactérias são importantes qualitativamente, pela sua alta atividade enzimática, e quantitativamente, pela amplitude da sua repercussão devido à sua elevada concentração no rúmen. Tendo em conta o número (109 células.ml-1) e a aptidão para hidrolisar a celulose, as três espécies bacterianas celulolíticas predominantes no rúmen são Fibrobacter succinogenes, Ruminococcus flavefaciens e Ruminococcus albus (, , ), as quais digerem a celulose em velocidade constantes de, 0.05 a 0.10 h-1, mais rápido do que praticamente qualquer outra espécie de bactérias celulolíticas (). Existem interações (promotoras de crescimento e antagonismo) entre o ecossistema da microbiota que são importantes para manter um equilíbrio no ambiente ruminal e garantir a maximização da atividade fermentativa no rúmen, mas diversos fatores podem interferir neste equilíbrio (), dentre eles a dieta do animal e sua fração de carboidratos. Por exemplo, verificou-se que o efeito dos carboidratos pela adição de amido parece envolver a competição por nutrientes essenciais entre grupos microbianos, resultando em maior proliferação dos microrganismos que degradam amido (, ). Esta competição conduziria à preferência inicial pela utilização do amido como substrato energético no ambiente ruminal (), com a transformação gradativa da fibra em substrato energético predominante, à medida que se reduz a disponibilidade de amido (, , ), envolvendo, desta forma, mecanismos de regulação catabólica (). Por outro lado, alguns autores têm reportado a inibição da atividade de enzimas fibrolíticas em função da presença de amido no meio ruminal (), fato que parece estar associado à liberação de compostos inibidores pelos microrganismos que degradam o amido (), os quais parecem ser de natureza protéica (bacteriocinas) (, ).

Já os carboidratos constituintes da FDN têm baixa taxa de degradação e lenta taxa de passagem pelo retículo-rúmen e, desta maneira, dietas com altos teores de FDN promovem redução na ingestão de matéria seca total, em função da limitação provocada pelo enchimento do retículo-rúmen, limitando a expressão do potencial genético do animal para produção. A taxa de passagem ou de trânsito refere-se ao fluxo de resíduos não digeridos pelo trato digestório; o fluxo ruminal inclui além da fibra indigestível, bactérias e outras frações não degradadas do alimento, sendo que a composição e o volume da dieta são variáveis externas que influenciam a digestão, a taxa de digestão e a reciclagem do conteúdo ruminal (). ), em sua pesquisa sobre níveis de FDN na dieta de cordeiros avaliando consumo, digestibilidade e fermentação ruminal encontraram resultados indicando que o aumento do teor de FDN diminuiu o consumo de alimento e a oferta total de nutrientes ao animal; no entanto, a redução do consumo e digestibilidade foram mais evidentes somente pela inclusão do nível mais alto de FDN.

No entanto, fibra mais digestível pode estimular o consumo, pelo aumento da taxa de passagem, criando espaço para outra refeição (). Por outro lado, o processo fermentativo ruminal é altamente dependente do pH do meio, e este por sua vez, está diretamente relacionado com o teor de fibra efetiva da dieta (). Segundo ), o trânsito mais acelerado da fibra está associado à diminuição do pH, aumentando a quantidade de substratos que chega ao cólon, bem como, provoca um aumento no volume fecal.

) trabalhando com o efeito dos níveis de fibra em detergente neutro oriunda da forragem sobre a eficiência microbiana e os parâmetros digestivos em cabras leiteiras encontraram entretanto, para a dieta com 19% de FDN na forragem, um pH de 5,88 que foi atingido no tempo 16 horas. O pH ruminal é regulado por um sistema complexo que depende do nível de fibra na dieta, do resultado líquido entre a produção e a absorção dos AGCC, do fluxo de saliva e da sua capacidade de tamponamento do rúmen, de acordo com ) o pH ideal no rúmen seria em média 6,8.

