Qual é o princípio que veda em regra a modificação da decisão recorrida por uma única parte em seu desfavor?

Tema criado em 4/3/2022.

Art. 9º Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.

Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica:

I - à tutela provisória de urgência;

II - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III ;

III - à decisão prevista no art. 701 .

Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

  • Não há dispositivo correspondente no CPC de 1.973.

Julgado do TJDFT

“1 - Segundo o princípio da vedação à decisão surpresa, inscrito nos artigos 9º e 10 do CPC, o Magistrado está impedido de decidir com base em fundamento a respeito do qual não tenha dado às partes a oportunidade de se manifestarem, ainda que se trate de matéria de ordem pública, cognoscível de ofício. O referido postulado jurídico objetiva evitar prejuízos a qualquer das partes com base em fatos por elas ainda desconhecidos e não debatidos, impondo-se a efetivação do contraditório substancial com a intimação prévia para manifestação sobre o vício identificado pelo Magistrado, garantindo-se às partes a possibilidade de influenciar a convicção do Magistrado.”

Acórdão 1386854, 00418556220158070001, Relator: ANGELO PASSARELI, Quinta Turma Cível, data de julgamento: 24/11/2021, publicado no DJE: 1/12/2021.

Acórdãos representativos

Acórdão 1397115, 07304906020218070000, Relator: HECTOR VALVERDE SANTANNA, Segunda Turma Cível, data de julgamento: 2/2/2022, publicado no DJE: 15/2/2022;

Acórdão 1396594, 07188340620218070001, Relator: MARIA IVATÔNIA, Quinta Turma Cível, data de julgamento: 2/2/2022, publicado no DJE: 14/2/2022;

Acórdão 1359215, 00038420920068070001, Relator: CRUZ MACEDO, Sétima Turma Cível, data de julgamento: 28/7/2021, publicado no PJe: 9/8/2021;

Acórdão 1344030, 00033820920128070002, Relator: ALVARO CIARLINI, Terceira Turma Cível, data de julgamento: 2/6/2021, publicado no DJE: 17/6/2021

Acórdão 1334899, 07036724520208070020, Relator: DIVA LUCY DE FARIA PEREIRA, Primeira Turma Cível, data de julgamento: 22/4/2021, publicado no DJE: 5/5/2021;

Acórdão 1325668, 07100055320198070018, Relator: JOSÉ DIVINO, Sexta Turma Cível, data de julgamento: 10/3/2021, publicado no DJE: 25/3/2021.

Enunciados

Conselho da Justiça Federal – CJF

Enunciado 127 - O juiz pode homologar parcialmente a delimitação consensual das questões de fato e de direito, após consulta às partes, na forma do art. 10 do CPC.

Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC

Enunciado 282 - Para julgar em enquadramento normativo diverso daquele invocado pelas partes, ao juiz cabe observar o dever de consulta, previsto no art. 10.

Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM

Enunciado 1 - Entende-se por “fundamento” referido no art. 10 do CPC/2015 o substrato fático que orienta o pedido, e não o enquadramento jurídico atribuído pelas partes.

Enunciado 2 - Não ofende a regra do contraditório do art. 10 do CPC/2015, o pronunciamento jurisdicional que invoca princípio, quando a regra jurídica aplicada já debatida no curso do processo é emanação daquele princípio.

Enunciado 5 - Não viola o art. 10 do CPC/2015 a decisão com base em elementos de fato documentados nos autos sob o contraditório.

Enunciado 6 - Não constitui julgamento surpresa o lastreado em fundamentos jurídicos, ainda que diversos dos apresentados pelas partes, desde que embasados em provas submetidas ao contraditório.

Destaques

  • TJDFT

Inventário – exclusão de bens da meação sem manifestação das partes

“1. Nos termos do art. 10 do CPC, que trouxe uma nova vertente ao princípio constitucional do contraditório (art. 5º, LV, da CF), "O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." 2. Considerando que, durante todo o curso do processo de inventário, as partes se comportaram de maneira a se presumir que os bens móveis estavam incluídos na meação, a exclusão desses bens sem que se fosse dada a oportunidade para a viúva demonstrar o seu direito, ou ao menos se manifestar, viola os princípios do devido processo legal, da cooperação (art. 6°, CPC) e do contraditório, em sua nova vertente estampada no art. 10 do CPC, que veda a decisão surpresa.”

Acórdão 1394652, 07225288320218070000, Relator: CRUZ MACEDO, Sétima Turma Cível, data de julgamento: 26/1/2022, publicado no DJE: 18/2/2022.

Extinção do por abandono – intimação por determinação do serventuário da justiça – irregularidade

“4. Embora tenha sido promovida a intimação pessoal da parte para promover o andamento do feito, além de não ter sido consignada a consequência da inércia (pena de extinção), o ato se deu por "determinação" de serventuário da justiça, a quem não competiria admoestar as partes e seus patronos da pena de extinção, o que constitui irregularidade nos termos da norma processual. Precedentes. 5. Recurso conhecido e provido.”

Acórdão 1373964, 07282844120198070001, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, Segunda Turma Cível, data de julgamento: 22/9/2021, publicado no DJE: 5/10/2021.

  • STJ

Inaplicabilidade do princípio da vedação de decisão surpresa – requisitos de admissibilidade recursal

“5. Com efeito, em relação à violação ao princípio da não surpresa, cabe salientar que a orientação jurisprudencial deste Tribunal Superior reconhece que a vedação à decisão surpresa, prevista nos arts. 9º e 10 do CPC/2015, não se aplica à análise dos requisitos de admissibilidade recursal.” AgInt no REsp 1828104/MT.