Além das características fisicas e quimicas da fibra, alguns fatores também podem comprometer sua digestibilidade como a interação com outros nutrientes. De acordo com ) quando o teor de proteína bruta em nível abaixo de 7% na dieta como baixa disponibilidade de nitrogênio pode reduzir a digestão da fibra, reduzir o consumo devido à lenta passagem dos alimentos pelo rúmen.

Os trabalhos atuais que abordam a fibra na dieta de ruminantes têm procurado associar sempre esta complexa influência de suas características fisicas e quimicas com a fisiologia dos ruminantes, assim como em não ruminantes diversos estudos vêm sendo desenvolvidos para melhorar ainda mais a eficiência de utilização das fontes de fibra para ruminantes, em que, para ) o uso de enzimas fibrolíticas exógenas podem contribuir para aumentar esta eficiência de utilização (em torno de 0,5 a 2,0 mg com base na matéria seca total da dieta), uma vez que, estas ezimas aumentam a digestibilidade da matéria seca e da fibra, melhorando consequentemente o desempenho animal (, ). As enzimas comerciais utilizados na indústria de ração animal são produtos da fermentação microbiana, as quais são produzidas por um processo de fermentação em meio de cultura favorável ao seu crescimento () provenientes de fungos (principalmente Trichoderma longibrachiatum, Aspergillus niger, A. oryzae) e bactérias (principalmente Bacillus spp.). Algumas dessas enzimas estudadas como aditivo na alimentação de ruminantes são produzidas para outros fins a exemplo das celulases e xilanases que são usadas na indústria têxtil, de papel, petroquímica e alimentação humana. De acordo com ) os resultados destes trabalhos, de modo geral, ainda são inconsistentes devido em parte ao processo de obtenção das enzimas, o nível e método de suplementação, bem como o nível de produtividade do animal e que a utilização destas enzimas como uma tecnologia consistente na alimentação de ruminantes ainda dependem de trabalhos futuros.


Aspectos metodológicos

O conceito da fibra na alimentação animal, principalmente, ruminantes está diretamente relacionado com as características químicas e físicas desta fração, bem como, ao aspecto metodológico que quantifica ou determina este constituinte; pois de acordo com ) há uma necessidade de se estabelecer a priori, uma definição nutricionalmente relevante para que procedesse, então, aos esforços para obtenção de um método analítico capaz de produzir resultados válidos sobre o teor de fibra nos alimentos. Inicialmente, a fibra era analisada pelo método proposto por Henneberg em 1864, denominado método de Weende. Este método tem como princípio a solubilização dos carboidratos contidos no alimento por tratamento sucessivo de uma solução ácida e álcali, em que, neste caso a fibra é representada pela celulose e lignina insolúvel e na solução álcali (embora se trate de um composto fenólico e não carboidrato). No entanto, a fibra não é um material uniforme nutricional, química ou fisiologicamente, assim a pectina, hemicelulose e lignina insolúvel em álcali não apresentam as mesmas características nutricionais implicando em um dos principais pontos negativos deste método ().

A fim de corrigir a limitação do método de Weende diversos estudos foram realizados posteriormente, tendo como foco, alterações nas soluções de digestão principalmente para solucionar a desvantagem da solução álcali que foi substituída por uma solução detergente capaz de solubilizar os componentes não fibrosos () surgi por tanto os métodos de FDN e FDA atualmente de grande importância na nutrição de ruminantes, pois ao relacionarmos o aspecto nutricional ao metodológico veremos que a FDN corresponderá em grande parte aos carboidratos classificados como estruturais (CE), principalmente pectinas, celulose e hemicelulose (, , ), uma vez que a FDN compreende de hemicelulose, celulose e lignina com alguma contaminação de pectina, proteína e cinzas, já a FDA, por sua vez, corresponde a celulose, lignina, sílica e proteína servindo para quantificar a hemicelulose quando da sua diferença com a FDN, além disso, sequencialmente a FDA também se obtém a lignina e celulose isoladamente pelo método do permanganato ou ácido sulfúrico (Klason).

Em 2003, Hall subdividiu o total de carboidratos (CHO) presentes nas plantas nos seguintes componentes: A) carboidratos pertencentes ao conteúdo celular representados pelos ácidos orgânicos, monossacarídeos e oligossacarídeos, polímeros de natureza amilácea e frutanos; B) carboidratos estruturais ou pertencentes à parede celular vegetal que englobam as substâncias pécticas, galactanos, β-glicanos, hemicelulose e celulose. Ainda, segundo ), os carboidratos podem ser classificados em: CHO de natureza fibrosa e CHO não-fibrosos (CNF), sendo esta classificação associada ao método de FDN, em que, os de natureza fibrosa são aqueles pertencentes à matriz lignificada insolúvel dos alimentos compreendidos pela celulose e hemicelulose, ou seja, CHOs insolúveis em solução de FDN e os não fibrosos estão englobados todos os demais carboidratos solúveis em solução de detergente neutro. Para este autor o termo CNF é mais bem empregado do que o termo carboidratos não estruturais. Os CNFs são constituídos de carboidratos que mesmo pertencendo à parede celular vegetal não se enquadram à definição formal de fibra para ruminantes como proposta por ), onde a fibra é constituída por substâncias parcialmente digeríveis e que ocupam espaço no trato gastrintestinal dos animais.

Uma das principais alterações no método da FDN está na inclusão da α-amilase para garantir a solubilização do amido, a fim de minimizar sua interferência e aumentar a eficiência do método (). Embora, haja o consenso global de que nos estudos da fibra e sua relação com a nutrição de ruminantes a fração representada pela FDN tem lugar de destaque. ) enfatizaram sobre importância na diferenciação entre o amido, os açúcares e os polissacarídeos não amiláceos, pois estes apresentam diferenças nos padrões de fermentação ruminal, o que pode também refletir no aspecto metodológico. Além da FDN, os métodos de determinação da lignina também vêm sendo foco de estudos, pois este constituinte apresenta correlação negativa com digestibilidade dos alimentos, em que, a lignificação da parede celular limita a digestão por vários mecanismos: o efeito tóxico aos microrganismos fibrolíticos; limitação da ação das enzimas fibrolíticas criada pela hidrofobicidade resultante da deposição dos polímeros de lignina com a maturidade da planta e impedimento físico causado pela ligação polissacarídeo-lignina o que limitaria o acesso das enzimas (). ), ) em trabalhos sobre as diversas análises químicas da lignina classificou-as em duas principais categorias: métodos gravimétricos e métodos não gravimétricos. O primeiro grupo inclui o método da lignina insolúvel em solução a 72% de H2SO4 – também conhecida por lignina ácida ou lignina “Klason” (LK) (); oxidação da lignina pelo cloreto de sódio (); oxidação pelo permanganato de potássio (Lper) (Van Soest & Wine, 1968); e solubilização da macromolécula em solução ácida de trietilenoglicol (). Os métodos não gravimétricos incluem aqueles por espectroscopia dos raios infravermelhos () e os baseados nas propriedades ópticas da lignina, tais como a técnica da lignina solúvel em brometo de acetila (). Na tabela 1, estão apresentados, de acordo com ), os principais métodos utilizados no estudo da fibra para ruminantes e suas limitações:

Tabela 1. Uso e limitações dos métodos de análises da fibra e conteúdo celular de alimentos para ruminantes

Método de AnáliseFração no AlimentoLimitações do MétodoFibra BrutaParte da parede celular, celulose e ligninaContaminação por polissacarídeos não-celulósicos e remoção de ligninaFibra em Detergente Neutro (FDN)Fração indigestível do alimento, grande parte da fração da parede celular (celulose, hemicelulose e lignina)Não solubilizar parte da pectina e a remoção da proteína e amido pode causar problemasFibra em Detergente Ácido (FDA)Porção da parede celular: celulose e ligninaParte da lignina é solubilizadaLignina de KlasonLigninaContaminação por proteína e carboidratos