Prescrição reconhecida de ofício - nulidade

"2. Com o advento do novo Código de Processo Civil, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n. 1.676.027/PR, firmou a orientação de que 'a proibição de decisão surpresa, com obediência ao princípio do contraditório, assegura às partes o direito de serem ouvidas de maneira antecipada sobre todas as questões relevantes do processo, ainda que passíveis de conhecimento de ofício pelo magistrado. O contraditório se manifesta pela bilateralidade do binômio ciência/influência. Um sem o outro esvazia o princípio. A inovação do art. 10 do CPC/2015 está em tornar objetivamente obrigatória a intimação das partes para que se manifestem previamente à decisão judicial. A consequência da inobservância do dispositivo é a nulidade da decisão surpresa, ou decisão de terceira via, na medida em que fere a característica fundamental do novo modelo de processualística pautado na colaboração entre as partes e no diálogo com o julgador'. 3. Na hipótese há de ser aplicada tal orientação jurisprudencial tendo em vista que o art. 10 do novo Código de Processo Civil estabelece que o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." AgInt no AREsp 1743765/SP.

Doutrina

“Consequência de se perceber o contraditório como direito de influência sobre o conteúdo da decisão judicial é ser ele compreendido como uma garantia de não surpresa. É que as decisões surpresa, aquelas que tomam por fundamento matérias que não tenham sido previamente discutidas pelas partes, são decisões que não são o fruto da participação com influência das partes.

O contraditório é, assim, uma condição essencial de validade do processo. Em outros termos, o resultado do processo só é constitucionalmente legítimo (e, portanto, válido), se construído com a plena observância do princípio do contraditório. Daí procede que o resultado do processo precisa ser construído pelo juiz e pelas partes, de forma comparticipativa, assegurando-se às partes o direito de, com sua atuação, influir no conteúdo da decisão. E se assim é, não pode haver decisão surpresa, uma vez que esse tipo de decisão tem um conteúdo que não foi construído com a participação das partes e, pois, com violação do contraditório.

Disso tudo resulta o dever do juiz de fazer observar o contraditório, trazendo para o debate as questões cognoscíveis de ofício (como, aliás, expressamente consta do art. 10 do CPC). Assim, deparando-se o juiz com a possibilidade de fundamentar decisão em matéria que não tenha sido suscitada pela parte (mas que esteja autorizado a conhecer de ofício), deverá abrir às partes oportunidade para sobre tal matéria se manifestarem.

Pois a compreensão do contraditório como garantia de influência e não surpresa é uma expressão da democracia deliberativa no processo. E todo o sistema processual (e não só o processual, mas todo o ordenamento jurídico) deve ser pensado a partir do paradigma do Estado Democrático de Direito, como resulta do art. 1º da Constituição da República. Daí a fundamental importância do princípio do contraditório para a construção de um processo jurisdicional democrático.”

(Câmara, Alexandre F. Manual de Direito Processual Civil . Disponível em: Minha Biblioteca, Grupo GEN, 2022.)

“A necessidade de as partes serem informadas de todos os atos processuais é conteúdo do princípio do contraditório, como meio de possibilitar, durante todo o processo, o exercício do direito de ação e do direito de defesa, todos assegurados constitucionalmente no Brasil. A possibilidade de a parte se manifestar, alegar, pedir e provar em um determinado lapso temporal, sob pena de, não o fazendo, assumir o ônus processual decorrente da não prática do ato, também é assegurada.

Constitui conteúdo do princípio do contraditório, em um Estado Constitucional, Democrático e de Direito, a oportunidade de as partes participarem do desenvolvimento do processo, de influírem na decisão judicial, de terem seus argumentos considerados e de não serem surpreendidas por decisões judiciais que contenham questões de fato e de direito em que não tenha sido previamente possibilitado o contraditório. Se as partes possuem o direito de serem informadas de todos os atos processuais, como forma de poderem reagir na defesa de seus direitos, as decisões proferidas pelo Poder Judiciário não podem surpreendê-las.1

Embora boa parte da doutrina nacional extraia o direito de as partes não serem surpreendidas por questões de fato ou de direito que não tenha sido previamente oportunizado o debate entre os sujeitos das relações processuais do princípio constitucional do contraditório, a ausência de regra expressa no Código de Processo Civil de 1973 fazia com que esse aspecto do contraditório fosse constantemente desrespeitado.

Com a entrada em vigor do Código de Processo Civil, o Direito Processual Civil passa a prever expressamente, em seu art. 10, a regra da vedação de decisão surpresa no Brasil.”

(Santos, Welder Queiroz D. Princípio do Contraditório e Vedação de Decisão Surpresa . Disponível em: Minha Biblioteca, Grupo GEN, 2017)

Veja também

Reconhecimento de ofício da prescrição − dever de consulta − contraditório prévio

O que é o princípio da fungibilidade?

6. A aplicação do princípio da fungibilidade pressupõe que, por erro justificado, a parte tenha se utilizado de recurso inadequado para impugnar a decisão recorrida e que, apesar disso, seja possível extrair de seu recurso a satisfação dos pressupostos recursais do recurso apropriado.

O que é o princípio da singularidade?

O princípio da singularidade, também denominado da unicidade do recurso, ou unirrecorribilidade consagra a premissa de que, para cada decisão a ser atacada, há um único recurso próprio e adequado previsto no ordenamento jurídico.

Quando não se aplica o princípio da fungibilidade?

[16] Quando se interpõe apelação em lugar de agravo, não se pode aplicar o princípio da fungibilidade para, posteriormente, se considerar o recurso inadmissível por intempestividade.

O que é o princípio da reformatio in pejus no processo civil?

A reformatio in peius no sistema recursal do processo civil significa o agravamento qualitativo ou quantitativo de qualquer posição jurídica de vantagem (processual ou material) que teria sido assegurada ao recorrente, caso não houvesse interposto sua inconformidade.