Um novo sistema na avaliação dos carboidratos tem sido utilizado, o CNCPS (Cornell Net Carbohydrate and Protein System), o qual avalia as frações de carboidratos dos alimentos com a utilização de equações que levam em consideração a digestão e a taxa de passagem dessas frações, ou seja, este sistema considera a dinâmica da fermentação ruminal (, , ). Para ) o valor energético de um alimento (em que grande parte das exigências energéticas dos ruminantes são atendidas pelos carboidratos) não depende apenas das quantidades dos diversos nutrientes em sua composição, mas sobretudo das frações desses nutrientes que o animal pode digerir e utilizar.

O sistema CNCPS desenvolvido por ), ), ) tem, basicamente, o objetivo de melhor avaliar as dietas completas, visando à minimização das perdas de nutrientes e à busca da maximização da eficiência de crescimento dos microrganismos no rúmen ().

Os carboidratos podem ser classificados de acordo com a taxa de degradação, tal como acontece com as proteínas, sendo que a fração A (açúcar) é de alta degradação, fração B1 (amido e pectina) de média e a fração B2 (formada pela parede celular disponível) de baixa degradabilidade e a fração C que perfaz a parede celular indisponível (incluindo-se a lignina) (). As frações A e B1 formam basicamente os carboidratos não estruturais (CNE), enquanto que os carboidratos estruturais (CE) formam as frações B2 e C (, , ). Conforme o ), aproximadamente toda a fração A é degradada ao nível de rúmen, mas uma pequena quantidade pode escapar para o intestino sendo totalmente digerido nesta porção. Já a fração B1 possui uma degradabilidade ruminal variável, dependendo do nível de consumo, tipo de grão e tipo de processamento, a parte desta fração que escapa da degradação ruminal, possuindo, também, uma digestibilidade variável no intestino, dependendo do tipo de grão e tipo de processamento. A fração B2 é usada para predizer a digestão ruminal da fibra e a digestibilidade intestinal, sendo que a porção que escapa do rúmen possui um valor de 20% de digestibilidade e por fim a fração C que é considerada como a fração de completa não degradabilidade no trato digestivo do animal.

A importância da determinação e da caracterização dos carboidratos ingeridos pelos ruminantes se baseia na classificação das bactérias ruminais quanto à utilização destes constituintes da parede celular vegetal e daqueles que se localizam no conteúdo celular com função não estrutural (), sendo instrumento valioso para a formulação de rações que visem à maximização do crescimento microbiano ruminal e, conseqüentemente, à melhor predição do desempenho dos animais, notadamente em condições tropicais (). Para ) as análises de carboidratos deveriam fazer parte da rotina laboratorial, por serem simples, não onerosas, e permitirem avaliação mais correta dos alimentos, pois os dados resultantes permitem a utilização do CNCPS para melhor estimativa do desempenho animal, por proporcionarem o melhor atendimento do sincronismo da fermentação de proteínas e de carboidratos totais no rúmen.

Outro importante avanço no estudo da fibra e intimamente ligado a aspectos metodológicos em ruminantes está relacionado a características físicas da FDN. ) estabeleceu alguns conceitos e que mais recentemente têm sido foco de vários estudos, estes conceitos são FDN fisicamente efetiva (peFDN) e FDN efetiva (eFDN). A peFDN está relacionado principalmente o tamanho da partícula que estimula a atividade de mastigação e estabelece uma estratificação bifásica dos conteúdos ruminais (uma camada flutuante de grandes partículas em uma fase líquida com pequenas partículas). A mastigação é importante nutricionalmente devido a sua relação com a limitação fisica do consumo e a manuntenção normal da fermentação no rúmen. Uma dieta rica em fibras resulta me maior tempo de ruminação o que consequentemente pode limitar o consumo volutário de alimentos. Entretanto a salivação, como resultado da mastigação pode influenciar a produção de acetato um precursor da gordura do leite ().

) comenta que o aumento na quantidade de fibra na dieta de ruminantes estimula atividade de mastigação reduzindo a produção de substancias ácida, porém, quando o teor de fibra é deficiente, a mastigação é reduzida, ocasionando a uma menor secreção salivar tampão, o que reflete em um menor pH, alteração da fermentação ruminal, baixa produção de ácidos graxos voláteis, além de alterar o metabolismo dos animais e a síntese de gordura do leite. Este mesmo autor mencionou a importância de se desenvolver um novo sistema de exigência de fibra para vacas leiteiras, sugerindo que fossem envolvidas as características de cada ingrediente e também a realização de determinações quantitativas utilizando métodos laboratoriais de rotina. Esse método poderia estimar o valor de peFDN por meio de medidas físicas e químicas no laboratório, como concentração da fração FDN de determinado ingrediente e a proporção de partículas que são retidas em uma peneira de 1,18 mm de porosidade. Este método laboratorial para estimar a peFDN foi estabelecido com base em três suposições: 1 – que o teor da fração FDN é uniformemente distribuído em todas as partículas do ingrediente; 2 – que a atividade de mastigação é igual para todas as partículas retidas em uma peneira de 1,18 mm de porosidade; 3 – a facilidade em reduzir o tamanho de partícula do ingrediente não é diferente entre fontes da fração FDN. O autor sugere que as dietas de vacas leiteiras deve conter 22,3% de FDNfe para garantir um atividade de mastigação de 150 min/kg de FDNfe para manter a função ruminal ideal (). Já o eFDN está relacionado ao somatório total da habilidade de um alimento repor a forragem ou fibra numa ração para que a porcentagem de gordura no leite produzida por vacas comendo um tipo de ração seja efetivamente mantida, e seu monitoramente pode ser realizado pela análise química do percentual de gordura no leite. As dietas com menos de 25% de FDN e 19% de FDN efetiva deprimem a porcentagem de gordura no leite de vacas. No balanceamento de rações para caprinos, principalmente, cabras leiteiras, se utiliza também desses estudos para a recomendação da quantidade mínima de FDN que deverá conter a ração. A FDNpe vai ser sempre ser menor que a FDN, no entanto, a eFDN pode ser menor ou maior que a concentração de FDN em um alimento como apresentado na figura 1 ()

Figura 1. Ilustração das relações entre FDN, FDN fisicamente efetivo, e FDN efetivo ().

) relatam que com o aumento na relação volumoso concentrado provoca um aumento no número de mastigações e o tempo de ruminação em dietas com alto percentual de volumosos, devido ao aumento do FDN consumido. Os autores testaram dois tamanhos de partículas para FDNfe 8,0 e 1,18 % da MS , e eles observaram uma redução no tempo de mastigação com o aumento da FDNfe 8,0. A ingestão de FDNfe foi aumentada pelo aumento da proporção de forragem na dieta, aumentando a ingestão de FDNfe devido ao maior teor de FDN da dieta, indicando que o comprimento de corte da silagem pode ser tão importante quanto a proporção de forragem FDNfe ingerida. Estes resultados sugerem que a fibra fisicamente efetiva é um melhor indicador da atividade mastigatória do que o comprimento das partículas ou do FDN.


Aspectos funcionais: a fibra e a qualidade de produtos em ruminantes

A formulação de dietas com adequados níveis de energia para atender às altas produções normalmente resulta em rações com altos níveis de grãos em detrimento à fibra, mas como mencionado anteriormente níveis mínimos deste constituinte representado pela FDN são exigidos em dietas para ruminantes. Os carboidratos estruturais devido a sua forma longa contribuem para uma maior estabilidade na fermentação ruminal. No entanto, carboidratos não estruturais, em especial aqueles facilmente degradáveis, podem ter influência negativa no ambiente do rúmen, resultando em modificações na composição do leite. Rações com alto teor de concentrados ricos em amido são relacionadas com alta produção de ácido propiônico e baixa produção de ácido acético no ambiente ruminal (Rocha Filho et al., 1999). Formulação de dietas com base na fibra em detergente neutro (FDN) tem sido recomendada devido a relação positiva entre a fibra e o enchimento ruminal, bem como a relação negativa entre a densidade energética do alimento. A fim de se manter a função ruminal estável evitando uma queda no teor de gordura do leite (). A produção de leite parece ser um fator determinante da capacidade do rúmen, sendo responsável por 76% da variação total de enchimento. O limite físico do rúmen é elástico, tornando-se maior com a deficiência no atendimento das necessidades metabólicas ().

A produção de leite é o maior dreno metabólico das vacas em lactação e representa a sua capacidade em utilizar a energia (). Baseados em vários estudos com vacas alimentadas com dietas contendo alfafa e concentrado verificou-se que dietas com 25% de fibra em detergente neutro (FDN) e 19% de fibra em detergente neutro proveniente de forragens resultam na similaridade de produção e composição ao leite de vacas alimentadas com altas concentrações de FDN ().

Os ácidos acéticos e butíricos são os principais precursores da gordura na glândula mamária. A maior disponibilidade de ácido acético e um melhor ambiente ruminal obtidos com a inclusão da polpa cítrica em substituição ao milho nas dietas de bovinos leiteiros, propiciam condições para elevação do teor de gordura do leite e produção de leite corrigida para gordura. ) trabalhando com substituição do milho moído com a polpa cítrica na dieta de vacas leiteiras observou que a substituição do milho e farelo de trigo por até 40% de polpa cítrica não afetou significativamente o balanço de ácidos graxos voláteis no rúmen, sendo que a concentração ruminal de ácido acético aumentou as proporções de ácidos propiônico e butírico diminuíram à medida que se aumentou a proporção de polpa cítrica na dieta. A polpa cítrica pode ser incluída em níveis elevados na dieta de bovinos leiteiros sem ocasionar problemas relacionados à fermentação e produção de leite.

) sugere que uma dieta que possua 35% de FDN é capaz de estimular o máximo consumo de MS e fibra para vacas em lactação produzindo entre 25 a 30 litros de leite. O ) verifica-se que na dieta deve constar entre 25 a 33% de FDN, dependendo da proporção de FDN oriunda da forragem (). ) em um estudo avaliando o desempenho de vacas em lactação recebendo diferentes volumosos (feno de alfafa, feno de tifton 85, silagem de milho) não constatou diferença para a produção de leite. A silagem de milho mostrou-se mais eficiente em relação à transformação de MS em leite. As vacas alimentadas com silagem de milho produziram 8,7% e 7,9% mais leite, por kg de MS ingerida, em relação àquelas alimentadas com feno de alfafa e feno de Tifton-85, respectivamente.

A gordura no leite é uma das respostas fisiológicas relacionadas à FDN da ração, mas, quando estudada sozinha, pode confundir efeitos físicos da FDN como mastigação, salivação e tamponamento ruminal, com efeitos metabólicos causados por diferenças na composição química da ração. ) avaliando o desempenho produtivo de cabras leiteiras, enfatizaram que a dieta elaborada para conter 27% de FDN oriunda da forragem de boa qualidade foi a que proporcionou a maior produção de leite corrigido para 3,5% de gordura. ) trabalhando com ovelhas que consumiam dietas em que o feno de coast cross foi substituído por casca de soja, verificaram, nos picos de produção resultados de 1,28; 1,5; 1,79 e 1,72 kg de leite/dia para dietas com 0; 29,7; 62,0 e 97,3% de FDN não forragem, respectivamente.

A alimentação com carboidratos fermentáveis promove um pequeno aumento no teor de proteína do leite devido à maior produção de propionato no rúmen. O ácido propiônico é utilizado na biossíntese de glicose e galactose para a obtenção da lactose, sendo esta, a maior reguladora da osmolaridade do leite sintetizado pela glândula mamária, influenciando assim, a quantidade de leite secretada (). ) citam que com a substituição do milho grão por casca de soja em quantidades superiores a 25% da MS da dieta podem prejudicar a produção de proteína do leite, devido à menor ingestão de carboidratos não estruturais e aumento na ingestão de carboidratos fibrosos.

A fibra na dieta de animais confinados e destinados ao abate geralmente é reduzida, pois esses são alimentados com dietas com alto teor de concentrados e por um curto período de tempo. Embora dietas com até 100% de concentrado tenham sido utilizadas com sucesso para bovinos e ovinos de corte, a adição de uma fonte de fibra na proporção de 5 a 20% da MS da dieta faz com que ocorra uma melhoria no desempenho animal ().

A energia é um importante parâmetro que determina a produtividade animal, no entanto, o valor energético das dietas pode ser reduzido a medida que ocorre aumento do nível de fibra, o que para animais ruminantes confinados provoca redução do ganho médio diário, na eficiência e conversão alimentar, elevando o número de dias para alcançar o peso de abate. ) trabalhando com cordeiros cruzamento Ile de France x Texel terminados em confinamento, recebendo dietas com 25, 31, 37 e 43% de FDN observou que o aumento do teor de fibra na ração promoveu uma diminuição nos pesos e rendimento de carcaça quente e fria. ) trabalhando com cordeiros alimentados com dietas contendo diferentes níveis de fibra em detergente neutro também verificaram que a composição regional da carcaça e a composição tecidual da perna dos cordeiros não foram influenciadas pelo aumento do teor de FDN das dietas. No entanto, ) estudando a inclusão do bagaço de caju, com teor de 81,8% de FDN na MS, na dieta de cordeiros e seu efeito no desempenho e características de carcaça encontraram consumo médio de 3,2% de peso vivo e ganho de peso médio diário de 117,5 g/dia, não encontrando diferença quando comprados aos animais que recebiam silagem de sorgo, mas os animais alimentados com o bagaço de caju obtiveram maior peso e rendimento de carcaça (quente e fria), bem como uma melhor conversão alimentar e mais rápida deposição de gordura.


Considerações finais

A fibra é um constituinte indispensável no manejo nutricional dos ruminantes, estando diretamente envolvida no metabolismo energético e na saúde dos animais, pela atuação direta na manutenção do ambiente ruminal. Pesquisas atuais ainda são necessárias para verificar a eficiência de utilização de enzimas exógenas na alimentação de ruminantes e para adequação dos métodos analíticos de determinação dessa fração, relacionado-os com os aspectos físicos e químicos da fibra ao seu efeito no desempenho animal.

Como ocorre o metabolismo de carboidratos em ruminantes?

A principal função dos carboidratos é ser fonte de energia para os ani- mais. No caso dos ruminantes, a maior parte da digestão ocorre no rúmen, apesar de que, dependendo dos ingredientes da dieta, digestão de porção considerável de CHOs pode ocorrer pós-ruminalmente.

Qual é a principal fonte de energia para o animal ruminante?

As forragens são as principais fontes de nutrientes na nutrição de ruminantes. Além da proteína e energia, as forragens provêm a fibra necessária nas rações para promover a mastigação, ruminação e saúde do rúmen.

Quais são as diferenças na digestão de carboidratos estruturais e não estruturais em ruminantes?

Os carboidratos não fibrosos apresentam alta taxa de fermentação, levando à redução do pH ruminal e influenciando o desenvolvimento da flora ruminal; já os carboidratos não fibrosos apresentam baixa taxa de fermentação e estimulam a ruminação, bem como a maior salivação do animal, o que auxilia no tamponamento do pH do ...

Qual a fonte de energia e proteínas para os ruminantes?

A proteína metabolizável (PM) no intestino dos ruminantes é representada pelo total de AA provenientes da digestão intestinal da proteína microbiana produzida no rúmen, da PNDR de origem alimentar e da proteína endógena. A proteína microbiana é normalmente a principal fonte de PM para ruminantes.